Em pouco mais de um ano de pandemia do coronavírus (Sars-CoV-2), 13 professores da Universidade Federal de Goiás (UFG) e 18 técnicos administrativos em educação perderam a luta para a Covid-19 e se juntaram aos mais de 10 mil mortos pela doença em Goiás. A história deles, que se mistura à da própria universidade, deixa saudades, aprendizados e doação. Na docência, quase todos eram aposentados e provavelmente estariam nas primeiras filas de vacinação iniciadas nos últimos meses. Eduardo, Marcos, Roque, Emanuel, José Pedro, Ana, José de Bastos, Maria Emília, Ruth, Jalles, Antônio, Zuleica, Josias e o medo de que esta lista continue crescendo.A última morte confirmada dos docentes da UFG foi em 8 de março deste ano, já em meio à superlotação de leitos nos hospitais do Estado, no Dia Internacional da Mulher. Maria Emília de Castro Rodrigues era aposentada, mas tinha apenas 56 anos. Reconhecida e querida, foi homenageada pelas colegas de docência. Emilia foi uma das fundadoras do Fórum Goiano de Educação de Jovens e Adultos (EJA), nos anos 2000.Em uma das homenagens, assinada pela professora Maria Margarida Machado, da Faculdade de Educação, a emoção tomou conta. “É com imensa saudade da risada alta e prolongada que ocupava os corredores da FE/UFG, dos encantadores cartões produzidos por suas mãos de artesã, das suculentas que nasciam dos seus “dedinhos verdes”, mas, sobretudo, da generosidade e do cuidado com que tratava a cada um sem distinção, que nos despedimos desta valorosa companheira”, diz a carta feita pela amiga.O presidente do Sindicato dos Docentes das Universidades Federais de Goiás (Adufg), Flávio Alves da Silva, diz que este foi um dos casos que mais lhe marcaram, justamente pela falta de leitos. “Todo o cenário é muito triste, mas a Maria Emília pegou o caos atual. Precisava de UTI e não tinha vaga. Me envolvi diretamente e ela só conseguiu vaga depois de 24 horas. Outras 24 horas se passaram e ela morreu. Essa demora pode ter influenciado na morte”, acredita.Reitor da UFG, Edward Madureira lamenta toda a perda da instituição porque, além dos professores, houve um número ainda maior dos técnicos, mas se emociona ao lembrar os nomes. “Essa é uma das faces da pandemia, desse momento terrível em que estamos vivendo. No caso dos professores, quase todos eram aposentados, muito esclarecidos, tomavam cuidados. É claro que toda vida importa para a gente. Absolutamente toda vida importa para a gente. Mas, a cada morte, a cada notícia que a gente recebe, é um pedaço do nosso coração, da história da universidade”,diz Madureira.Após quase 50 anos de dedicação exclusiva à UFG, o médico pediatra Roque Gomide Fernandes foi uma das vítimas. Morreu em agosto passado por complicações da Covid-19. Formado pela federal de Goiás no final da década de 1960, fundou o Instituto Goiano de Pediatria (Igope) no início dos anos 1970 e também foi presidente da Sociedade Goiana de Pediatria (SGP). Casado há 45 anos, pai de quatro e avô de seis, Roque ficou internado por uma semana no Hospital do Coração, no Setor Oeste, na capital, mas não resistiu.Com a chegada da Páscoa, a filha Paula Gomide, de 41 anos, que é psicóloga, afirma que a saudade ainda é grande. “Seu prato favorito era uma deliciosa bacalhoada, que fará parte do nosso cardápio de Páscoa. Não está sendo fácil lidar com essa partida repentina, que nos pegou de surpresa num momento tão sensível. Tudo nos faz lembrar dele”, afirma a filha Paula Gomide. A psicóloga diz que o pai já estava com alguns problemas de saúde, o que pode ter deixado ele ainda mais fragilizado. “O pulmão estava bom, mas o rim parou. Ele tentou sobreviver por quatro dias na UTI, mas não resistiu”, completa a filha.Ana Cáritas Teixeira era aposentada e carregava uma longa história de dedicação como docente da Faculdade de Educação da UFG. Foi pró-reitora de Extensão na universidade e diretora do Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (Cepae). Além disso, atuou como diretora do Campus Avançado de Jataí (CAJ) e foi peça fundamental para que se transformasse em Universidade Federal de Jataí. Graduada em pedagogia pela Universidade Católica de Goiás em 1965, cursou doutorado em Ciência da Educação pela Université Paris-Descartes em 1990 e se destacou na Psicologia do Desenvolvimento Humano.“A Ana Cáritas foi fundamental para que hoje tenhamos a UFG de Jataí. Ela convenceu Maguito Vilela, que na época era governador do Estado. Agora, ambos foram vítimas da Covid. Perdemos pessoas de uma enorme capacidade de realização, professores e técnicos brilhantes, que sem dúvida fizeram um serviço de grande valor para a sociedade. Nosso desejo é que isso pare, mas não temos nenhuma garantia. A falta de coordenação nacional levou o Brasil a essa situação. Estamos perdendo pessoas muito queridas, algumas que não tiveram tempo sequer de esperar pela vacina que também não avança da maneira como esperávamos”, afirma o reitor Edward Madureira.Morte após busca tardia por socorroNo ano passado, dois dos professores da Universidade Federal morreram após atendimento tardio. Presidente do Associação de Docentes da UFG (Adufg), Flávio Alves da Silva lembra de Eduardo Arbieto Alarcon. Aos 63 anos, era professor do Instituto de Matemática e Estatística (IME), pioneiro do curso de matemática em Rialma e na interiorização da universidade. Ele faleceu cerca de 4 horas após o atendimento, sete dias após primeiros sintomas gripais. Os pulmões apresentavam 80% de comprometimento. Ginecologista e obstetra, Josias Rosa da Silva morreu em julho de 2020, aos 77 anos. Ele foi o terceiro médico de Goiás a perder a luta para a doença provocada pelo coronavírus (Sars-CoV-2). O médico sentiu alguns sintomas como cansaço físico. Na época a família disse que ele teria se recusado a procurar atendimento. Perdeu olfato e paladar e o teste de Covid-19 deu positivo um dia antes da morte. Chegou a ser levado para o hospital, mas chegou desacordado. José Pedro de Oliveira Alvarenga, de 68 anos, era ex-docente da Faculdade de Educação Física e Dança (FEFD). Marcos Bueno foi o segundo professor da ativa a morrer pela doença. Docente na universidade há 10 anos, era Diretor Pro Tempore da Unidade Acadêmica de Gestão e Negócios, professor do curso de Administração e sub-chefe da Unidade Acadêmica Especial de Engenharia e Administração da Regional Catalão. Durante mais de 30 anos, se dedicou à psicologia e foi homenageado na Assembleia Legislativa de Goiás, um mês depois, no dia do psicólogo. Emanuel de Oliveira Costa atuou na Escola de Engenharia Civil e Ambiental e foi da diretoria do Adufg por quatro gestões. Mais que números, vidas interrompidas. -Imagem (Image_1.2217680)-Imagem (Image_1.2217679)-Imagem (Image_1.2217681)-Imagem (Image_1.2217682)-Imagem (Image_1.2217683)-Imagem (Image_1.2217684)-Imagem (Image_1.2217685)-Imagem (1.2217776)