Homens de 18 a 24 anos formam o grupo mais suscetível a morrer em um acidente de trânsito em Goiás. Dados de mais de 3,3 mil vítimas, de janeiro de 2020 até a última quinta-feira (12), mostram outras características que permitem traçar um perfil aproximado delas – 80% são do sexo masculino, por exemplo.As informações também dão pistas sobre as causas das ocorrências fatais. Na ampla maioria dos casos, a imprudência segue sendo o fator que mais provoca óbitos nas estradas goianas, que estatisticamente são mais perigosas em dias e horários determinados.Na comparação com as outras faixas etárias, observando a devida distribuição, o número de jovens de 18 a 24 anos que morrem é, em média, 30,9% maior que na faixa dos 35 a 64 anos (confira a a tabela completa no final da reportagem). A faixa de 18 a 24 anos registra, também em média, 25,17% a mais de mortes que os adultos de 25 a 64 anos.Leia também:Novos casos de mortes no trânsito de Goiânia fazem famílias reviverem a tristezaMais de 350 multas foram aplicadas por rachas desde o início do ano em GoiâniaOs dados da SSP mostram que só neste ano ao menos 497 acidentes com mortes foram registrados em Goiás, uma média de quase 3,76 casos por dia. Até o momento, esta é a segunda maior média dos últimos três anos. Em 2020 foram 3,26 casos por dia e, em 2021, 3,96. No acumulado dos últimos sete anos, 11.989 pessoas morreram nas estradas goianas, conforme mostram os números do Observatório Nacional de Segurança Viária.Entre os tipos de veículos envolvidos nos acidentes há um equilíbrio. As motos, popularmente reconhecidas como mais suscetíveis a ocorrências graves, foram 1.271 dos 4.818 veículos registrados nos locais de acidentes. O número fica próximo, mas ainda inferior ao de carros, que totalizaram 1.378. Os automóveis representam a maior fatia da frota de Goiás (4,34 milhões), conforme o site do Detran: 2 milhões. As motocicletas são 925 mil. Os caminhões foram 663 dos envolvidos nas ocorrências, contra 450 caminhonetes e 1.056 registrados como sendo de outros tipos.Maior cidade do estado, Goiânia acumula a maior parcela dos acidentes fatais, com um número mais de três vezes superior que o da segunda cidade. Em três anos a capital registrou 521 ocorrências com mortes. Somente no último fim de semana foram sete acidentes, que juntos acabaram em nove mortes, incluindo o falecimento de três adolescentes e um bebê.Dia e horárioO detalhamento dos casos de acidentes com mortes por dia e horário aponta com clareza quais são os momentos mais letais. Os dias de fim de semana chegam a ter o dobro de ocorrências em comparação com outros dias da semana. Dos 3,3 mil acidentes com mortes registrados no período analisado, 1.342 se deram no sábado ou no domingo. Já os horários mais mortais estão concentrados entre o fim da tarde e o início da madrugada (veja quadro).O inspetor da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Goiás, Newton Morais, explica que a relação entre dias e horários com a maior recorrência de mortes no trânsito tem base simples de ser compreendida. “São os dias e horários com estradas movimentadas. Onde além do movimento, nós temos as saídas para festas e viagens”, destaca Morais.EstradasApesar de, individualmente, as estradas rodoviárias concentrarem os maiores números de óbitos, a exemplo da BR-153, com 116 ocorrências, o conjunto dos casos mostra que mais que o dobro das mortes se dá na malha viária urbana. Dentro do período analisado foram 1.011 acidentes fatais em rodovias, contra 2.209 ocorrências em vias urbanas. Em ainda menor número, as mortes nas vias rurais totalizaram 57 casos.O inspetor Morais diz que entre as similaridades dos acidentes com mortes também está o tipo de pista. “Geralmente as ocorrências acontecem em rodovias de pista simples, por conta da dificuldade com a questão da ultrapassagem, em que o condutor por imprudência ou por não saber o momento certo, acaba envolvido em um acidente”, relata o representante da PRF em Goiás.No detalhamento por tipo de via, as ruas e as avenidas lideram os casos de acidentes com óbitos. A exceção foi o ano de 2020, quando 463 acidentes fatais foram registrados em ruas e avenidas, contra 473 em rodovias estaduais, 214 em rodovias federais e outros 182 não classificados. Em 2021 foram 552 em ruas e avenidas, 460 em rodovias estaduais e 264 em federais. Neste ano os índices estão parecidos: 197 em ruas e avenidas, 169 em rodovias estaduais e 86 em federais.94% dos acidentes têm causa humanaO ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Renato Borges Dias, atual presidente do Instituto de Pesquisa em Logística e Segurança Viária (IPLSV), destaca que na maioria dos casos a imprudência é o fator determinante. Conforme informa Dias, a estimativa é de que apenas 6% dos acidentes são causados por falhas mecânicas ou por questões estruturais das vias. “94% têm relação com falhas humanas, sendo que em 48% das vezes se observa a presença de álcool ou outras drogas”, diz o policial, que também preside a Associação Brasileira de Toxicologia (ABTox). Uma das bases do problema, avalia Dias, é a persistência da impunidade dos crimes cometidos no trânsito. “Nós precisamos acabar ou ao menos reduzir a impunidade no trânsito. Casos emblemáticos como um de Santa Catarina, onde um caminhoneiro que estava sem dormir havia 36 horas sob efeito de substâncias psicoativas atropelou um casal que estava numa moto, a passageira morreu e o motorista do caminhão seguiu arrastando a moto por mais 30 quilômetros. Ele está preso, vai a júri popular e até hoje a CNH não foi suspensa. Se ele conseguir sair da prisão poderá dirigir imediatamente”, exemplifica.Os exemplos de imprudência são refletidos nas multas aplicadas no estado e em Goiânia. Na capital, a maior incidência de infrações de trânsito é a alta velocidade. Apenas nos quatro primeiros meses deste ano foram 135.326 multas pela questão. Em destaque também as multas por avançar sinal vermelho, em um total de 15 mil em quatro meses. A prática está associada a muitos acidentes com mortes, como um dos registrados no último fim de semana.Dias considera que apenas a legislação não será suficiente para reduzir os casos de maneira abrupta. “É uma questão complexa. Culturalmente nós só nos chocamos com aquilo que causa comoção. Diariamente temos uma quantidade de mortos no trânsito que corresponde a uma queda de avião por dia. Se um avião caísse diariamente, com certeza nós teríamos uma mobilização nacional por mudanças. Como os acidentes de carro ocorrem de uma forma que as vítimas não são notadas, isso não traz a comoção”, considera. -Imagem (1.2455597)