Quando não utilizado com inteligência, o crédito pode se tornar um grande vilão do endividamento. O alerta é do economista e professor da PUC Goiás, Edilson Aguais. Ele lembra que, após o início da pandemia, o governo reduziu a taxa do compulsório e do redesconto pelo Banco Central, para aumentar a liquidez e os recursos disponíveis para empréstimo no mercado. “Mas isso acabou não surtindo o efeito esperado pelo governo federal porque os bancos ficaram mais receosos para emprestar num momento de desaceleração da economia”, avalia.As próximas medidas foram elevar os limites dos empréstimos consignados e ainda criar o consignado dentro do Auxílio Brasil. “Antes, a pessoa que não tinha renda pelo menos não se endividava. Agora, há um aumento natural do endividamento, através desta injeção de recursos e crédito”, destaca o economista.Se, por um lado, o aumento da taxa Selic desestimula a tomada de empréstimos e o consumo, por outro ainda há muita oferta de crédito. “Um bom exemplo são as fintechs, que oferecem serviços financeiros e hoje concorrem muito com os bancos tradicionais. Elas elevaram muito a oferta de cartões de crédito no mercado”, alerta Edilson.Por isso, ele adverte que o aumento da inadimplência também é resultado desta grande oferta de crédito, num país onde as pessoas sempre acreditam que no dia de amanhã as coisas vão melhorar e elas terão mais condições para pagar uma dívida contraída hoje. “Muitas pessoas nem avaliam as condições dos empréstimos e sempre deixam a solução para o futuro. É um ciclo que não se consegue romper no Brasil”, ressalta.O professor lembra que, em agosto de 2021, entrou em vigor a Lei 14.181, conhecida como a Lei do Superendividamento, que prevê que as instituições financeiras precisam promover ações de conscientização junto a seus clientes, orientando para os riscos do endividamento elevado. “Mas isso não tem sido feito e muitas instituições até anunciam a liberação de empréstimos sem consulta ao SPC e Serasa ou qualquer critério importante”, completa.PreocupaçãoA Lei 14.181 prevê que a pessoa superendividada pode solicitar a renegociação em bloco das dívidas no tribunal de Justiça do seu estado, onde será realizada uma conciliação com todos os credores para a elaboração de um plano de pagamentos que caiba no seu orçamento. Essa conciliação também pode ser realizada nos órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, como Procon, Defensoria Pública e Ministério Público. Uma pesquisa realizada pela Semrush, plataforma de gerenciamento de visibilidade online, mostrou que cada vez mais brasileiros estão em busca de organizar sua vida financeira. Uma prova disso, segundo a Serasa, tem sido a grande procura por seus feirões de renegociação de dívidas.De acordo com o levantamento da Semrush, mais de 1 milhão de pessoas buscaram pelo termo “consultar CPF”, ainda em 2021, o que demonstra o interesse dos consumidores em entender melhor sua situação financeira. Outras expressões em destaque foram “inadimplência”, com um aumento de 49%, totalizando 28 mil buscas por mês, e “negociação de dívidas”, que teve um crescimento de 86%. As expressões “quitar dívidas”, que teve um aumento de 52%, e “recuperação de crédito”, com um crescimento de 60% ao mês, também chamam atenção.Para Pedro Lima, economista e co-CEO da fintech Meu Acerto, plataforma de negociação digital de dívidas, esse estudo demonstra uma nova concepção da sociedade em relação à vida financeira. “Tivemos recordes do número de inadimplentes no Brasil. E, quando olhamos os números da pesquisa, podemos ver que cresceu o interesse das pessoas por temas relacionados às finanças. Elas estão buscando informações para não se endividarem ou para saírem da situação de endividamento, que é temporária”, diz o executivo.