Um despacho da Polícia Militar do Estado de Goiás (PM-GO) que pede monitoramento dos assentamentos da região da cidade de Goiás foi recebido com receio por líderes de movimentos sociais. O documento assinado no dia 11 deste mês solicita, entre vários itens, a identificação de vínculos políticos de assentados.O despacho assinado pela 2ª Seção do Estado Maior Estratégico da PM, foi encaminhado ao 4º Comando Regional, responsável pela região da cidade de Goiás. O documento solicita relatório sobre os assentamentos de forma dividida em quatro eixos. O POPULAR confirmou a veracidade do documento, mas a PM não quis falar sobre a razão da solicitação.Um dos coordenadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Goiás, Gilvan Rodrigues afirmou ao POPULAR que o pedido de mapeamento afronta a democracia. “Está explícito que o mapeamento busca grupos que lutam por terra, o que é um direito constitucional”, defende o coordenador.No primeiro item, o despacho solicita a localização e o mapeamento, por meio de coordenadas geográficas, dos “assentamentos/acampamentos inseridos na área da respectiva Unidade, bem como a denominação do movimento”.Os itens de preocupação de movimentos sociais são os demais, do 2 ao 4. Determina o item “2”: “Identificar e qualificar as lideranças locais desses movimentos, bem como levantar o quantitativo de pessoas em cada assentamento/acabamento (quantidade de crianças, mulheres e faixa etária dos integrantes desses movimentos)”.O item “3” pede a identificação e qualificação sobre envolvimento com políticos. Por fim, o item “4” pede “histórico de invasões, conflitos, ou qualquer assunto de interesse da segurança pública da região da Unidade”.“Na medida que o Estado começa a fazer mapeamento sem explicar os reais motivos, há o receio. Existe a perspectiva de talvez tentar enquadrar movimentos como organizações criminosas, isso já aconteceu em Goiás nos últimos cinco anos”, considera Rodrigues. RepercussãoO Comitê Goiano de Direitos Humanos Dom Tomás Balduíno, formado por 70 entidades de movimentos sociais, publicou nota em que diz temer a criminalização dos movimentos sociais. “Dado o histórico de perseguição de defensores e defensoras de direitos humanos no Brasil e em Goiás, o Comitê Goiano de Direitos Humanos Dom Tomás Balduíno teme que o levantamento de informações sirva para a criminalização dos movimentos sociais que lutam em defesa da reforma agrária”, considera a entidade.Ainda em nota, o Comitê diz que as ações precisam ser esclarecidas à sociedade e aos movimentos sociais goianos de forma transparente. “Explicando claramente os objetivos de tal levantamento de informações, assim como deve ser interrompido imediatamente qualquer tipo de vigilância ilegal e indevida”, cobra o Comitê, que defende: “A luta por direitos humanos no campo e na cidade não é crime, nem caso de polícia”.Nas redes sociais, João Pedro Stedile, coordenador nacional do MST, classificou o documento como a comprovação de “espionagem dos movimentos populares” por parte da PM. “Espero que providências sejam tomadas contra a violação do direito de livre organização”, escreveu o Stedile.De acordo com o coordenador do MST de Goiás, o movimento teria observado a presença de agentes que se identificaram como representantes do Estado em pelo menos quatro municípios, em assentamentos na cidade de Goiás, Aruanã, Palmeiras e Santa Helena. “Se colocam na condição de investigador do Estado, buscando informações das pessoas, do jeito de se organizarem e das referências dos líderes”, afirma Gilvan.Denúncias Segundo Gilvan, o documento já foi denunciado à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF). Além disso, há previsão de que em breve seja apresentado à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal. “Também estamos tentando agenda na Assembleia Legislativa e no Tribunal de Justiça, para levar a preocupação sobre o que está sendo feito e o que pode vir a acontecer”, considera o representante. A denúncia sobre a presença de agentes do Estado em assentamentos não foi comentada pelo Governo de Goiás, que também não respondeu sobre o teor do despacho da PM solicitando o mapeamento de acampamentos na região da cidade de Goiás.