O clima quente e o tempo seco de Goiânia, especialmente nesta época do ano, são de conhecimento e sofrimento gerais, mas pode ser ainda pior dependendo do local em que se mora. Bairros que não possuem áreas de vegetação ou parques e que não há equipamentos que protegem as ruas da insolação direta apresentam maiores temperaturas e umidades relativas do ar mais baixas ao longo do dia. Isso ocorre em mais intensidade até que em locais mais adensados, com grandes prédios, como era o esperado pelo geógrafo Júnio Gregório Roza dos Santos, mestre pela Universidade Federal de Goiás (UFG).Santos realizou estudo em cinco locais de Goiânia com urbanizações diferentes, medindo a temperatura e a umidade relativa do ar em três períodos do dia. Para tal, ele escolheu o mês de outubro, considerado o mais quente e seco historicamente, e as medições ocorreram em 2014. O estudo, no entanto, foi publicado na edição de julho da Revista Brasileira de Climatologia. O pesquisador definiu fazer as medições no Setor Central, com desenvolvimento urbano intenso, nos parques Lago das Rosas e Areião, também em áreas de urbanização intensa, no Parque Amazônia, com adensamento médio, e na Vila Pedroso, de baixa densidade.A expectativa era de que a maior temperatura ao longo do dia, no começo da tarde, ocorresse no Centro, em razão da maior presença do tráfego e do concreto. No entanto, os resultados verificaram que o Parque Amazônia teve uma média de temperatura de 36,4°C e umidade relativa do ar em 32% durante as medições às 14h, as piores em comparação com os demais. O Centro teve a melhor temperatura, com 30,8°C, mas a segunda pior umidade, sendo 33%, como foi na Vila Pedroso. No bairro da Região Leste, porém, a temperatura foi de 34,3°C, ficando atrás apenas do Parque Amazônia neste quesito.“Contrariando o esperado, notou-se que o Parque Amazônia foi a localidade mais quente dentre os cinco pontos de coleta de dados. A partir das informações obtidas e considerando as características urbanas de cada um dos pontos, verificamos que a concentração de prédios e construções com mais de dois pisos no centro da cidade propiciavam sombreamento das superfícies por boa parte do dia”, afirma o pesquisador. As regiões dos parques, mesmo em zonas altamente urbanizadas, tiveram temperaturas médias de 31°C e 32,3°C, mas com as melhores umidades relativas, sendo 43% e 37%, respectivamente para o Areião e o Lago das Rosas.Para Santos, o sombreamento promovido pelos prédios “bloqueou parte da radiação solar incidente sobre as superfícies mais abaixo, de modo a retardar o pico diário médio de aquecimento do ar, que somente ocorreu mais tarde (por volta das 15h e não às 14h como verificado nos demais pontos)”. Ele explica que o Parque Amazônia não tem a mesma concentração de prédios do Centro, tanto em quantidade quanto em altura, para bloquear parte da radiação. “Neste caso, chega diretamente às superfícies sem barreiras físicas promovendo o aquecimento do ar.”O pesquisador reforça que, às 14h, a diferença de temperatura registrada no período de interesse entre o ponto mais quente (Parque Amazônia) e o menos quente (Setor Central), foi em média de 6,4°C. Ele relata que o estudo ainda é inicial, no sentido de ter baseado em apenas cinco pontos da cidade, sendo quatro na porção Centro-Sul. “A ideia foi justamente verificar como se comportam espacialmente as variáveis climáticas temperatura e umidade relativa do ar em função dos diferentes níveis de urbanização.”De acordo com a metodologia aplicada na pesquisa, os tipos de urbanização podem ser identificados considerando as características dos locais, como “dimensões e concentração de prédios, cobertura da superfície urbana e seus materiais de revestimento (concreto, asfalto, solos exposto, vegetação, etc.) e o nível de atividade antrópica (concentração de veículos e pessoas)”, discorre o pesquisador. E características como a inexistência de barreiras físicas eficazes é que teria feito o Parque Amazônia o local mais quente e seco dentre os pesquisados.Essas barreiras poderiam ser desde “os prédios vistos no Setor Central, ou a presença de dosséis fechados e contínuos da vegetação, como aqueles observados nos parques urbanos e na periferia, ou ainda a existência de reguladores naturais como massas d’água”. “A ausência desses fatores explica o rápido aquecimento durante o dia e a liberação de calor pelas superfícies que se mantém durante a noite e a madrugada de modo a aquecer o ar, mesmo na ausência de insolação direta”, explica Santos. Para ele, a pesquisa mostra, no caso específico, que “a combinação insolação direta sobre as superfícies revestidas de concreto e asfalto e a ausência de controladores naturais do campo higrotérmico favoreceram maiores temperaturas que aquelas observadas na área central”. Políticas públicas devem tratar do temaDe acordo com o geógrafo Júnio Gregório Roza dos Santos, na conclusão do estudo publicado na Revista Brasileira de Climatologia, os resultados indicam que seria “fundamental inserir o conforto térmico no bojo das políticas de promoção de bem-estar e saúde da população, sobretudo, em períodos de calor intenso e baixas umidades”. Ele indica que é necessário adaptar os ambientes urbanos para contribuir com “a redução dos picos ascendentes de temperatura e descendentes de umidade relativa do ar”. Santos considera que o estudo serve de alerta para a influência da urbanização no clima da cidade.“Um dos motivos de estudar o comportamento espacial das variáveis climáticas, temperatura e umidade, é justamente identificar como elas são afetadas pelas alterações antrópicas nas paisagens urbanas produzindo, por exemplo, áreas mais quentes dentro da malha urbana, como as chamadas ilhas de calor e áreas menos quentes e mais úmidas como as chamadas ilhas de frescor”, afirma em entrevista. Para Santos, intervenções urbanas que visam a reduzir a quantidade de calor disponível ao aquecimento do ar deveriam ser colocadas em prática, como o aumento de áreas permeáveis e das áreas verdes. “Notamos que no caso dos parques, além da presença de área permeável que também é verificada nos vazios urbanos ou áreas periféricas, havia um outro fator fundamental para o arrefecimento do ar e controle das temperaturas e umidade que foi a presença dos lagos e a formação de vapor a partir da evaporação”, afirma o geógrafo. Outra opção para os administradores públicos seria a emissão de alertas para a população, a depender da localidade, indicando horários e áreas críticas para o desempenho de certas atividades que provoquem estresse térmico.-Imagem (1.2114550)