Os brasileiros estão financiando menos imóveis este ano. Dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) mostram que, de janeiro a maio deste ano, foram financiados 293.057 imóveis com recursos das cadernetas do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) no País, uma queda de 11,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Entre os motivos para a redução, estão a alta dos juros, a pressão inflacionária sobre a renda e o desemprego ainda elevado.Nos primeiros cinco meses de 2022, o montante em imóveis financiados somou R$ 69,65 bilhões, uma queda de 10% em relação ao mesmo período do ano passado, quando os financiamentos somaram R$ 77,38 bilhões. Enquanto inflação e desemprego elevados reduzem a capacidade da população em constituir reservas financeiras, a Selic em alta teria voltado a atrair investidores para o mercado financeiro.Os maiores bancos do País já admitiram que o crédito imobiliário desacelerou. Um dos motivos é que muita gente que comprou um imóvel na planta em anos anteriores não está gostando do impacto dos juros maiores sobre o valor das parcelas, quando o empreendimento fica pronto e é hora de fazer o financiamento no banco. Com taxas mais altas, os bancos também exigem uma comprovação de renda mais rigorosa para aprovar financiamentos e mais pessoas têm o crédito recusado.Leia também:- Goiás registra dois estelionatos virtuais por semana- Com alta nas vendas, cresce desistência da compra de imóveis na planta em GoiásPara o presidente da Associação Brasileira de Mutuários da Habitação em Goiás (ABMH-GO), Wilson Rascovit, o maior problema é que estes possíveis problemas futuros na hora do financiamento não são repassados para os compradores de imóveis na planta na hora da venda. “A pessoa compra um imóvel na planta, que só vai ser entregue daqui a dois ou três anos, pensando apenas na taxa praticada no momento, mas que pode subir no futuro”, alerta.DistratosQuem não consegue financiar o imóvel que comprou na planta, tenta desfazer a compra. O índices de distratos ou rompimentos de contrato de compra e venda de imóveis subiu de 10% em 2021 para 15% este ano. Mas Wilson Rascovit lembra que esta decisão custa caro para o consumidor hoje por causa da Lei dos Distratos, de 2018. “Antes, em caso de devolução, a incorporadora só podia reter 10% do valor pago. Agora, este índice pode chegar aos 50% no caso de ‘patrimônio de afetação’, que é quando todo valor pago pelos compradores é destinado exclusivamente à construção do empreendimento.O presidente da ABMH diz que, hoje, muita gente têm tido uma surpresa desagradável na hora de financiar, quando percebe o tamanho do impacto das novas taxas de juros sobre o saldo dos contratos. “Mas, com a Lei dos Distratos, aprovada após um lobby ferrenho das construtoras, as empresas não estão mais preocupadas com estes rompimento de contrato, pois ficaram muito protegidas da perda financeira”, afirma.Para Rascovit, hoje não há mais igualdade entre as partes nesta relação de consumo, pois a empresa pode atrasar até 180 dias para entregar um empreendimento, mas o comprador não pode atrasar três prestações sob o risco de perder o imóvel. A procura pelos serviços da ABMH voltou a crescer e ele orienta os futuros compradores a consultarem uma cartilha com orientações no site do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa do Consumidor (Ibedec) ou procurem um advogado especialista, antes de fecharem o negócio.TransparênciaApesar dos juros mais altos, o mercado voltou a reagir em maio. De acordo com a Abecip, os financiamentos imobiliários com recursos do SBPE somaram R$ 17 bilhões, melhor resultado do ano e segundo melhor para um mês de maio na série histórica. Para o presidente da Associação das Empresas do Mercado Imobiliário de Goiás (Ademi-GO), Fernando Coe Razuk, os juros dos financiamentos imobiliários continuam atraentes porque o impacto da Selic não foi tão significativo. Ele lembra que, enquanto a taxa básica aumentou 11 pontos porcentuais, os juros médios dos financiamentos passaram de 7% para 9%. Além disso, a alta no porcentual de distratos seria consequência do aumento das vendas de imóveis.Somente no ano passado, o setor registrou o melhor volume de vendas dos últimos 10 anos. O problema é que isso ocorreu num cenário atípico de pandemia, quando muitas famílias perderam renda. “Num boom de mercado, muita gente comprou na empolgação, sem observar sua capacidade de crédito na hora do financiamento”, ressalta Razuk. Porém, isso não chega a ser um problema porque o mercado está regulado. “Tivemos uma reunião online com a Câmara Brasileira da Indústria da Construção, esta semana, e o crédito imobiliário já voltou a crescer”, diz.O presidente da Ademi-GO lembra que a Lei do Distrato é aplicável somente quando há o máximo de transparência por parte da incorporadora. “Como o contrato é longo, a lei exige dois documentos: o quadro resumo e as normas contratuais e determina tudo que deve estar de forma destacada no contrato”, destaca. Um dos pontos é que, em caso de distrato, a empresa pode abater o valor pago para comissão do corretor e devolver 50% para o cliente.Por isso, Fernando Razuk ressalta que o consumidor já compra sabendo desta cláusula. Segundo ele, antes da lei, o Judiciário tendia a proteger sempre o consumidor. Toda ação que ia para a Justiça mandavam descontar 10% e devolver o restante com juros. “Num empreendimento com 200 apartamentos, se 100 clientes devolvessem, a construtora praticamente quebrava, o que levou muitas à recuperação judicial ou falência. A lei foi criada para proteger a coletividade”, avalia.O superintendente executivo da Ademi-GO, Felipe Melazzo, também acredita que o aumento dos distratos foi consequência do boom do mercado nos anos anteriores e a alta da Selic não afetou o financiamento imobiliário na mesma proporção. “Por serem recursos do FGTS e poupança, eles têm regramento especial, o que impacta pouco os financiamentos, que ainda são um bom negócio, porque a pessoa já paga entre 40% e 50% durante as obras e financia o restante com taxas muito atrativas, além de ganhar na valorização”, ressalta.-Imagem (1.2484288)