Se ter uma loja no Centro de Goiânia antes era garantia de boas vendas para todos os segmentos, hoje a situação é bem diferente. Atualmente, pelo menos 112 imóveis comerciais com fachada para a rua encontram-se fechados, sem contabilizar as salas instaladas nas galerias. O principal motivo foi a queda na movimentação de consumidores e das vendas, situação que teria sido agravada pelas obras do BRT. Para comerciantes e proprietários de imóveis no Centro, a saída está num projeto consistente de revitalização, além da conclusão do corredor.Somente a rede Savan Calçados fechou 5 lojas que tinha na avenida Anhanguera e Rua 4. o que resultou na perda de cerca de 100 empregos. Para o proprietário, Imad Esper, o consumidor tem se afastado cada vez mais do Centro por causa de problemas com limpeza, falta de segurança e do tumulto causado pelas obras do BRT. “Mesmo com este cenário de abandono, que derrubou as vendas, muitos comerciantes tiveram o IPTU dobrado este ano, o que inviabilizou ainda mais a permanência na região”, destaca.Proprietário de um estacionamento na Avenida Goiás e de imóveis no Centro, o empresário Luiz Francisco Dezzen conta que ficou de julho de 2019 a janeiro de 2020 com a porta de seu estabelecimento fechada pelas obras do BRT. Logo em seguida, veio a pandemia e a dificuldade aumentou. “Se o imóvel não fosse próprio, não teríamos aguentado”, prevê. Com as obras do BRT, os carros hoje estacionam no canteiro central da avenida Goiás e o movimento no estacionamento caiu 70%.Apesar disso, ele lembra que a taxa de funcionamento, que era proporcional ao número de funcionários e custava R$ 85 no ano passado, este ano foi proporcional ao tamanho das instalações e subiu para R$ 1.350. Seu IPTU, que era R$ 6 mil, foi para R$ 10 mil. Luiz tem um imóvel comercial e acredita que se ele for desocupado, terá muito trabalho para voltar a alugá-lo. “Hoje, as pessoas evitam o Centro por causa das obras e a grande quantidade de lojas fechadas prejudicam também quem permanece aberto”, afirma.O resultado é uma desvalorização dos aluguéis. Hoje, é possível alugar um ponto comercial com 170 metros quadrados na Rua 4 por R$ 2,7 mil. Outro com 150 metros quadrados na esquina das Avenidas Anhanguera e Paranaíba está anunciado por R$ 3,4 mil.Veja também- Lojistas se reúnem com vereadores para discutir Código Tributário de Goiânia- Lojistas já cancelam pedidos de máscaras em Goiânia- Três a cada dez famílias têm contas atrasadas, maior índice em 12 anosPara o atendente de locação da Espaço Centro Imóveis, Adilson Marques, os empresários que atuavam no Centro têm migrado para outras regiões da capital. Com isso, espaços antes muito disputados e valorizados, como os localizados nas Ruas 3 e 4, estão tendo os aluguéis reduzidos. Ele conta que um imóvel que antes era alugado por R$ 4,5 mil já está fechado há mais de um ano, mesmo com aluguel reduzido para R$ 3 mil. “O preço foi caindo e, mesmo assim, não aluga”, ressalta.Ele lembra que há alguns anos era até difícil encontrar imóveis para alugar no Centro e em alguns existia até a cobrança das chamadas ‘luvas’. Hoje, já é possível alugar até com um tempo de carência. Além disso, muitos são imóveis antigos que ainda demandam reformas, que requerem cuidados especiais por se tratarem de fachadas art déco que devem ser preservadas. “Com isso, alguns imóveis chegam a ficar anos desocupados”.O presidente da Associação Comercial e Industrial do Centro de Goiânia (Acic), o advogado Uilson Manzan, estima que a região central tenha hoje, pelo menos, 112 imóveis comerciais fechados, inclusive pontos localizados em esquinas, antes muito disputados, sem contar as salas comerciais, boa parte há mais de seis meses. Para ele, o motivo seria a falta de uma política pública para reordenamento na região, que há anos convive com um grande número de moradores de rua, equipamentos públicos depredados, atuação de marginais e excesso de ambulantes. Nos últimos anos, a situação foi agravada pelas obras do BRT, que deixou calçadas depredadas e tubulações e fios expostos. “O resultado disso é que o público foi migrando para shoppings e outros pontos comerciais da cidade. Os imóveis foram ficando mais difíceis de alugar e se desvalorizando”, alerta.RevitalizaçãoPara Uilson Manzan, o Centro de Goiânia foi perdendo sua referência comercial e cultural. Há anos fala-se na necessidade de revitalização, mas projetos nunca saíram do papel, a situação só piora e empresas fecham. Hoje, as imobiliárias que trabalham com locações de imóveis no Centro orientam os clientes a serem mais maleáveis na negociação dos contratos para evitar a desocupação, por conta da dificuldade para relocação. Para o vice-presidente do SecoviGoiás, Benjamim Ragonezi, a pandemia veio apenas agravar o problema da desocupação do Centro, que não recebeu as intervenções necessárias do poder público e foi deixando de ser atrativo para vários segmentos comerciais. Muitos imóveis também estão nas mãos de herdeiros que os deixam abandonados. Ele acredita que uma saída está na instalação de corredores de lazer para atrair novamente as famílias, com bons restaurantes e atrações culturais, além de incentivos fiscais e tributários para atrair as empresas. “Se não houver a motivação certa, que gere atratividade, a tendência é termos, cada vez mais, um Centro fantasma. Tem muito morador de Goiânia que ainda não conhece lá”, alerta. Outras capitais que investiram em projetos de revitalização de suas regiões centrais teriam tido bons resultados. O empresário Milton Bruno de Faria, que depois de 50 anos negociou sua loja de artigos esportivos no Centro por conta das dificuldades encontradas na região, acredita que a saída pode estar na instalação de grandes calçadões na avenida Anhanguera e ruas perpendiculares, onde haveriam atrações de lazer. “Nos fins de semana, Goiânia tem mais de 100 mil pessoas que não têm para onde ir se divertir”, lembra.Prefeitura diz que realiza ações para a revitalizaçãoO Código Tributário de Goiânia incluiu medidas para incentivar a compra de imóveis na região e estimular empresas, como isenção de ISTI para primeira aquisição de imóvel residencial em novos prédios e primeira aquisição de vaga em edifícios garagem e garagens subterrâneas; redução de 30% no imposto para a primeira aquisição de imóvel empresarial nos arranjos produtivos; redução de 70% no ITU por cinco anos para estacionamentos; e isenção total para imóveis tombados.Para o ex-presidente do Sindilojas Goiás, Eduardo Gomes, os benefícios não são suficientes para, por exemplo, cobrir o alto custo do projeto de padronização das fachadas. Entre as medidas que poderiam ajudar, ele sugere a ampliação do horário de funcionamento para o comércio, transformando o Centro num grande shopping a céu aberto, além da criação de opções de lazer para atrair famílias e a visitação turística, como polos gastronômicos. “Tivemos apoio da Assembleia Legislativa para a revitalização e muitas conquistas, mas precisamos de uma mobilização da sociedade para cobrar as medidas necessárias”, alerta Uilson Manzan.A Secretaria Municipal de Planejamento Urbano e Habitação (Seplanh) informou que a Prefeitura iniciou, em 2017, nos estudos do Plano Diretor, o planejamento e desenvolvimento de projetos para a revitalização das regiões Central e Campinas: o Projeto ReViva Goiânia visa revitalizar a região conhecida como Núcleo Pioneiro da Capital, tombado pelo Iphan, no trecho entre a Praça do Botafogo, Setor Leste Vila Nova, até a da Praça Coronel Joaquim Lúcio, em Campinas. “O Centro tem passado por intervenções urbanísticas, como a restauração da antiga Estação Ferroviária, Rua do Lazer e do Coreto e Torre do Relógio da Praça Cívica”, informa.Segundo a Secretaria Municipal de Infraestrutura, a obra do BRT está concentrada na Praça Cívica, onde 85% da pavimentação está concluída. Restam as obras complementares (sarjetas e meios-fios) com previsão de conclusão o mês de abril. As obras nas calçadas da Avenida Goiás já estão com programação para terminar em julho desse ano. Já as estações de embarque e desembarque do BRT na Praça Cívica e Avenida Goiás devem ser concluídas em setembro. “Com a conclusão do BRT, que deve ser a obra mais importante de mobilidade de Goiânia, o cidadão deve voltar a circular na região central com mais tranquilidade”, diz a Secretaria.