O Hospital Estadual de Doenças Tropicais Dr. Anuar Auad (HDT), em Goiânia, está diminuindo a quantidade de médicos que atendem em seu pronto-socorro. A urgência da unidade deixará de ter dois profissionais por plantão para ter apenas um. Trabalhadores do hospital dizem temer que a qualidade do atendimento diminua após a mudança. Cinco médicos já foram demitidos no início da semana, de acordo com funcionários ouvidos pela reportagem. Segundo a gestão do HDT, o fluxo do hospital não justifica dois plantonistas.A redução do pronto-socorro do hospital, que foi anunciada em uma reunião na noite da última segunda-feira (7), faz parte de um plano maior, batizado de “redimensionamento médico”, que na prática é a redução de custos. As mudanças estão sendo aplicadas pelo novo diretor-geral da unidade, Roger Moreira. Ele assumiu o cargo em agosto deste ano, um mês depois que foi assinado um termo aditivo contratual que permite a gestão do HDT pela Organização Social (OS) Instituto Sócrates Guanaes (ISG) só até o final deste ano, quando deve ocorrer um novo processo seletivo. O IGS administra o HDT desde 2012.O anúncio da diminuição da urgência causou revolta em profissionais do hospital, que se reuniram na última terça-feira (8) e decidiram cobrar uma mudança de posição da gestão do HDT. Um ofício assinado pelo diretor-clínico Pedro Mário de Rezende Filho defende que a diminuição do pronto-socorro vai contra resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM), que fiscaliza e normatiza a prática médica.Uma resolução do CFM diz que a “sala de estabilização ou procedimentos avançados”, conhecida como “reanimação” e que compõe o pronto-socorro, deve ter um médico exclusivo. Na reunião de segunda, um gestor do HDT defendeu que esta resolução é para um fluxo de 50 mil pacientes por ano e que no caso da urgência do Hospital de Doenças Tropicais são 7 mil anuais.Para Rezende Filho, a diminuição da urgência do HDT pode prejudicar o atendimento e colocar o paciente em risco. Ele explica que o único plantonista do pronto-socorro vai ser responsável pela sala de reanimação e pela enfermaria ao mesmo tempo, não podendo se ausentar da primeira para atender a segunda. “O entender nosso é que mesmo que não tenha o fluxo desejado, esse fluxo é dinâmico. Ninguém sabe quando vai chegar vários pacientes ao mesmo tempo, que requer tempo e dedicação”, explica o médico. Ele pontua, no entanto, que ele e o corpo clínico não são contra a gestão do hospital, mas sim contra esta medida específica.Durante a reunião de segunda, um gestor do hospital defendeu que o objetivo da mudança é ter “o melhor atendimento com o menor custo possível”. Também foi afirmado que o governo de Goiás paga por 750 atendimentos na urgência por mês no HDT, enquanto em hospitais maiores, como o Hospital Estadual de Urgências de Goiânia Dr. Valdemiro Cruz (Hugo) e o Hospital Estadual de Urgências Governador Otávio Lage de Siqueira (Hugol), seriam pagos por 3.500 e 4.150 atendimentos respectivamente.Além disso, a gestão do hospital avaliou que o custo do paciente do pronto-socorro do HDT seria acima da média goiana e nacional. Segundo apresentado na reunião, cada paciente do HDT custa R$ 1.800, enquanto a média do Estado é R$ 357 e no Brasil R$ 235.Ainda na reunião, ao ser questionado sobre casos em que mais de um paciente está em estado grave, gestores do hospital defenderam que quando isso acontecesse, o paciente extra poderia ser atendido por um residente, médico em treinamento, ou por outro médico, de outra área do hospital, que seria remanejado. O diretor-clínico Pedro Mário de Rezende Filho defende que essa utilização de residentes também estaria contra resoluções do CFM. “Nós nunca sabemos quando vai ter um incêndio, mas o corpo de bombeiros não tem de estar em prontidão?”, indaga o profissional.Procurado pela reportagem, o ISG informou que o desligamento ou substituição de colaboradores do HDT segue “critérios técnicos após rigorosa análise dos gestores imediatos”. A OS também garante que a quantidade de funcionários do hospital é suficiente para toda a sua necessidade operacional e permite a qualidade da assistência prestada aos pacientes, além do cumprimento das metas pactuadas com o governo de Goiás.A reportagem também entrou em contato com a Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO), que disse que quem responderia às informações sobre o HDT seria apenas a OS responsável pela gestão do hospital. Sindicato vai acionar CremegoA presidente do Sindicato dos Médicos de Goiás (Simego), Franscine Leão Rodrigues Acar Pereira, deve se reunir com médicos do Hospital de Doenças Tropicais (HDT) para verificar a demanda dos profissionais após a diminuição do pronto-socorro da unidade. Após isso, ela deve pedir que o Conselho Regional de Medicina de Goiás (Cremego) verifique como vai ficar a situação da urgência do HDT com apenas um médico por plantão. O órgão deverá avaliar a proporção de pacientes, a estrutura do hospital e a complexidade dos pacientes. “Vamos solicitar um parecer do Cremego para defesa dos profissionais. Precisamos deste respaldo legal para não sair atropelando os processos. Se fizer de forma abrupta acaba cometendo erros e fica ruim para o sindicato”, explica a médica.Franscine já adianta que é preciso verificar, por exemplo, a quantidade de procedimentos que são feitos no pronto-socorro durante um plantão de 12 horas. Ela exemplifica hipoteticamente uma situação que seria problemática. “Se o médico está fazendo (um tipo de) intubação de um paciente na reanimação que dura 40 minutos, e chegam outros pacientes do mesmo perfil, da mesma gravidade, ao mesmo tempo, demanda um segundo plantonista.”A reportagem tentou entrar em contato com o presidente do Cremego, Leonardo Mariano Reis, mas não teve retorno até o fechamento desta edição. Segundo, a assessoria do órgão, ele só poderá conceder entrevista nesta quinta-feira (10).