A Enel Distribuição Goiás registrou prejuízo de R$ 100 milhões no ano passado. É o primeiro resultado negativo da empresa desde que o grupo Enel assumiu a Celg Distribuição (Celg D), em 2017. Balanço financeiro divulgado na quarta-feira (26) mostra que a reversão da trajetória de lucro foi causada especialmente por mudança realizada pelo governo de Ronaldo Caiado (DEM) na legislação que trata do Fundo de Aporte (Funac), que fazia parte dos benefícios oferecidos pelo Estado no contexto de venda da antiga estatal.O impacto no lucro líquido, após impostos, foi de R$ 288 milhões por conta do Funac em 2019. Se não fosse isso, a Enel teria lucrado R$ 188 milhões. Ainda assim, um valor abaixo do apresentado em 2018, quando alcançou R$ 1,552 bilhão – sendo que 81,57% desse montante se referia a um fato extraordinário, créditos fiscais que a empresa tinha com a Receita Federal acumulados também da época em que a companhia era estatal. Já em 2017, foram R$ 110,328 milhões positivos.Além do impacto no lucro, a Enel reconheceu no balanço financeiro que a alteração no Funac corresponde a uma deterioração de US$ 110.774 milhões, cerca de R$ 436,449 milhões, que correspondem ao montante a receber gerado entre abril de 2012 e janeiro de 2015. Há um ano, Caiado sancionou a lei número 20.416/2019 que alterou a data considerada para ressarcir a companhia de eventuais perdas com passivos contingentes da época da Celg. HerançaAntes de ser privatizada, a distribuidora foi federalizada. O controle ficou com a Eletrobras efetivamente em 2015. Mas o governo Caiado considera que desde 24 de abril de 2012, quando teve início o processo de federalização, as decisões não eram mais tomadas pelo governo estadual, mesmo que esse fosse o acionista majoritário. Por isso, a responsabilidade não deveria ser cobrada do Estado, no entendimento do governo goiano. Além disso, como parte do processo de privatização, havia também a Lei 19.473/2016 que definiu que os créditos do Funac tinham a possibilidade de ser compensados por meio do ICMS em valor equivalente aos passivos de contingências administrativas e judiciais anteriores a janeiro de 2015. O que foi revogado pela lei 20.468/2019.A Enel ajuizou ações questionando a revogação das leis relativas ao Funac e à concessão do crédito outorgado de ICMS. A multinacional italiana teve o pedido de liminar indeferido, recorreu e obteve liminar favorável. Mas o Estado conseguiu reverter e a decisão que favorecia a empresa está suspensa. Não houve o julgamento de mérito.Como o tema está em discussão na Justiça, a distribuidora informou por nota à reportagem que optou por refletir o impacto negativo da restrição do período de cobertura do fundo no balanço financeiro. Em apresentação a investidores, o grupo afirma que toma todas as medidas para manter os “direitos adquiridos no momento da compra” garantidos pelo próprio contrato assinado em 14 de fevereiro de 2017. Considera as ações do Estado “claramente ilegais”. PressãoOutras pressões realizadas pelo governador Ronaldo Caiado e pelo Legislativo influenciaram também o resultado negativo em 2019. A cobrança por melhorias na qualidade de energia, especialmente no interior goiano, levou à assinatura de plano emergencial e de termo de acordo, que exigiu que a empresa acelerasse investimentos. Questionada sobre o impacto desses compromissos firmados no ano passado com a União e com o Estado, a Enel Distribuição Goiás respondeu à reportagem que intensificou “ações de manutenção preventiva e o atendimento de emergência para recuperar a rede após às fortes chuvas – com reforço de equipes de outros Estados e contratação de helicópteros – o que impactou o resultado”.Somado a isso, reforçou que desde que assumiu a gestão da empresa trabalha “fortemente para melhorar de forma contínua a qualidade do fornecimento de energia”. A receita líquida obtida com a operação em Goiás, por outro lado, aumentou 11% em comparação com o resultado alcançado em 2018. Atingiu R$ 6,023 bilhões no ano passado. O que é explicado principalmente por maior venda de energia, tanto pela maior distribuição (3,7%) gerada pelo aumento de mercado atendido – ampliado inclusive com a aceleração dos investimentos – quanto pelo aumento da tarifa de energia.O número de consumidores cresceu 2,9%, chegou a 3,11 milhões, o que significou 87 mil novos clientes em comparação ao ano anterior. A empresa também atingiu 14.259 gigawatts-hora (GWh) de energia distribuída. Já a revisão tarifária que ocorreu em outubro de 2018 teve efeito médio percebido pelos consumidores de 18,54%, sendo 26,52% para consumidores de alta tensão e de 15,31% para aqueles conectados em baixa tensão. Mas ocorreu reajuste em outubro do ano passado com redução média para os consumidores de 3,90% na tarifa, sendo 2,89% para alta tensão e 4,32% para baixa tensão. Por sua vez, as despesas operacionais, que excluem custo de construção e depreciação e amortização, subiram 43,3%, chegaram a R$ 1,174 bilhão, ante aos R$ 819 milhões atingidos em 2018. Outro ponto é que houve acréscimo de 0,88% de perda de energia, que chegou a 12,3% em dezembro.