Os efeitos da saída de um dos principais aplicativos de entregas de comida do mercado, o Uber Eats, devem afetar entregadores, restaurantes e consumidores. Os entregadores alertam que as demais plataformas do mercado não conseguirão absorver todos os prestadores de serviço do Uber e que haverá um aumento do desemprego. Já os restaurantes e consumidores podem arcar com taxas de entrega mais caras, diante de uma maior concentração do mercado num pequeno número de aplicativos.O mercado de apps de entrega de comida no Brasil, que movimentou cerca de R$ 60 bilhões em 2021, é dominado basicamente por iFood, Rappi e Uber Eats, que tem cerca de 13% do mercado. Com as operações de entrega de comida do Uber Eats se encerrando no próximo dia 8 de março, a expectativa é que o iFood, que já tem mais de 80% do mercado, domine ainda mais o segmento.Para um dos representantes dos entregadores de aplicativos em Goiás, Miguel Veloso, a saída do Uber Eats foi uma grande surpresa para todos, pois não teve nenhum aviso prévio, e deve deixar muitos pais de família desempregados. “Muitos vivem 100% disso hoje e trabalham apenas em um aplicativo. O anúncio deixou a categoria arrasada”, destaca. Ele lembra que a saída da empresa do mercado foi anunciada logo após a Lei 14.297, que ampliou a proteção dos entregadores durante a pandemia, ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro.Hoje são cerca de 6 mil entregadores em todo Estado, sendo 3,5 mil em Goiânia. Veloso acredita que parte deste pessoal migrará para outros aplicativos, como Rappi, iFood e 99Food, que entrou mais recentemente no mercado. “Mas o iFood, por exemplo, tem um controle de contingente e nem todos conseguirão entrar”, ressalta Veloso.O presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativo no Estado (Amago), Leidson Alves, diz que o iFood já havia dominado o mercado por conta dos baixos valores pagos pelo Uber, que remunera muito mal os entregadores e motoristas em geral, que já cogitavam a possibilidade do aplicativo sair do mercado. Agora, ele prevê que esta concentração fique ainda maior. “Mesmo assim, o iFood não conseguirá receber todos que estavam no Uber. Vai ter aumento do desemprego mesmo”, acredita Leidson.RestaurantesO mercado de delivery de comida disparou após a pandemia e garantiu a sobrevivência de muitos restaurantes que foram obrigados a fechar as portas. Mas o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes de Goiás (Abrasel-GO), Danilo Ramos, também ressalta a alta concentração em algumas praças pelo iFood. Por isso, com uma empresa a menos no mercado, os restaurantes perdem mais poder de negociação com esta e outras plataformas.A plataforma Rappi e a Abrasel já recorreram ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra possíveis “práticas anticompetitivas” do iFood, como contratos de exclusividade. Mas o maior problema são as taxas. “Quanto menor a concorrência, maior será a facilidade para pressionar os restaurantes por taxas maiores”, alerta. O valor médio cobrado atualmente está em 27% sobre o valor do pedido. “Isso é muito ruim, num momento em que os estabelecimentos já estão muito pressionados pela inflação de custos, com os altos reajustes nos preços de insumos como alimentos, gás de cozinha e energia elétrica”, lembra Danilo.Para tentar reduzir a pressão da concentração do mercado de aplicativos de entrega, a Abrasel investe no projeto Open Delivery, uma grande infraestrutura de informação e comunicação entre todos os marketplaces dos restaurantes. “Pelo Open Delivery, os cardápios das empresas poderão ser oferecidos em várias plataformas, o que aumentará a concorrência entre elas”, destaca o presidente da Abrasel-GO.Com mais concorrência, a tendência é que os restaurantes possam negociar taxas e promoções diferentes. Danilo lembra que esta concorrência também deve beneficiar o consumidor, pois as plataformas também devem fazer ações para abocanhar mais clientes. “Muitas empresas de outros segmentos, como o varejo, já têm projetos para entrar no mercado de food service no Brasil”, completa.Novos serviçosEm nota, o Uber informou que vai alterar sua estratégia de Delivery no Brasil, desativando o serviço de intermediação de entrega de comida de restaurantes. A partir de agora, a empresa vai trabalhar em duas frentes: com a Cornershop by Uber, para serviços de intermediação de entrega de compras de supermercados, atacadistas e lojas especializadas; e de entrega de pacotes pelo Uber Flash. A Uber também expandirá o Uber Direct, que permite que lojas façam entregas no mesmo dia para seus clientes, modalidade que cresceu cerca de 15 vezes em número de viagens nos últimos 12 meses, impulsionada pela demanda de grandes marcas. Mas os entregadores alegam que ainda não têm informações suficientes para decidirem se migrarão para outros serviços de entrega, que ainda não têm a mesma demanda que o delivery de comida.