A suspensão das viagens de cruzeiros pelo litoral brasileiro até o próximo dia 21 de janeiro, por determinação da Associação Brasileira de Navios de Cruzeiro (CLIA), trouxe preocupação para as agências de viagem, que temem impactos sobre as vendas de pacotes. Os cruzeiros que estavam agendados para os próximos dias já estão sendo remarcados pelas agências goianas e, apesar das férias frustradas, elas garantem que os passageiros estão concordando bem com a mudança, diante de tantos casos de Covid-19 sendo detectados nos navios brasileiros.A decisão ocorreu um dia depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou a “urgência” em acabar com a temporada. Cinco embarcações que operam no Brasil registraram 798 novos casos de Covid-19 em 9 dias, um crescimento de 25 vezes nas infecções confirmadas nos primeiros 55 dias da temporada de navios de cruzeiro, segundo a Anvisa. Se a pessoa não quiser remarcar o cruzeiro, ela terá direito ao reembolso integral do valor pago. Juliana Santos, proprietária da Girotour Viagens e Turismo, acredita que o prejuízo é geral, para companhias marítimas, agências de viagem e passageiros, que viram suas férias frustradas. Ela lembra que um cruzeiro com embarque marcado para 31 de dezembro foi cancelado em cima da hora, o que gerou um grande transtorno no réveillon. “Mesmo assim, todos estão remarcando a viagem, compreendendo o problema”, destaca. Para ela, a contaminação pode ocorrer no transporte até o navio, por isso a testagem deveria ocorrer antes do embarque. “Para um navio que já saiu, o gasto é enorme”.A agente de viagens Cejana Nascimento, da Tropical Turismo, afirma que os cruzeiros previstos para janeiro já estão sendo remarcados. Ela ressalta que apenas os navios são o grande alvo do momento, enquanto hotéis e praias estão cheios e não há a mesma fiscalização. “É um grande transtorno para o passageiro que estava com férias marcadas e também para as agências, pois a remarcação exige todo um procedimento operacional.”João Carlos Rufino, da Atlantis Viagens e Turismo, conta que a agência preferiu não comercializar pacotes para cruzeiros nesta temporada por já prever a possibilidade de problemas como este, após o aumento de casos de Covid-19 em outros países. “Mesmo com a remarcação ou reembolso, isso sempre gera transtornos para nós e os passageiros”, diz. João garante que também não tem tido problemas com cancelamento de voos, pois os passageiros estão sendo remanejados para outros voos. “Mas se a pessoa não quiser mais viajar, terá direito ao reembolso em sete dias”, alerta.A grande dúvida é sobre o efeito psicológico que o problema pode gerar nos consumidores, que podem temer futuros cancelamentos e adiar a compra do pacote de viagem. Para Marcos de Sousa, da Costamares Viagens e Turismo, que também optou por não vender cruzeiros para esta temporada, o problema pode afetar todo trade turístico, com impacto negativo nas vendas. Já a frequência de cancelamentos de voos, segundo ele, tem sido reduzida e ainda não trouxe problemas.Trade turístico teme prejuízo generalizado“O prejuízo será de milhões, pois os navios também fazem paradas em várias cidades, onde geram receita”, prevê a presidente da Associação Brasileira das Agências de Viagem em Goiás (ABAV), Eliene Meireles. Ela concorda que o problema se tornou uma bomba-relógio dentro dos navios e que é preciso priorizar a saúde. Para ela, o maior prejuízo pode ser mesmo a paralisação na cadeia de vendas. “Isso sempre gera um efeito dominó de medo que afeta a comercialização de pacotes”, alerta. Segundo Eliene, ainda há dúvidas sobre a remarcação das passagens aéreas dos passageiros que já haviam embarcado para os cruzeiros. Para quem ainda não havia viajado, a remarcação já está definida sem ônus. “Ainda sentiremos os impactos da pandemia, enquanto não atingirmos um índice maior de vacinação”, alerta.Há 52 anos no ramo, o empresário Telmo Conconi, da Atlas Viagens, também adverte para a possibilidade do problema desestimular a compra de viagens em cruzeiros de agora em diante. Mas, para ele, não se pode esquecer que o problema também está dentro de aviões e no transporte público de má qualidade utilizado pela população. Por isso, se forem feitos testes em todos estes locais, os casos podem ser bem maiores. “O setor, que ainda sente os efeitos das restrições em 2020, quando todos os voos pararam, agora pode ter uma queda grande na procura pelos navios, trazendo mais prejuízos”, adverte. Para Telmo, o melhor caminho seria conscientizar a população sobre a importância dos cuidados para prevenção.Procon exige garantia de direitos do consumidorO Procon do Rio de Janeiro (Procon-RJ) notificou nesta terça-feira (4) a MSC Cruzeiros e a Costa Cruzeiros para prestar esclarecimentos após notícias sobre surtos de Covid-19 a bordo das embarcações que operam na costa fluminense. O diretor jurídico da autarquia, Silvio Romero, disse à reportagem que a principal questão refere-se às providências das empresas para evitar o avanço da doença e, diante do que aconteceu, quais serão as medidas para garantir o direito do consumidor.Romero questiona, por exemplo, quais serão as alternativas para o consumidor que teve a viagem interrompida, se ele terá o dinheiro de volta, se há possibilidade de remarcação; se aquele que ainda tem a viagem marcada está sendo informado previamente sobre a situação, se a viagem está mantida, até quando tem opção de confirmar a viagem; em caso de cancelamento, em quanto tempo será reembolsado, se as empresas ofereceram crédito e se o consumidor fez essa opção, em quanto tempo poderá usar? “Queremos que as empresas esclareçam todas essas questões relativas ao direito do consumidor”, afirmou.A partir do recebimento da notificação, as empresas terão dez dias para responder ao Procon-RJ. A MSC e a Costa Cruzeiros deverão ainda informar à autarquia quantos cruzeiros estão previstos para a temporada 2021/2022 e quantos têm como rota o estado do Rio de Janeiro. De acordo com Romero, já era esperado o surgimento de casos de Covid-19. A esse respeito, as empresas terão de dizer qual o plano que haviam elaborado e por que este não se mostrou eficiente, já que houve a interrupção momentânea da temporada, determinada pelas autoridades sanitárias. O que as empresas estão preparando para a frente é outra indagação.Outras dúvidas são: a empresa disponibiliza canais de atendimento aos consumidores para comunicação rápida, clara e transparente àqueles viajantes que aguardam a partida dos navios nos portos? Como é comunicada ao consumidor a confirmação de embarque ou de cancelamento do cruzeiro? Caso tenha havido ocorrência epidemiológica causada pela Covid-19 em alguma embarcação, como foram realizados o atendimento, a assistência e a prestação do serviço aos passageiros infectados e aos não infectados, durante o período de quarentena no navio? Há plano de contingência em casos de surto de casos de Covid-19 a bordo das embarcações em operação?Segundo Romero, a notificação tem o objetivo de verificar se os direitos do consumidor estão garantidos. Ele disse que, até o momento, não há notícia de que os direitos estejam sendo descumpridos. “A gente está monitorando a situação e a conduta das empresas. Caso seja verificada uma infração ao direito do consumidor, poderá ser instaurado um processo administrativo e estabelecida uma multa. Pelo Código de Defesa do Consumidor, a multa poderá ter valor de até R$ 10 milhões.Nesta segunda-feira (3), os secretários municipais de Armação dos Búzios, que integra o roteiro dos cruzeiros no estado do Rio de Janeiro, reuniram-se com representantes da Clia Brasil e da Anvisa para conhecer os novos procedimentos a serem acatados. Os cruzeiros que estão em navegação vão finalizar os seus roteiros conforme o calendário previsto.