A pandemia da Covid-19 fortaleceu a relação dos brasileiros com as áreas verdes do país. É o que diz o estudo Parques do Brasil – Percepções da População 2022 que acaba de ser divulgado pelo Instituto Semeia, uma organização da sociedade civil criada em 2011.Por causa das medidas de isolamento social, a discussão sobre os benefícios físicos e mentais do contato com a natureza foi ampliada em todas as regiões brasileiras.Atuando junto à esfera pública na elaboração de projetos de gestão de parques naturais e urbanos, o Instituto Semeia realiza estudos similares desde 2018. A coleta de dados para a última pesquisa em 2021 evidenciou o que já se imaginava: a pandemia mudou o censo de urgência e ampliou a visão das pessoas sobre as consequências de posturas e estilos de vida.Entre 8 e 29 de julho de 2021 o instituto ouviu 1.541 pessoas (131 em Goiás) com idades entre 16 e 70 anos em dez regiões metropolitanas. Embora o estudo não apresente dados específicos de cada estado, mostrou que 97% dos entrevistados revelaram conhecimento de parques naturais, mais distantes das cidades e menos acessíveis, e 81% mencionaram pelo menos um parque urbano.Leia também- Desmatamento atinge 50 hectares do Parque das Emas, em Goiás- Rios e córregos de Goiânia estão 77% menoresO Parque Ibirapuera, na capital paulista, é o destaque do estudo. Ele foi mencionado por 62% de sua região e por pessoas de todas as demais regiões pesquisadas.Desde as primeiras edições o estudo do Instituto Semeia se estrutura a partir de três dimensões: a agenda geral de preocupações da população e a posição ocupada por temas ambientais; o conhecimento sobre parques e a experiência de sua utilização; e a reflexão sobre os modelos de gestão dessas áreas.Em termos gerais, corrupção e desvio de verbas públicas permaneceram no topo das preocupações (50%), mas o índice que mais cresceu foi o incômodo com a desigualdade social, que passou de 34% no estudo anterior, para 42% em 2022.Aumentou também a preocupação com a proteção do meio ambiente, saltando de 17% para 22%. Os quatro aspectos mais mencionados se relacionam aos danos ambientais e a necessidade de contenção desses impactos. A poluição das águas é citada por 82% dos entrevistados; sustentabilidade para as próximas gerações por 79%; conservação da fauna e flora por 78%; e desmatamento por 76%.De acordo com o Instituto Semeia, o estudo ampliou espaço para uma maior inserção das temáticas que envolvem todo o espectro ligado aos parques. “O interesse intrínseco por esses temas permanece em patamares muito altos, ao passo que a posição relativa de questões ambientais no ranking de preocupações cresceu no último ano”. Entre os 14 itens de “muito interesse”, estilo de vida saudável e lazer ao ar livre são mencionados respectivamente por 76% e 71% das pessoas entrevistadas.Custo de viagem é maior barreira para visitasHá oito anos, o fotógrafo Wigor Vieira, de 35 anos, acompanha grupos de viajantes por Goiás. A agência onde presta serviço realiza excursões para localidades que investem em ecoturismo, como Alto Paraíso de Goiás, Cavalcante, Mambaí, Serranópolis e Caiapônia.“O que mais observo é o quanto as pessoas se desligam da correria cotidiana e se ligam na natureza. Elas ficam deslumbradas”, relata. Nos passeios, não é permitido nenhum tipo de som artificial. “Elas percebem a importância do silêncio na natureza, o quanto ele traz paz. Já vi muita gente se emocionar.” O Brasil, segundo dados do Sistema Nacional de Conservação da Natureza (SNUC), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), possui 2.598 Unidades de Conservação (UCs), 396 delas no Cerrado.Do total, 512 são parques naturais federais, estaduais e municipais que, teoricamente, deveriam estar abertos à visitação, mas não é o que ocorre. As demais UCs estão distribuídas em categorias como Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), reservas extrativistas, refúgios, Áreas de Proteção Ambiental (APAs) etc. Goiás possui dois parques naturais federais, o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros (PNCV) e o Parque Nacional das Emas (PNE), ambos abertos à visitação. Embora o Parque Nacional da Chapada Diamantina (BA) tenha sido o mais citado pelos entrevistados (55%), outros cinco foram mencionados por 40% das pessoas que responderam aos questionamentos, entre eles o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.Os demais foram o Parque Estadual da Serra da Cantareira (SP), o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PE), o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (MA) e o Parque Nacional da Tijuca (RJ).No ano passado, o PNCV recebeu 75.349 visitantes, um número 98% superior do que em 2020, quando a pandemia obrigou a suspensão ou a restrição das visitas, mas menor do que em 2019, quando 79.347 pessoas passaram pelo parque nacional em Goiás.A Sociparques, concessionária que oferece apoio aos visitantes, ainda mantém protocolos de biossegurança, como uso de máscara durante as visitas, o que pode explicar a queda no número de acessos à UC. O estudo Parques do Brasil - Percepção dos Brasileiros 2022 revela que os principais entraves para visitas mais frequentes para aqueles habituados a esse tipo de deslocamento são o alto custo de viagem (40%), a distância (25%) e o custo elevado de hospedagem (22%). Para quem nunca visitou, os índices para os motivos citados são ainda maiores, 53%, 36% e 24%, respectivamente. A pandemia afetou muito o bolso do brasileiro.EstaduaisNos parques naturais sob a responsabilidade da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), o crescimento de visitantes é uma realidade. Dos 13 parques estaduais - dois deles estão juntos e apontados como área única (João Leite e Altamiro de Moura Pacheco), oito estão abertos à visitação. De acordo com a Semad, em 2019, antes da pandemia, 61.141 pessoas passaram pelas UCs estaduais. No ano passado, este número saltou para 69.691 e até maio de 2022, já foram contabilizados 43.269 visitantes. Área verde recebe até casamentoA pesquisa mostra que, em comparação ao estudo anterior, nos parques urbanos aumentou a visitação esporádica durante a pandemia. Educadora ambiental da Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma) de Goiânia, Larissa Helena percebeu isso. “Nos finais de semana os parques estão lotados, as pessoas estão procurando respirar ar puro e tomar sol porque uma das indicações para enfrentar a Covid é a vitamina D.” A partir das restrições impostas pela pandemia, casamentos e aniversários passaram a ocorrer nos parques da capital.O estudo mostrou essa realidade. As menções a “caminhar” aumentaram de 46% para 52%. Para o Instituto Semeia, dois fatores explicam o aumento: para os que praticam caminhada é um hábito difícil de ser alterado e, por ser um exercício normalmente solitário, o risco de contágio é menor. O “encontro com amigos” nos parques urbanos passou de 29% para 36%. “Levar as crianças para passear” também apresentou pequeno aumento, passando de 32% para 36%. Para Larissa, que costuma receber grupos de estudantes no Parque Areião, um dos 62 parques urbanos de Goiânia, a principal percepção é em relação ao microclima. “Eles percebem o quanto as árvores e o sombreamento reduzem a temperatura”. Mas, segundo ela, a criançada está atenta ao lixo lançado nas áreas verdes e à depredação desse patrimônio. “Temos reforçado muito essas questões.A educadora ambiental reforça que muita gente não tem ideia do que existe no interior dos parques. “As pessoas passam pelas avenidas e não sabem o que eles têm a oferecer. Às vezes, quem precisa ir ao Hugo e ao Ipasgo decide entrar para passar o tempo e se impressiona com o que encontra.” O mesmo ocorre em relação ao Jardim Botânico. Ainda na região metropolitana, Aparecida de Goiânia conta com cinco parques urbanos. Diferentes atores para ampliar o potencialDiretor-presidente do Instituto Semeia, Fernando Pieroni diz que “apesar da visitação nas áreas verdes também ter sido impactada pelas medidas de distanciamento social, é possível afirmar que os parques serviram como área de refúgio e descompressão para os seus visitantes, em um momento em que encontros e reuniões foram muito desestimulados, principalmente em lugares fechados”. Para Pieroni, os parques podem atender a população de forma mais efetiva, cumprindo o papel de conservação da natureza e oferecendo mais e melhores serviços aos visitantes.“A forma mais efetiva para isso acontecer é por meio da conciliação de esforços entre diferentes atores da sociedade. Em uma rede de corresponsabilidade, governos e setor privado podem aportar novos recursos e ferramentas para a gestão destes espaços e transformar o potencial de todos eles em realidade, garantindo a oferta de um serviço público de qualidade.”