Desde 2005, a B3 seleciona empresas reconhecidas em boas práticas de sustentabilidade para integrarem a carteira de investimentos do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE). “Hoje há fundos que só investem em empresas com selo ESG, que não querem colocar dinheiro em qualquer empresa”, explica o planejador financeiro Maurício Vono. De acordo com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Ambima), nos últimos cinco anos, houve um crescimento de cerca de 50% no número de fundos que se apresentam como sustentáveis e de quase 300% em seus ativos sob gestão.De olho nesse montante, as instituições estão preocupadas em manter relacionamento com quem adota posturas de boas práticas e os bancos também seguem essa mesma tendência na hora de liberar financiamentos. “Uma grande instituição financeira que apoia uma empresa fraudulenta ou que não tem boas práticas pode se queimar no mercado de forma indireta. Por isso, as empresas estão cada vez mais preocupadas em fazer negócios com empresas que também são sustentáveis”, alerta o especialistaA MRV, construtora do grupo MRV&CO, é a única do segmento integrante do ISE e está na B3 desde 2017, o que ajuda a chamar a atenção dos investidores estrangeiros, que geralmente buscam carteiras de referência, muitas vezes da sustentabilidade. A companhia também foi selecionada pelo 7º ano consecutivo para integrar a carteira do Índice Carbono Eficiente da B3 (ICO2 B3) de 2022, indicador que atesta o comprometimento com o fomento de uma economia de baixo carbono. Essa lista é composta por companhias que elaboraram seu Inventário de Gases de Efeito Estufa (GEE).A construtora reduziu 80 mil toneladas de emissões de GEE em 2020. O CEO da MRV, Eduardo Fischer diz que a empresa buscou evoluir em prol do combate à mudança do clima e da promoção de ações de sustentabilidade, com foco na economia de baixo carbono. “O fato de nos mantermos na carteira chancela o que temos feito e permite que os investidores nos enxerguem como uma companhia que realmente se importa com o tema”, reforça.Para o gestor executivo de Sustentabilidade da MRV, José Luiz Esteves Fonseca, entrar na carteira da B3 foi a confirmação do trabalho que vinha sendo feito desde 2007, quando já se procurava fazer um investimento privado em melhorias no entorno das obras. “O ESG chegou em 2010, quando começamos a olhar a questão dos resíduos nas obras e tivemos que entender como poderíamos fazer o reuso desses materiais. Em 2015, criamos o ano da sustentabilidade na MRV e o Instituto MRV, responsável pelo trabalho social da empresa com crianças, adolescentes e jovens nas áreas da educação, emprego e esporte”, explica.Tudo isso para conscientizar os colaboradores para as práticas. “Paralelo a isso, trabalhamos em busca da carteira”, lembra. Hoje, segundo ele, a preocupação com sustentabilidade começa na compra do terreno, por conta da possibilidade de impacto ambiental na região, e vai até a entrega dos imóveis. A empresa, que tem certificação ambiental ISO 14.001, realiza vários estudos sobre o impacto do futuro empreendimento no meio ambiente e no espaço urbano.O projeto inicial inclui o chamado ‘balanço das massas’, um trabalho que reduz ao mínino possível a retirada de terras do local. O projeto estrutural também já define as quantidades de produtos que serão utilizados para otimizar a produção e reduzir os descartes. “Anos atrás descartávamos duas caçambas por apartamento e, hoje, é apenas 0,68 caçamba por unidade, que redução gigantesca”, destaca o gestor.Para o gestor de Sustentabilidade da MRV, as empresas têm responsabilidade em mudar a realidade social e ambiental em sua volta. “Sabemos que o modelo de construção civil é impactante na vizinhança, gera incômodo, poeira, ruído e até problema no trânsito. E buscamos mudar isso”, diz. Ele dá o exemplo de São Gonçalo (RJ), onde a empresa iniciou o programa Vizinhos do Bem, em uma região dominada por facções criminosas de todo tipo. “Construímos um conjunto habitacional e colocamos em prática algumas ações para ajudar aquela comunidade”, conta José Luiz. No local, a empresa também fez um trabalho de qualificação de pintor em parceria com a Basf, dona da Suvinil, com dez turmas, sendo duas só com mulheres.Fundos focam empresas com práticas de ESG As mudanças nas práticas de governança têm impactado todo o setor imobiliário. Estima-se que cerca de US$ 30 trilhões em ativos estão sob gestão de fundos que aplicam recursos em negócios e empresas com práticas sustentáveis. No Brasil, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Ambima), existem 25.488 fundos de investimento em geral em operação, com patrimônio líquido total perto de R$ 7 trilhões. Desse total, apenas R$ 1,07 bilhão é referente a fundos enquadrados na categoria sustentabilidade e governança, segundo dados de fevereiro de 2021.Para o planejador financeiro Maurício Vono, assim como o comércio ou instituições financeiras não querem fazer negócio com pessoas com restrições, com nome sujo na praça, as empresas que querem acessar grandes linhas de financiamento precisam ter o selo de uma empresa ESG, como um cadastro positivo. Ele ressalta que as empresas que seguem as práticas ESG correm menos riscos regulatórios por justamente já seguirem leis e regulamentos ambientais. Daí, a preferência dos fundos em investir nessas empresas.Para Lívia Lemos, diretora da TG Core, uma das empresas Trinus Co., há uma virada de chave na cultura de investimento e as empresas organizam suas estruturas com a incorporação de critérios socioambientais, não só em seu modelo gestão, mas também na tomada de decisão de investimentos. “O propósito de transformação da Trinus é democratizar o acesso a moradia digna e de qualidade ao comprador de imóveis. O principal fundo de investimento é o TG Ativo Real FII (TGAR11), fundo híbrido de desenvolvimento com foco de atuação em regiões pouco investidas pelo mercado convencional, como novas fronteiras de expansão agrícola do País”, explica.Segundo Lívia, a atuação da Trinus na cadeia do mercado imobiliário resulta em desenvolvimento socioeconômico do mercado regional, do parceiro empreendedor ao comprador da unidade imobiliária. “Todo o propósito se consolida através do APP Trinus, que garante inclusão financeira, democratização do mercado imobiliário e acesso a linhas de crédito com juros mais baixos que os de mercado. Nesse sentido, a pauta ESG encontra-se diretamente alinhada ao nosso propósito”, diz.Para a empresa, quanto mais impacto na cadeia de valor, mais transformação para as comunidades. A Trinus, através do Fundo de Investimento TGAR11, atua em regiões não investidas pelo mercado convencional e apoia empreendedores regionais com tecnologia, boas práticas de governança e gestão, para que eles se tornem aptos a acessar capital do mercado financeiro. “Isso gera desenvolvimento, emprego e renda, infraestrutura e habitação às regiões não investidas pelo mercado convencional”, diz.Se antes o olhar do mercado mundial estava voltado apenas para o retorno financeiro, é perceptível a mudança para as consequências e impactos em todo o ecossistema. Nesse contexto, o ESG ganha força como um movimento essencial e indispensável às companhias. A mudança de cultura e dos valores corporativos no sentido de integrar os princípios e critérios ESG tornaram-se vitais. Desde a criação do ISE (Índice de Sustentabilidade Empresarial) na B3, a carteira ISE3 apresentou rentabilidade positiva de 296%, contra 223% da carteira formada pelas ações que compõem o índice Ibovespa.