Preso e denunciado há um ano por participar de um grupo de extermínio, o tenente-coronel Carlos Eduardo Belele, de 57 anos, conhecido como Belelli, foi alçado à condição de coronel da Polícia Militar de Goiás em portaria publicada nesta terça-feira, dia 26, no Diário Oficial do Estado (DOE). O requerimento partiu do militar, que está se transferido para a inatividade. E nestes casos, conforme informa a Secretaria de Estado de Segurança Pública (SSP), a promoção ocorre de forma automática em virtude de o oficial contar com mais de 30 anos de serviço, conforme legislação estadual.Belele foi o principal alvo da Operação Circo da Morte, deflagrada em dezembro do ano passado pelo Grupo de Controle Externo da Atividade Policial (Gceap), do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), e pela Polícia Federal. Cinco policiais militares foram presos e denunciados pela prática de dois homicídios qualificados praticados na comarca de Santo Antônio do Descoberto, no Entorno do Distrito Federal, e por ocultação de cadáver. O militar ficou preso durante dois meses. Em fevereiro deste ano, a Justiça concedeu a ele habeas corpus.A denúncia foi baseada no Inquérito Policial nº 97/2017 da Polícia Civil de Goiás, o qual relata que os militares Carlos Eduardo Belele, Alessandro Bruno Batista, Ruimar Felipe Maia, Ismael Fernando Silva e Raithe Rodrigues Gomes agiram conjuntamente. De acordo com a peça acusatória, no dia 15 de março de 2017 os militares se deslocaram de Caldas Novas, onde eram lotados, até Santo Antônio do Descoberto, e retiraram de suas residências o casal de namorados Darlei Carvalho da Silva, de 31 anos, e Dalylla Fernanda Martins, de 21. O corpo de Darlei foi encontrado no dia seguinte numa chácara em Silvânia com marca de tiro no rosto. Dallyla continua desaparecida.As investigações do MP mostram que Carlos Eduardo Belele e outros policiais de seu batalhão estavam em Santo Antônio do Descoberto, município a cerca de 300 km de Caldas Novas, no dia em que o casal foi raptado. Ele e sua equipe passaram um tempo na cidade pedindo informações para a delegacia local sobre Darlei, que respondia processos por tráfico, porte de arma e homicídio. Sete dias antes, Belele havia matado o irmão de Darlei na zona rural de Caldas Novas, em uma ação policial, dita pela PM como troca de tiros, que também é questionada.A descrição dos três veículos dos sequestradores do casal, feita por testemunhas, são as mesmas dos utilizados por Belelli e seu grupo. Um deles era uma caminhonete com faróis na parte superior. Também foram coletadas informações por meio de interceptações telefônicas e estações de rádio base, que são torres que fazem conexões entre telefones celulares. Quando a operação Circo da Morte foi deflagrada em dezembro de 2018, a Polícia Militar de Goiás informou que as investigações estavam sendo acompanhadas pela Corregedoria e oficiais foram designados para acompanhar o cumprimento dos mandados de prisões. AmeaçasEm dezembro de 2018, Carlos Eduardo Belele ficou sabendo com antecedência que seria alvo de um mandado de prisão. Ele chegou a gravar um vídeo se defendendo e que foi publicado em sua página pessoal na internet logo após ser detido. No vídeo ele ataca os parentes do casal de Santo Antônio do Descoberto enfatizando que seriam uma “família de bandidos”, reconhece que esteve na cidade no dia do crime para investigar Darlei e Dalylla e que percorreu o trajeto onde o corpo do primeiro foi encontrado, mas nega sua participação nos crimes.De acordo as investigações do MP-GO, Carlos Eduardo Belele inicialmente teria chefiado o grupo criminoso na região da Chapada dos Veadeiros, quando era comandante do 14º CIPM. Mais tarde ele teria atuado em Caldas Novas, no 26º Batalhão, onde também foi comandante. Nesta época suas operações eram noticiadas em canal próprio na internet, com jornalistas contratados por uma assessoria da PM local.Em dezembro de 2018, ao ser levado para a Superintendência da Polícia Federal em Brasília, Carlos Eduardo Belele ameaçou promotores e policiais durante seu depoimento. Enquanto chorava, ele apontou o dedo para as autoridades presentes na sala e avisou que iria "desgraçar" a vida deles. "Vocês vão ter o monstro que estão criando. Eu vou desgraçar a vida de cada um de vocês. Pode constar aí no termo que quiserem", diz um trecho da descrição que foi assinada pelo próprio militar. Popular nas redes sociais, como tenente coronel Belelli, o militar abastece diariamente suas páginas no Youtube e no Facebook, onde conta com milhares de seguidores. De perfil linha dura, ele foi candidato a deputado estadual pelo Partido da República, mas ficou como segundo suplente. Em uma recente postagem confirmou que é pré-candidato à prefeitura de Caldas Novas no ano que vem porque ele "não tem nenhum impedimento". Em uma fotomontagem emblemática com seu rosto, ele escreveu: "Quem perdoa bandido é Deus, eu só promovo o encontro.”Promoção é automáticaEm nota a SSP informou que a portaria de promoção de Carlos Eduardo Belele está em consonância com o que determina a legislação estadual, ou seja, trata-se de ato automático pelo tempo de serviço prestado e comprovado. O requerimento partiu do militar que está se aposentando. A pasta explica que a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros Militar são corporações regidas por estatutos próprios.O parágrafo 12 do artigo 100 da Constituição Estadual prevê que "o militar da ativa fará jus à promoção ao posto ou graduação imediatamente superior, nas seguintes condições: contar pelo menos 30 (trinta) anos de serviço, se homem e 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se mulher; a promoção prevista neste parágrafo independe de vaga, de interstício ou de habilitação em cursos e, ainda, de que inexista, no quadro ao qual pertença o servidor, posto ou graduação superior à sua”. Já o parágrafo 13 do mesmo artigo define que para a obtenção do benefício, o militar deve requerer simultaneamente a transferência para a inatividade."A Secretaria de Segurança Pública destaca que a legalidade é intrínseca ao trabalho desempenhado pela pasta e que os direitos legais dos servidores são respeitados", enfatiza a nota. Procurado, o MP-GO preferiu não se manifestar sobre a promoção de Carlos Eduardo Belele. Habeas corpusO militar ficou preso durante dois meses. Em fevereiro deste ano, a Justiça concedeu a ele habeas corpus, decisão tomada em colegiado, formado por cinco desembargadores, em que três votaram. Foram dois votos a favor e um contra. O único a deliberar pela continuidade da prisão de Belele foi o desembargador Itaney Francisco Campos, que havia pedido vistas na solicitação da defesa do então tenente-coronel.O relator do caso, desembargador Ivo Fávaro, votou pela liberdade de Belele. O entendimento dele foi acompanhado pelo desembargador Avelirdes Almeida. Os outros dois desembargadores que compõem o colegiado não votaram. Um deles alegou suspeição e o outro porque se ausentou da sala momentaneamente.Belelli trabalhou como assessor de segurança no Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) nos anos de 2009 e 2010, durante a presidência do então desembargador Paulo Maria Teles, que é próximo do oficial. Teles, se aposentou em 2012 e voltou a advogar. (Com Thalys Alcântara)