-Imagem (1.2392770)Quatro meses após ter sido atingido por cinco de oito tiros disparados por policiais militares durante uma abordagem na Praça do Sol, no Setor Oeste, em Goiânia, o desempregado Divair Nunes da Cruz, de 28 anos, prestou depoimento para um delegado no inquérito em que, em vez de vítima, ele aparece como suspeito de tentativa de homicídio contra um dos policiais que estavam na ação.A abordagem aconteceu no dia 9 de dezembro, minutos após Divar – que vive em situação de rua há alguns anos – ter sido atropelado por policiais militares em uma viatura numa via de acesso à praça. Os agentes de segurança alegam que ele chutou o farol do veículo, quebrando-o, e que, por isso, foi chamado reforço e foi feita a ação com policiais em pelo menos quatro viaturas.A oitiva pela Polícia Civil – determinada pela Justiça no dia 8 de março - foi na casa de um amigo da família, onde Divair se encontra hospedado, pois até hoje não tem condições de andar e se recupera dos ferimentos. Ele ficou internado durante algumas semanas em estado grave no Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo), mas conseguiu se recuperar e teve alta no final de janeiro.O desempregado disse que não houve nenhuma abordagem prévia pelos policiais e que a viatura foi jogada em sua direção “na traição, sem motivo nenhum”. O vídeo com a fala dele foi encaminhado á Justiça e tem duração de menos de cinco minutos. Com respostas curtas, Divair disse que estava indo para a praça quando os policiais chegaram e após o atropelamento seguiu em direção a um banco, quando chegaram mais PMs.Leia também:- Justiça manda reabrir caso de morador de rua baleado- Vídeo mostra PM atropelando morador de rua, antes de atingi-lo a tiros, no Setor Oeste; vejaOs policiais militares alegam que atiraram contra Divair para defender um deles que estava sendo atacado pelo desempregado com duas facas. Este policial apresentou no dia uma farda com um rasgo e escoriações no braço, além de um arranhão. Como Divair estava internado em coma na UTI do Hugo não havia dado sua versão e chegou a ser preso preventivamente na época acusado de tentativa de homicídio.Foi após intervenção da Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO) e do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) que a Justiça determinou uma investigação mais aprofundada do caso e foram descobertas imagens mostrando o atropelamento e o grande número de policiais em volta de Divair antes dos disparos. Em março, foram encontradas também testemunhas que estavam um pitdog e foram abordadas pelos policiais querendo a identidade deles e os contatos telefônicos.Em seu depoimento, Divair disse os policiais lhe agrediram com golpes de pedaço de madeira e uma barra de ferro e que ele se defendeu com dois garfos que guardava em seus pertences. Ele diz que chegou a usar o garfo contra o PM que supostamente portava a barra de ferro porque este batia nele e negou que portasse faca. “Só me defendi porque eles estavam me agredindo. Eu agredi só o que tava com ferro, só.” Ele nega ter chutado a viatura.Em um momento da oitiva, o delegado Bruno Costa e Silva pergunta mais detalhes sobre uma conversa que Divair teve com um parente dizendo que os policiais seriam passarinhos ou se transformariam em um, mas neste momento a fala do desempregado fica mais confusa e o delegado muda de assunto.Os familiares contam que Divair tem transtornos psicológicos, o que faz ele querer permanecer na rua e, na noite da abordagem, não ter ido embora após ter sido atropelado pela polícia. O tio dele, um barbeiro de 44 anos, havia sido ouvido no dia 7 de fevereiro, logo após a alta médica do desempregado, e disse que o rapaz sempre se negou a buscar atendimento psicológico.O tio também contou que Divair lhe falou logo após voltar para casa que tanto no momento do atropelamento como já na praça os policiais não teriam feito uma abordagem padrão e, sim, se aproximado “com falta de respeito e ignorância”, já de forma agressiva, e que na praça já chegaram “espancando”. Também teria dito ao parente que não chutou a viatura, mas deu um soco quando os policiais jogaram o veículo contra seu corpo.A investigação por parte da Polícia Civil segue em andamento. A Polícia Militar concluiu um inquérito aberto pela corporação afirmando que os policiais agiram em legítima defesa no intuito de proteger um deles que estava caído no chão sendo atacado por Divair com duas facas.No documento da PM, remetido na semana passada ao Judiciário, é dito que reportagem do POPULAR mostrando a cena do atropelamento foi editada e que é possível ver no vídeo com maior duração o momento em que o desempregado chuta a viatura. Entretanto, não rebate que de fato ele foi atropelado em seguida.