Quase metade dos 89 municípios goianos classificados como estado de calamidade no primeiro mapa calor da Covid-19 no Estado registrou aumento no número de casos ativos da doença depois de um mês da divulgação do quadro. A medida estadual que orientava os municípios a fecharem os serviços não essenciais foi acatada de diferentes formas pelas cidades. Os números demonstrados pelos boletins também reagiram de maneiras distintas.Divulgado em 17 de fevereiro, o mapa dividiu o território goiano em 18 regiões, indicando periodicamente como cada gestão deveria agir diante dos números. O mapa leva em consideração indicadores relacionados à sobrecarga no sistema de saúde público e privado e os números do contágio pelo coronavírus (Sars-CoV-2), vírus causador da Covid-19, entre outros.Em levantamento feito pelo POPULAR na época da divulgação do mapa, 62 municípios declararam que iriam fechar os serviços não essenciais, outros 10 disseram que não aceitariam a proposta e 16 não manifestaram como iriam agir. Mesmo entre os que decidiram por acatar, porém, as regras dos decretos próprios variaram, nem sempre com a dureza indicada pelo Estado.Comparando os boletins epidemiológicos divulgados pelas próprias gestões nos dias 17 de fevereiro e a última quarta-feira (17), 42 dos 89 municípios tiveram aumento nos casos ativos – aqueles que ainda não constam como recuperados ou óbitos. A diminuição foi observada em 24. Outros 23 municípios não apresentaram números conclusivos.População O município com o maior aumento, Iporá, com 31,5 mil habitantes, viu o número de casos ativos saltar de 222 em 17 de fevereiro para 516 um mês depois. Polo da região Oeste I, a cidade adotou medidas de isolamento, com fechamento dos serviços essenciais. A secretária de Saúde, Daniela Sallum, diz, porém, que faltou “sensibilidade” por parte da população, fato que ela relaciona aos números ruins.“Durante todos esses meses de pandemia a gente vem investindo também em campanhas de sensibilização, mas parece que para parte da população a ficha não cai, acha até que é questão política”, diz a gestora. Nos primeiros três meses do ano, a cidade ultrapassou o número de óbitos pela doença registrados em quase 200 dias de pandemia do ano passado: agora são 37.A gestora descreve que mesmo diante do colapso, a cidade teve festas e retiros espirituais clandestinos. A Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do município contava com 15 leitos no ano passado e precisou expandir para 26, mesmo assim a rede de atendimento está sob tensão. “Jogar toda a responsabilidade para o poder público é injusto, é uma equação que depende do povo”, cobra.Em Valparaíso de Goiás, que foi de 97 para 168 casos, o prefeito Pábio Mossoró (MDB) considera o aumento reflexo do momento de evolução da pandemia no País. O político diz que a cidade não acatou a recomendação de fechamento por estar no Entorno do Distrito Federal. “Nossa população circula diariamente no DF”, diz, ao afirmar que não seria eficiente fechar o comércio do município. Sobre a população, ele avalia que “alguns colaboram e outros nem tanto”.Gestor atribui alta às variantesO poder de transmissão das novas cepas está entre os principais motivos apontados pelos gestores como razão do aumento de casos ativos mesmo com as medidas de isolamento. Em Aruanã, cidade com pouco mais de 10 mil habitantes, o diretor do Hospital Municipal, Carlos Eduardo Cardoso, diz, como representante da Saúde, que a cidade teve uma primeira onda com poucos casos e isso estaria por trás da alta nos números atuais. A cidade foi de 14 para 59 casos ativos e as mortes saltaram de 4 para 13. “Agora o número de pessoas com predisposição a pegar o vírus é bem maior. Se não tivesse havido providências de isolamento, as consequências seriam até maiores”, afirma.Caldas Novas, cidade turística popular do Estado, aparece como a segunda com o maior aumento de casos ativos, passando de 134 para 230. Apesar de não ter adotado o fechamento aos moldes sugeridos pelo Estado, a gestão determinou medidas como barreiras sanitárias nos acessos ao município e exigência de que turistas apresentem, desde meados de fevereiro, testes negativos da Covid-19.“Dentro do que foi proposto, nós acompanhamos as medidas, mas essa cepa é mais violenta”, afirma o secretário de Saúde, Ângelo Paulo da Silva. Ele diz não ter parâmetros para afirmar que medidas mais duras teriam evitado o aumento de casos. “É um campo ainda desconhecido. Fica uma lacuna grande atribuir razões concretas”, defende.Em Guarinos, cidade de pouco mais de 1,7 mil habitantes, os números foram de 2 para 18 no período analisado. Para o secretário de Saúde, Washington Ribeiro da Silva, além de resistência por parte da população, o tamanho do município influencia na alta: “Quando um pega, pega todo mundo”, afirma. Ele defende que empenha esforços para conter o vírus, mas que o quadro é delicado, já que o município precisa contar com cidades vizinhas para tratar seus doentes.Menos casos, mais mortesCatalão, no sudeste goiano, foi a cidade, entre a lista das 89, que registrou a maior redução dos casos ativos nos boletins públicos. O município de 110 mil habitantes tinha 470 casos ativos em 17 de fevereiro, o que caiu para 217. Apesar da redução disso, o número de mortes cresceu no período, foram 55 em um mês, totalizando 205 óbitos desde o início da pandemia. Para a coordenadora da Vigilância Epidemiológica da cidade, Ariana Martins da Costa, a redução nos casos se deu graças à colaboração da população.Professor e pesquisador da Universidade Federal de Goiás (UFG), José Alexandre Diniz diz, porém, que não é possível entender os dados como resultados ou não das medidas de isolamento por considerá-los ainda parciais. O professor aponta que vários indicadores devem entrar na avaliação, como o comportamento da população. “Erros associados aos dados podem gerar confusão”, diz sobre a necessidade de cautela na interpretação. (Luiz Phillipe Araújo é estagiário do convênio GJC/UFG)