Desequilíbrio financeiro, problemas em contratos, dificuldades de fiscalização e falhas de comunicação com usuários. Com mais de 30 anos de história, o Instituto Municipal de Assistência à Saúde dos Servidores de Goiânia (Imas) segue enfrentando problemas que dificultam a consolidação do plano de saúde e afetam os segurados. O panorama é resumido em registros das reuniões semanais de conselheiros que fiscalizam a autarquia municipal.Nas atas dos encontros do Conselho de Assistência à Saúde e Social dos Servidores Municipais de Goiânia (Conas) deste ano, conselheiros chamam atenção para problemas recorrentes que são descritos como “antigos”. Com questões que passam por atraso de pagamento para hospitais e deficiências em fiscalizar conduta de unidades credenciadas, os mais de 80 mil usuários sofrem com baixa fidelização de profissionais e negativas de solicitações de atendimentos.A transição entre gestões é apontada por conselheiros como fator mais prejudicial na condução do Instituto. Nas reuniões do Conas, os conselheiros, que são representantes sindicais, destacam que a cada passagem um novo presidente tenta deixar o próprio “marco”, fazendo com que ciclos administrativos voltem ao zero. Só entre os últimos quatro anos o instituto mudou de gestão cinco vezes.“Como fala da consolidação de um plano de gestão se o presidente não fica nem um ano?”. O questionamento é da conselheira Ludmylla Morais, que representa o Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) no Conas. Pelo celular, Ludmylla recebe dezenas de mensagens em que servidores reclamam de falhas do Imas. “Não são problemas que nasceram ontem. O Imas já foi um plano de excelência, mas ao longo do tempo a falta de transparência desencadeou vários problemas”, diz. Mesmo assim, Ludmylla pondera e diz que vê avanços nos últimos meses.OrçamentoO atual presidente do Imas, Junior Café, diz que quando assumiu a gestão, no dia 5 de maio, se deparou com a “iminência” de caos. Segundo o gestor, por conta da falta de repasse, apenas um grande hospital estava atendendo pelo plano. O déficit orçamentário acumulado estava em mais de R$ 45 milhões, fazendo com que hospitais ficassem sem receber por meses. “Chamamos os hospitais credenciados para conversar e falamos que a realidade era aquela e que nós iríamos começar a tratar desses problemas e se havia interesse por parte deles em retomar os atendimentos. O que eles disseram era que não existia diálogo anterior e que tinham sim o interesse.”As dívidas com os hospitais têm diferentes fontes. Além da falta de repasses de contrapartidas da administração pública, o custo das operações sempre fica em déficit. Os custos mensais do Instituto ficam em R$ 15 milhões enquanto a arrecadação não ultrapassa R$ 13 milhões. A diferença é paga pela gestão municipal com recursos do Tesouro Municipal.A maior dívida está concentrada na falta de repasses do Goiâniaprev referentes aos pagamentos de porcentagem de servidores aposentados. Na conta atual, a dívida está em R$ 60 milhões. “Se esse repasse fosse feito o problema financeiro do Imas praticamente acabaria”, diz o conselheiro Aliandro Paulo, representante do Sindicato dos Trabalhadores no Sistema Único de Saúde do Estado de Goiás (Sindisaúde-GO).Com um orçamento que não fecha, a dinâmica de pagamentos dos credenciados observa os “mais urgentes”. “Até que seja feito o ajuste programado, cobre um santo e descobre o outro”, observa Aliandro.Para a conselheira Ludmylla, outro problema é que “o dinheiro arrecadado pelo Imas não fica com o Imas”. “Vai para a conta única da Prefeitura e o que o rende não vem para o Instituto. O gestor vive com o pires na mão. É uma autarquia que não tem fundo. Tem autonomia para pagar, mas não para receber”, diz a conselheira.Sistema de cotasAlém dos pagamentos em atraso, a falta de compreensão sobre os créditos por parte dos hospitais afeta os segurados. Até o início de abril o Imas adotava o chamado “sistema de cotas”, modelo em que os hospitais tinham limites de atendimento pelo plano. Abolido, deu lugar à dinâmica de crédito em dinheiro, que pode ser expandido caso haja demanda.Apesar de ser defendido como um sistema diferente, os hospitais seguem considerando que há imposição de limites de atendimento. Nas reuniões, os conselheiros citam semanalmente, até o mês de setembro, casos de usuários que foram informados por hospitais de que “não há mais cotas do Imas” e que o agendamento pelo plano só é possível para meses depois.Em uma das visitas mais recentes do Conas, feita em setembro no Hospital Infantil de Campinas, os conselheiros apuraram suspensão de atendimento. A justificativa era de que os pagamentos estavam atrasados. “Chegando lá fomos recebidos pelos diretores e pedimos para eles darem uma olhada no contrato. O contrato fala que o pagamento pode ser feito até 70 dias depois que eles enviam o que tem de ser pago. Só que eles não se atentaram a esse fato. Eles assinaram, mas não leram o contrato”, afirma Aliandro Paulo, conselheiro do Conas.Após a visita, o hospital retomou os atendimentos pelo plano. “O que temos percebido nas denúncias é que grande parte dos prestadores não se atentam ao contrato, aos e-mails que o Imas envia sobre alterações”, acrescenta Aliandro.Em nota, a Associação dos Hospitais Privados de Alta Complexidade do Estado de Goiás (Ahpaceg) diz que os hospitais que fazem parte da associação e são credenciados pelo Imas afirmam que a alegação de negativa de atendimento não procede. “Por parte dos hospitais, o contrato com o Imas tem sido cumprido regularmente, mesmo diante da constante inadimplência do Instituto.”Para Júnior Café, as razões da falta de compreensão podem ser várias, mas afirma que essas não são por parte do Imas. “Existe uma persistência em um ciclo que era vicioso. Temos um sistema que mostra todos os avisos, não existe falar que não sabia. Pode existir uma falta de comunicação no próprio hospital”, diz. “Existia uma cultura de: ‘o Imas há 30 anos funciona dessa forma’. Na medida em que entramos nós falamos a partir desse momento vai funcionar desse jeito. A partir do momento que o credenciado fala isso (que não há cotas) está mentindo.”Interrupções afligem usuáriosCom as instabilidades de repasses e falta de compreensão do sistema de crédito, profissionais deixam de atender pelo plano de forma repentina, resultando em transtornos aos usuários. É o que conta o agente de combate a endemias, Aliandro Paulo. “Eu faço tratamento para ansiedade, tratava em uma clínica, um dia eu chego lá e o médico não me atendeu pelo plano porque não estava recebendo. Nessas situações ou tem que pagar particular ou mudar o profissional, com risco de voltar para a estaca zero do tratamento.”Outro problema enfrentado pelos segurados é a plataforma de agendamento de consultas. “Depois de muito tempo você consegue agendar uma especialidade, por exemplo, fala que está tudo certo, quando chega para consultar a guia está travada e você tem que se deslocar e ir ao Imas para você poder voltar ao hospital. Isso é terrível”, acrescenta o agente de combate a endemias.Um motivo agravante dos problemas seria a falta de comunicação entre o Imas e os usuários. A conselheira Ludmylla diz que em visita ao Hospital Santa Maria o Conas descobriu que a unidade faz endoscopia 24 horas por dia, em todos os dias da semana. “Esse tipo de coisa não é informado”, relata.Sobre a demora em conseguir agendamento para especialidades, o presidente do Imas diz que a meta é reduzir a espera ao menor tempo possível, mas reconhece que o desafio tem complexidades. “Estamos buscando hospitais que tenham o máximo de profissionais para atender as várias especialidades”, diz o presidente do Imas, que não estima tempo exato para a solução dos problemas do Instituto. “Seria muito incoerente se eu desse um tempo para solução total da situação. Existe a questão dos credenciados que a gente espera que se resolva no recredenciamento. A partir de janeiro são novas etapas.”Gestão espera melhora após novo credenciamentoUma das principais esperanças por melhorias no Imas está concentrada no novo edital de credenciamento dos hospitais. O documento que deve ser apresentado em 30 dias deverá ter adesão de todos os credenciados. Com novas cláusulas editadas pelo Imas e Conas, o edital irá “deixar mais claro” as atribuições e possíveis sanções contra unidades que não cumprirem regras.“Deixando bem claro se ele não estiver fazendo como deve ser, nós vamos notificar, suspender e inclusive fazer o descredenciamento. Se negarem a atender nós queremos saber o porquê. Não podemos deixar. A gente quer separar o joio do trigo. Precisamos ter qualidade”, diz Júnior Café, presidente do Imas.A conselheira Ludmylla Morais diz que o novo edital é prioridade. “Precisamos valorizar os bons e tirar aqueles que só se credenciam para fazer grandes cirurgias. Precisamos reduzir o credenciamento de pessoas físicas. Nós precisamos de hospitais credenciados, para que os usuários possam buscar as diferentes especialidades pelo plano”, defende a conselheira.-Imagem (1.2354560)