Os belos crepúsculos avermelhados observados em Goiás nos últimos dias, marcando o início do outono, enchem os olhos, mas devem ser associados em grande proporção às queimadas já registradas em todo o País com o começo do período de estiagem. Nos primeiros 20 dias de abril, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) detectou quase 2 mil focos no Brasil, 800 deles no Mato Grosso e 207 em Goiás. Uma pluma tênue de emissão vulcânica também paira sobre a América do Sul, contribuindo para as cores quentes do nascer e do pôr do sol.Pesquisadora do Inpe e do Centro de Excelência em Estudos, Monitoramento e Previsões Ambientais do Cerrado (Cempa), a física Karla Maria Longo de Freitas, especialista em composição química da atmosfera, disse ao POPULAR, nesta quarta-feira (20), que embora os efeitos da erupção do vulcão Hunga-Tonga-Hunga-Ha’apai, que no início de 2022 abalou o arquipélago de Tonga, no Pacífico Sul, tenham refletido no Brasil no fim de janeiro, o pouco vapor d’água na atmosfera associado aos aerossóis das queimadas estão mais vinculados às cores vermelhas do crepúsculo.“Quando olhamos nas imagens de satélites, percebemos que, sim, na estratosfera tem uma camada tênue de aerossóis vulcânicos sobre o Brasil, mas muito mais provavelmente o que está acontecendo são os aerossóis de queimadas que começaram a aparecer. Na medida que a estação seca for se prolongando e as queimadas aumentarem, vai ficando cada vez mais bonito. Este é o lado lúdico da destruição da vegetação”, afirma a pesquisadora.Poluição vulcânicaKarla Freitas ressalta que a poluição vulcânica fica muito alta, na troposfera superior e estratosfera, a uma altura média de 26 quilômetros acima da superfície. “Embora seja uma região que a gente não respira, há impacto das cinzas vulcânicas na radiação solar. Mas essas emissões estão muito espalhadas, portanto sem grandes efeitos sobre a América do Sul. Já as queimadas, sim, espalham radiação, mesmo em pouca quantidade.”Nos primeiros 15 dias de janeiro houve uma série de erupções do vulcão Hunga-Tonga-Hunga-Ha’apai, em Tonga, um país polinésio com mais de 170 ilhas, a mais de 2 mil km da Nova Zelândia e a 12 mil km de distância do Brasil. A erupção de sábado foi provavelmente a maior já registrada em qualquer lugar do Planeta em mais de 30 anos, segundo os especialistas.A gigantesca nuvem produzida por ele foi transportada por correntes de ar, chegando a outros continentes. Partículas de dióxido de enxofre (SO2) são um dos elementos que compõem essa pluma vulcânica. O enxofre é transformado em sulfato que interage com a luz solar, proporcionando as cores avermelhadas, alaranjadas e púrpuras no nascer e no pôr do sol.Esses efeitos foram registrados no fim de janeiro em diversas regiões do Brasil, em especial as litorâneas. Por isso, mesmo após três meses da explosão vulcânica, as fortes cores dos crepúsculos ainda no início do outono levaram algumas pessoas a associá-las ao vulcão de Tonga.“Quando observamos uma imagem de satélite, realmente dá para perceber esta pluma de SO2, a principal assinatura de emissão vulcânica, sobre a América do Sul, em particular sobre Goiás, mas é um sinal fraco. Os aerossóis das queimadas, ou a poeira no sol, têm a mesma capacidade de produzir esses tons avermelhados. O que pode estar ocorrendo é uma junção de fatores”, segundo a especialista do Inpe.A física detalha que quando ocorre o crepúsculo, a transmissão da radiação solar ocorre horizontalmente. “Ela percorre um longo caminho dentro da atmosfera, refletindo de forma eficiente no espaço as luzes frias, o azul ou a ultravioleta. O que chega aos nossos olhos é o que os aerossóis não conseguem jogar fora, ou seja, as cores quentes.”EstiagemMapa acumulado de precipitação produzido pelo Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas do Estado de Goiás (Cimehgo), da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), mostra que não haverá chuva em Goiás nos próximos 15 dias. O Inpe também prevê ausência de índices pluviométricos para o período. A umidade relativa do ar está baixa, oscilando entre 35% e 70% entre a noite e o dia.Esses são sinais típicos do período de estiagem no Centro-Oeste brasileiro, que ocorre de abril a setembro. Ele pode trazer bons espetáculos no início e nos finais dos dias, mas também acarretam preocupação aos produtores rurais pela ausência de chuvas, e à saúde pública, em razão da emissão de fumaça provocada pelas queimadas.Em 2021, o sensor Modis, a bordo do satélite Terra, usado como referência pelo Inpe, detectou 82.378 focos de incêndio no Brasil, 4.558 deles em Goiás. De 1º a 20 de abril do ano passado, em território goiano foram registrados 64 focos, em 2022, no mesmo espaço de tempo, 207.Leia também:Meteoro visto em Goiás estava a cerca de 90 km de altitudeQual o tamanho do asteroide que rasgou o céu de Goiás?