Com cenário preocupante para a economia brasileira, a economista e sócia da consultoria americana Oliver Wyman no Brasil, Ana Carla Abrão, não está otimista com 2022. Para Goiás, em entrevista ao programa Chega pra Cá, com a jornalista Cileide Alves, ela destacou nesta terça-feira (04) que a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) é apenas o primeiro passo e pressões de ano eleitoral podem impactar o resultado.“Veremos em 2023 se o RRF foi efetivo para evitar desequilíbrio.” A adesão foi assinada no dia 24 de dezembro em Brasília (DF). Ao lado do presidente Jair Bolsonaro (PL), o governador Ronaldo Caiado (DEM) afirmou que 2022 seria de retomada e de maior alavancagem no crescimento econômico depois da “luta de três anos” para entrar no programa federal.Contudo, na avaliação da ex-secretária da Fazenda de Goiás, a exemplo do que ocorreu no Rio de Janeiro, é preciso que o plano aprovado seja de fato seguido. Ter a adesão, como sugere, é um argumento importante que o governador Ronaldo Caiado (DEM) possui para conter pressões no aumento de gastos que ocorre nesta época em que há foco nas eleições.“Infelizmente, no caso do Rio de Janeiro, o regime e nada foi a mesma coisa. Só serviu para receber recursos adicionais, porque não houve pelo Legislativo o comprometimento.” Ana Carla cita como exemplo leis aprovadas ao longo do processo que desestruturaram o plano carioca e, por isso, defende que seria preciso no caso goiano o alinhamento entre os poderes para que não cedam ao incremento de despesas.Depois de aderir ao RRF, como ponto de partida, seguir a trajetória prevista seria o desafio do qual o resultado depende. “O regime não é um instrumento suficiente. É lei, tem o plano definido, mas temos vários exemplos de que isso vira letra morta.” Na entrevista ao POPULAR, a economista explicou que o próprio resultado dos cortes e ajustes que promoveu quando foi secretária da Fazenda foram afetados posteriormente pelo cenário eleitoral, que elevou os gastos e culminou no não pagamento da folha de servidores em 2018.“Arrumar é difícil, mas bagunçar é fácil”, defendeu. Ela acredita que, como neste ano, o calendário eleitoral também começou cedo em 2018 e o alívio gerado nas contas após decisões difíceis e cortes serviu para o desequilíbrio. “Não teve continuidade o processo de ajuste fiscal e, depois, o que se observou foi um aumento de gasto muito grande”, concluiu ao dizer que possivelmente a situação estadual ficou pior naquele ano do que estava em 2015 quando no governo de Marconi Perillo (PSDB) trabalhou pelos ajustes. Ela permaneceu no governo tucano até 2016.Desequilíbrio A economista avalia que a percepção de que em 2022 há recursos sobrando nos Estados, que contaram com transferência inédita do governo federal, traz também um risco de desequilíbrio. Porque não há pagamento de dívida, os salários ficaram congelados no serviço público e houve processo inflacionário que aumentou arrecadação, mas pontua que posteriormente sabe-se que traz um aumento nas despesas. “O Brasil está no buraco que está porque políticos colocam a perpetuação política à frente do que precisa ser feito.” Colocar o bem da população em primeiro lugar, por outro lado, reconhece que pode ser custoso, mas acredita que isso esteja acontecendo em Goiás pelo interesse da busca pela responsabilidade fiscal com a adesão ao RRF. Ela lembrou a dificuldade de tocar em certos assuntos no Estado que são sensíveis como os incentivos fiscais, mas que precisam, na sua visão, serem revistos em todo o Brasil. “A gente tem de parar de passar a mão e dar dinheiro público para quem não precisa. Só vamos conseguir fazer isso quando os líderes tomarem decisões difíceis e inclusive políticas.” Eleição Do lado das disputas eleitorais de 2022, Ana Carla Abrão integra a equipe de economistas do pré-candidato à Presidência pelo PSDB, João Doria. Junto com ela, Henrique Meirelles, Zeina Latif e Vanessa Canado. A defesa, como afirmou ao POPULAR, é pela possibilidade de combater a desigualdade social e, ao mesmo tempo, ter responsabilidade fiscal no governo. “A gente parte de uma hipótese, que para mim é forte, de que no Brasil não faltam recursos. O que precisa é redirecionar.”Esse redirecionamento que defende partiria da análise de linha a linha do orçamento na tentativa de entender se o recurso alocado em cada área tem retornado para a sociedade com o resultado esperado. “Venho da família de políticos goianos, sei que politicamente não é fácil”, reforça ao citar que a discussão com a sociedade precisa ocorrer para o enfrentamento do quadro econômico atual.“Ele (Doria) é o candidato para levar a bandeira com credibilidade e vamos tentar dar contribuição para elevar a qualidade do debate público. Não dá para ficar discutindo agenda de costumes, tem de enfrentar problemas reais na estrutura e base. A economia é um problema real que bate no bolso de todos e em particular dos mais pobres.”A defesa do grupo é por uma agenda de recuperação do quadro atual, segundo ela. Até a eleição, acredita que 2022 ainda será difícil com base nos números e perspectivas econômicas disponíveis. “Os indicadores mostram que a trajetória dos últimos anos vai se aprofundar”, aponta. Inflação alta, retração do PIB e nível alto de desemprego são preocupações que devem continuar.“Pela falta de crescimento, não será um ano alentador e de prosperidade, mas será de reflexão e oportunidade de mudar essa trajetória democraticamente, pelo voto, o nosso maior instrumento de renovação”, conclui a economista.-Imagem (1.2381600)