Denúncias de tortura, problemas com alimentação e dificuldades de acesso dos presos aos advogados e familiares estão entre os pontos que serão investigados pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO) dentro do sistema prisional goiano, especialmente no complexo de Aparecida de Goiânia e dos presídios de Anápolis e do Entorno do Distrito Federal. A determinação foi feita pelo promotor Fernando Krebs na mesma semana que a Pastoral Carcerária divulgou aumento de 126% das denúncias de tortura em Goiás.Nesta semana a Pastoral Carcerária Nacional divulgou que Goiás ocupa a terceira posição no ranking dos estados que são os mais denunciados em todo o País. O banco de dados da Pastoral Carcerária Nacional indica que as denúncias de tortura saltaram de 11 casos em 2020 para 26 no ano de 2021. Além deste documento, a Ordem dos Advogados do Brasil Seção Goiás (OAB-GO) já havia informado em relatório no mês de dezembro do ano passado que os presos relataram tortura e espancamento, inclusive com choques elétricos e afogamentos.Reportagem sobre uma carta escrita de próprio punho por um dos cerca de 130 presos que a assinam e informam esquema de tortura dentro do Sistema Prisional de Goiás, em especial no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia também motivou a apuração. Fernando Krebs cita na portaria que, entre as considerações para a investigação está a publicação, no dia 16 de dezembro de 2021.Fernando Krebs solicitou reunião com o atual diretor da Diretoria Geral de Administração Penitenciária (DGAP), Josimar Pires, para a próxima quarta-feira (19). Além disso, será definido prazo para que ele apresente dados sobre a rotina dos detentos, assim como detalhes da gestão. Fernando Krebs disse que quer saber, por exemplo, o que os presos comem e em quais horários; quem trabalha ou estuda; quantos servidores são temporários e efetivos, entre outros detalhes. O promotor ainda disse que deverá fazer inspeção nos presídios.Integrante do Comitê Goiano de Direitos Humanos Dom Tomás Balduíno e Conselho Nacional de Direitos Humanos, Eduardo Mota afirma que o relatório que aponta aumento nas denúncias nos presídios em Goiás deverá compor um dossiê que também reunirá relatos de familiares, de ex-detentos, além de reportagens. Este dossiê deverá ser encaminhado para autoridades goianas. “Essa prática não é novidade no sistema prisional goiano ou nacional, mas queremos provocar as entidades a se posicionarem nesta questão.”Entre as entidades que serão acionadas, Bruno cita Conselho Nacional de Justiça, Conselho Nacional do Ministério Público e Conselho Nacional de Direitos Humanos. Além disso, a pastoral deverá comunicar oficialmente a Organização dos Estados Americanos (OEA) sobre a permanência dessas práticas. “Nossa intenção é construir um nível de responsabilização quanto às situações, são centenas de relatos de tortura.”Bruno ainda relata as dificuldades que os presos e os familiares têm para denunciar essas práticas. “Eles (os presos) não costumam denunciar por medo de represálias. As famílias também enfrentam esse medo, até mesmo quando se trata de dificuldade de alimentação. Temos casos de familiares que relatam que os parentes presos perderam dez quilos por falta ou má qualidade da comida e pelo impedimento de entregá-los aos presos.” Ele acrescenta que a pandemia escancarou ainda mais essas dificuldades, quando os detentos passaram muito tempo sem contato com os defensores ou parentes. Ele ainda destaca que não são todos agentes prisionais, policiais ou autoridades que praticam ou permitem estes atos, mas afirma que existe um sistema que domina e permite que essas práticas continuem.A pastoral divulgou uma nota pública afirmando que a tortura é expressamente proibida em território brasileiro e que as denúncias que chegaram para as entidades que atuam no sistema envolvem agressões físicas e verbais, uso de instrumentos de tortura, spray de pimenta, bomba de gás lacrimogêneo, bala de borracha, violações do direito à visita das famílias, falta de assistência material, à saúde, falta de alimentação e água, incomunicabilidade, dentre outras violações de direitos. DGAP diz que apura casos protocolados A Diretora-Geral de Administração Penitenciária (DGAP) se pronunciou apenas por nota. O documento diz que todas as denúncias que tratam de maus-tratos, protocoladas nos canais oficiais da Administração Penitenciária, são devidamente apuradas pela área responsável deste órgão. A reportagem questionou sobre a instauração de investigação sobre denúncias que creditam ao atual diretor, Josimar Pires, práticas de tortura contra presos. Em março do ano passado, o POPULAR repercutiu reportagem do El País que divulgou áudios creditados a Josimar nos quais ele confessava a prática e ainda ameaçava colegas que viessem a denunciá-lo. Na nota, a DGAP diz que “na época dos fatos foi instaurado procedimento administrativo disciplinar, nos termos da lei, para apuração sobre o mencionado servidor.” Também acrescenta que “após todos os procedimentos de apuração ficou constatada a falta de materialidade das provas. De forma que foi garantida a presunção de inocência do servidor e arquivamento dos autos.” Sobre as reclamações de familiares e advogados que enfrentam dificuldade de acesso aos custodiados, a pasta informou que eles mantêm contato por meio de visitas em parlatórios ou videoconferência e que isso garante o cumprimento dos protocolos de segurança para evitar a disseminação da Covid-19 e casos da variante da influenza. A DGAP informou que as visitas podem ser agendadas diretamente nas unidades prisionais. Sobre a alimentação, a DGAP informou que são fornecidas três refeições diárias, sendo café da manhã, almoço e janta e que o cardápio é supervisionado por nutricionista. Além disso, confirma que alimentos e produtos de higiene encaminhados por familiares são entregues. Recentemente houve troca da empresa fornecedora da alimentação.A diretoria ainda diz na nota que qualquer manifestação da sociedade deve ser protocolada por meio da Ouvidoria Setorial da Secretaria de Segurança Pública (SSP) pelo número (62) 3201-1212 ou na Controladoria Geral do Estado (CGE).-Imagem (Image_1.2386438)