A Polícia Civil de Goiás investiga um homem preso em flagrante por tráfico de drogas e posse ilegal de arma de fogo que usava o registro de atirador esportivo para portar um dos nove armamentos que mantinha em casa. A prisão foi registrada na última quinta-feira (21), em Trindade, região metropolitana de Goiânia. Há a suspeita de que o preso tenha relação com uma facção criminosa.A prisão de Matheus Pereira da Silva, de 26 anos, foi realizada após a Polícia Militar (PM) receber uma denúncia anônima de que ele estava armado. No momento da ocorrência o suspeito se apresentou como um CAC, abreviação para Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador. Ele apresentou um documento da arma, comprovando que a mesma era regular. No entanto, pelo nervosismo, os policiais realizaram uma vistoria no veículo, encontrando munições de outro calibre, o qual o suspeito não tinha autorização.Os policiais narram na ocorrência que Matheus autorizou uma vistoria em sua casa após ele próprio admitir ter mais munições. No local, foi identificada uma estrutura para o refino de cocaína. O que mais chamou atenção foi o armamento encontrado, em quantidade e calibres bem superiores do que era permitido no registro do suspeito. Enrolados em um lençol no quarto da casa estavam três fuzis, sendo dois semiautomáticos, duas espingardas semiautomáticas, uma carabina, e duas pistolas.Nenhuma das armas estava com a numeração raspada. A única que foi identificada está registrada no nome de uma mulher que não tem relação indicada com Matheus. Na residência também foram apreendidas 500 munições de diversos calibres. A estimativa da polícia é de que, somados, os equipamentos valem mais de R$ 1 milhão.Questionado sobre as armas e a droga, o suspeito disse que estava guardando tudo para outro traficante. Segundo Matheus, ele estava realizando o serviço desde março deste ano e receberia R$ 15 mil por mês.Com Matheus, além das armas, foram apreendidos dois coletes balísticos, dois carregadores tipo caracol, sete carregadores de munição calibre 5,56 mm, seis carregadores de pistola modelo Glock, duas balanças de precisão, e aproximadamente R$ 10 mil, aproximadamente quatro quilos de pasta base de cocaína, além de nove quilos substância descrita como provável cloridrato de cocaína.Já na delegacia o homem ficou em silêncio durante a maior parte do depoimento. Entre as questões que respondeu está a ocupação como empresário e a renda de R$ 30 mil mensais.RegistrosA prisão do homem que apresentou um registro regular de posse de arma de fogo acende alerta sobre o crescimento do número de novas autorizações para atiradores esportivos no País. Das 72 mil armas registradas pelo Exército em Goiás, 47 mil foram registradas nos últimos quatro anos, o que corresponde a 65%.O POPULAR mostrou, em reportagem publicada em dezembro do ano passado, que 64% dos novos registros de 2020 foram para pessoas físicas. O último levantamento realizado pelo Instituto Sou da Paz, com dados de 2016 e 2017, mostra que 43% das armas apreendidas com criminosos já haviam sido legalizadas em algum momento.Melhorias do sistemaPara o advogado Alan Cabral Júnior, que é um CAC, é preciso haver maior rigor para permissões de aquisição de armamento, citando a exigência de comprovação de idoneidade e certidões negativas de antecedentes criminais.O advogado cita que a atual legislação, alterada nos últimos anos, autoriza que uma mesma pessoa tenha até 60 armas registradas e 180 mil munições anualmente. “Com esse grande volume, é possível que se dê destinação diversa ao armamento/munição, como o repasse às organizações criminosas”, considera.O decreto federal do início de 2021 liberou armas que antes eram consideradas de uso restrito para serem compradas por civis. Antes do decreto só eram permitidas armas com calibre as de calibre 38, 22, 25 e 32. Agora, é possível adquirir as pistolas 9mm, .40, .44, .44, .45 e .357. Permanecem restritas armas como a .50, e a .454.O representante do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Cássio Thyone, que é perito criminal aposentado, diz que vários fenômenos começam a ser observados por conta do aumento de registros de armas de fogo. “O que está começando a chegar como notícia nada mais é do que o reflexo do que temos falado há algum tempo. Não é possível que todo esse contingente de novos atiradores refletisse exclusivamente no fim autorizado”, afirma.Entre as questões, Thyone cita o aumento de disparos acidentais com armas de fogo e o uso dos instrumentos para ameaças. Caso de repercussão no último mês, João do Rosário Leão, de 62 anos, dono de uma farmácia da capital, foi executado pelo genro, Felipe Gabriel Jardim Gonçalves, de 26 anos, que era registrado como CAC.Modelo carece de melhoriasPara o advogado Alan Cabral, há caminhos para garantir segurança ao atual modelo de liberação de armamento no Brasil, “talvez, com a comprovação anual de que a arma ainda esteja sob sua posse e visita à residência cadastrada, para fins de fiscalização, para que se possa averiguar se o armamento não tenha sido cedido/vendido”, cita. Outra questão apontada pelos dois entrevistados ao POPULAR é o transporte do armamento. A prisão de Matheus, por exemplo, não considera irregular o porte da arma no momento em que ele foi abordado, já que a arma era regular. No entanto, o entendimento é de que o transporte só deve ser realizado quando a pessoa está indo praticar a atividade permitida aos CACs. “O CAC deve transportar o armamento quando efetivamente está indo para o clube de tiro ao qual é associado, não devendo ele presumir ter permissão de portar a arma a qualquer hora do dia ou noite e em qualquer lugar. A finalidade do CAC é diferente daquele que possui porte de arma”, alerta Cabral.Leia também:- Homem é baleado e morre na frente da mulher e do filho em Pires do Rio- Jovem denuncia ter sido acusado de furtar creme em farmácia por ser negro- Homem é resgatado com hipotermia em córrego da Marginal Botafogo-Imagem (1.2497826)