Os depoimentos colhidos pela delegada Josy Alves da Silva Guimarães, da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), a respeito da acusação de alunos da Escola Municipal Professora Dalka Leles, no Setor Orlando de Moraes, da região Norte de Goiânia, contam que um dos guardas civis que estiveram na unidade na terça-feira (3) falou aos estudantes que já tinha “quatro homicídios nas costas e mais um não faz diferença”. O mesmo guarda teria dito ainda que possui um porrete guardado no carro que tem o nome “direitos humanos”.A fala do guarda ocorreu diante de um contexto em que os alunos do 6º, 7º, 8º e 9º ano estavam reunidos no pátio ouvindo um sermão da diretora da escola após terem feito algazarra durante o intervalo das aulas. De acordo com os depoimentos, ocorreu um beijo entre dois estudantes nesse recreio, o que gerou gritos e barulhos dos outros estudantes. Isso fez com que o intervalo fosse interrompido para que os alunos ouvissem a diretoria sobre a necessidade de um bom comportamento escolar e de tirar notas boas.A diretora, então, aproveitando a presença de dois guardas civis na unidade escolar, os convidou para falar com os cerca de 250 alunos que estavam no pátio. Foi neste momento que um guarda, de acordo com os relatos, proferiu as expressões sobre os homicídios e o porrete no veículo. A delegada relata que, até então, todos os depoimentos colhidos confirmam essa situação e as falas do servidor da Guarda Civil Metropolitana (GCM). Além disso, as oitivas mostram que havia conversas entre alunos durante os sermões, mas sem que houvesse briga ou gritaria.Em seguida, depois das falas da diretoria e do guarda civil, os alunos estavam em filas para voltarem às salas de aulas, quando houve o disparo do spray de pimenta. Ao menos uma dezena de estudantes necessitou de atendimento médico por efeitos do gás. Segundo Josy, a presença dos guardas no local não configura um processo diferente da normalidade, visto que é frequente a ronda do mesmo nas unidades educacionais. No entanto, o sermão e o uso do spray geraram constrangimento e pânico nos estudantes.“Ainda estamos juntando os elementos para ver qual a tipificação final”, afirma a delegada. A dúvida é saber se, além do constrangimento, houve também o abuso de autoridade. Ela conta ainda que algumas vítimas relataram que os guardas ficavam mostrando os sprays aos estudantes enquanto falavam no pátio, causando constrangimento, e ainda falavam que no ambiente escolar a responsabilidade era da diretora, mas fora dali eles quem mandavam.Novas oitivas devem ocorrer ao longo da próxima semana. A delegada da DPCA procura encontrar agora alunos que teriam sido vítimas de violência física, já que em alguns vídeos feitos no dia do ocorrido mostram agressões às crianças. Até então, realizaram depoimentos estudantes que estavam no pátio e sofreram consequências do gás d e pimenta. A expectativa de Josy é que os demais estudantes e funcionários da escola sejam ouvidos no começo da semana e depois seja a vez dos guardas civis. A GCM afastou os dois envolvidos no caso nesta sexta-feira (6) até o fim da apuração do caso pela corregedoria.Caso pode gerar dois processosSecretário da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente (CDCA) da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Goiás (OAB-GO), Thaller Moreti afirma que o tumulto causado nesta semana na Escola Municipal Professora Dalka Leles, no Setor Orlando de Moraes, pode redundar em dois tipos de processos judiciais. Na terça-feira (3), estudantes passaram mal após confusão gerada com a presença de dois guardas civis. Há acusação de que os servidores da Guarda Civil Metropolitana (GCM) utilizaram spray de pimenta nos alunos, que precisaram de atendimento médico.De acordo com Moreti, a conduta pode gerar uma ação de autoria do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), que atingiria todos os responsáveis. “A situação está sendo investigada pelo Conselho Tutelar e algumas famílias procuraram a Polícia Civil, na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), que vão apurar o que ocorreu e como ocorreu.” O advogado ressalta que é necessário verificar a responsabilidade de cada ente envolvido, desde os guardas até a escola.Leia tambémGCM afasta agentes que usaram spray de pimenta contra estudantes em escola de GoiâniaAtuação de Guarda Civil em escola de Goiânia vira apuração criminal“O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) preza, e é um dos seus objetivos, a proteção física, moral e psicológica das crianças. Vai ser apurado, mas supostamente os guardas civis atiraram spray de pimenta contra os estudantes e se for constatado que houve um crime isso se torna uma ação do MP contra os agentes públicos”, explica Moreti. Em outra esfera, o secretário da CDCA afirma que cada estudante que se sentiu agredido em sua condição física, moral ou psicológica, poderá ingressar com ação individual por danos contra o Estado.Nesse caso, ele entende que não cabe processo de dano moral coletivo, porque não haveria uma ofensa ou prejuízo a um grupo geral, mas ações que geram a situação de que cada pessoa pode se sentir de uma maneira. “Cada um que sentiu sua moral atingida poderá ingressar com a ação e nesse caso não seria contra os agentes públicos e, sim, contra o Estado”, afirma. No caso, o processo seria contra a Prefeitura de Goiânia, visto que os entes são municipais.