Marcado por momentos de tensão, o júri do assassinato do radialista Valério Luiz foi iniciado oficialmente nesta segunda-feira (13). O primeiro dia de tomada de depoimentos se deu quase dez anos após o crime, depois de adiamentos e tentativas de manobras.Os primeiros a serem ouvidos foram as testemunhas de acusação, que são cinco. Uma ficou para amanhã. Elas falaram sobre o dia a dia do comunicador, as ameaças sofridas por ele e detalhes do dia do crime.No banco dos réus está o empresário Maurício Sampaio, apontado como mandante do crime, e outros três acusados. O início dos trabalhos foi, formalmente, a continuação da audiência iniciada no último dia 2 de maio, quando a defesa de Sampaio abandonou o plenário, alegando suposta suspeição do juiz e dos promotores que atuam no caso. A previsão é que o júri dure de três a quatro dias.A sessão teve início às 9h46 no Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO). A defesa de Sampaio solicitou que o réu fosse julgado em separado. O pedido, no entanto, foi negado pelo juiz Lourival Machado.Os trabalhos do júri atrasaram pela ausência de três testemunhas, entre elas o tenente-coronel Wellington de Urzêda Mota e o atual presidente do Atlético Goianiense, Adson Batista, ambos requisitados pelos advogados de defesa. Após o atraso, o primeiro depoimento foi iniciado às 13h40.A primeira testemunha ouvida foi o delegado Hellynton Carlos de Carvalho, um dos líderes das investigações sobre a morte de Valério, tendo trabalhado na Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH) por sete anos. Entre os destaques, ele falou sobre as provas e afirmou que Sampaio era a única inimizade do radialista.De acordo com Carvalho, os trabalhos da Polícia Civil concluíram que o comunicador não tinha problemas como dívidas e conflitos passionais. “A única preocupação que ele estava tendo nos dias anteriores ao homicídio seria sobre essas críticas mais contundentes que ele teria feito à direção do Atlético Goianiense. A única inimizade que ele teria, efetiva, nesse meio, seria com o senhor Maurício Borges Sampaio”, contou o delegado.O episódio a que Carvalho se refere se deu durante um comentário do radialista contra os dirigentes do Atlético, incluindo o então vice-presidente Maurício Sampaio, por conta de uma temporada ruim do clube.Para além dos comentários feitos próximos à data do crime, Sampaio já nutria a inimizade havia pelo menos dois anos. O delegado relembrou que o então vice-presidente havia alegado difamação em um termo circunstanciado de ocorrência (TCO) registrado contra Valério Luiz dois anos antes do crime.“O acusado (Sampaio) alega que não tinha inimizade com a vítima, que o TCO foi apresentado apenas enquanto representante do Atlético. As provas testemunhais dão comprovação de que havia animosidade entre eles”, destacou o delegado ao júri.TensãoDurante o depoimento de Carvalho, advogados de defesa e acusação trocaram queixas sobre possíveis irregularidades das atuações. Uma das perguntas feitas por um advogado de defesa foi interrompida pelo filho do radialista, o advogado Valério Luiz Filho, que faz parte da assistência de acusação. Segundo Valério, os advogados estariam fazendo sustentação oral, ato que seria impróprio para o momento.Exaltado, o advogado Luiz Carlos Silva Neto, que lidera a defesa de Maurício Sampaio, afirmou que o filho do radialista não teria direito de interromper as perguntas da defesa.CenaA segunda testemunha ouvida foi o publicitário Alípio Nogueira, que trabalhava com Valério na época do crime. O ex-colega de trabalho falou sobre a convivência com o radialista e detalhou bastidores que incluem pressões contra o trabalho de Valério como comentarista esportivo.Em um dos trechos, disse que foi procurado pela diretoria do Atlético para escrever uma carta impedindo Valério de frequentar o clube. Diante do pedido, disse que não concordou.No dia do crime, Nogueira, que estava no prédio do veículo de comunicação em que ambos trabalhavam, escutou os tiros e chegou ao carro em que Valério estava cerca de um minuto e meio depois. No local, teria encontrado duas pessoas, entre elas Urbano de Carvalho Malta, um dos acusados. Sessão era adiada desde 2020O júri havia sido marcado para junho de 2020, mas, por causa da pandemia da Covid, foi adiado para março de 2022. Na data prevista, o julgamento teve o início alterado depois que o advogado de defesa de Sampaio, Ney Moura Teles, renunciou ao caso. No dia 2 de maio, os advogados que assumiram o caso após a saída de Ney Moura Teles informaram que iam se ausentar do plenário até que fosse julgada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a alegação de parcialidade do juiz Lourival Machado da Costa, levantada pela defesa.Remarcada a sessão para esta segunda-feira (13), a defesa de Sampaio solicitou novo adiamento. O advogado Luiz Carlos Silva Neto argumentou que no mesmo dia precisaria estar no Rio de Janeiro para atuar na defesa de um cliente que está preso e vai passar por uma audiência de instrução e julgamento. O pedido, no entanto, foi negado.Silva Neto chegou a afirmar que não compareceria ao julgamento, seguindo também com a estratégia de questionar a imparcialidade do juiz. O pedido de suspeição feito pela defesa contra o magistrado foi arquivado no CNJ e não deve avançar no Judiciário.CrimeValério Luiz de Oliveira, na época com 49 anos, foi morto quando saía da emissora de rádio em que trabalhava, no dia 5 de julho de 2012, no Setor Serrinha, em Goiânia. A motivação do crime seriam as críticas feitas pelo radialista contra a direção do Atlético Futebol Clube, da qual Sampaio fazia parte. De acordo com as investigações, no dia 17 de junho de 2012, ao falar a respeito de possível desligamento de Maurício Sampaio da diretoria do time, Valério afirmou “nos filmes, quando o barco está afundando, os ratos são os primeiros a pular fora”.Em represália, a diretoria do Atlético Clube Goianiense proibiu a entrada das equipes jornalísticas nas dependências do clube. Depois disso, Maurício teria procurado os policiais militares Ademá Figueiredo, e Djalma da Silva, que contou com o auxílio de Urbano Malta para organizar o crime, que era próximo de Maurício. Djalma também teria convidado Marcus Vinicius para fazer parte do crime. De acordo com a investigação, ele, que era proprietário de um açougue, chegou a guardar a arma do crime no estabelecimento e o celular que seriam utilizados no homicídio. Os chips dos telefones utilizados na comunicação foram habilitados em nomes de outras pessoas.O caso foi investigado pela Polícia Civil e quatro pessoas, além de Sampaio, foram indiciadas por homicídio e denunciadas pelo Ministério Público de Goiás: o sargento reformado da PM Ademá Figueredo, apontado como o autor dos disparos; o empresário Urbano Malta, acusado de contratar o policial militar; o sargento da PM Djalma Gomes da Silva, que teria ajudado a planejar o crime e Marcus Vinícius Pereira Xavier, que também teria ajudado a planejar o homicídio. Este último está em Portugal, mas deverá participar de forma on-line do júri.Definido por sorteio, o corpo de jurados do júri popular está composto exclusivamente por homens. O júri tem apenas hora para começar, às 8h30, com pausas para almoço e jantar, mas as interrupções diárias dependerão do magistrado, que levará em conta o andamento do julgamento.A defesa afirma que os réus são inocentes.PresençaA família do radialista Valério Luiz esteve presente para assistir ao primeiro dia do júri. Além do filho, Valério Luiz, que faz parte da assistência de acusação, marcaram presença a filha mais nova, Laura Gomes e a esposa do radialista, Lorena Nascimento de Oliveira.“Muito importante estar aqui porque queremos acompanhar o desfecho desta história, nós esperamos muito por isso”, destacou Laura na tarde desta segunda-feira. (Colaboraram Leicilane Tomazine e Ton Paulo)Leia também: - Única inimizade de Valério era Maurício Sampaio, diz delegado responsável pela investigação- Júri do caso Valério Luiz fica tumultuado após bate-boca de advogados- Após quase 10 anos do crime, Sampaio e mais 4 são julgados pela morte do radialista Valério Luiz-Imagem (Image_1.2472839)