Denúncias de violação de direitos humanos, incluindo da comunidade LGBTQIA+, e trabalhistas cercam a preparação para a Copa do Catar. Desde o início das obras dos estádios, por exemplo, a partir de 2014, são relatados casos de exploração de trabalhadores, mortes de operários e, recentemente, a proibição de manifestações públicas, como andar com a bandeira do arco-íris pelo país que receberá o principal evento de futebol do planeta a partir de 20 de novembro.A preservação dos direitos humanos é uma das preocupações em relação ao Mundial. Em entrevistas nos últimos anos, autoridades locais afirmam que pessoas de todas as orientações sexuais serão bem-vindas no país asiático. Mas terão de seguir proibições, como manifestações de afeto em público. Homossexualidade é punível com até sete anos de prisão no Catar.“Quando você proíbe manifestações públicas de afeto entre pessoas do mesmo gênero, você muitas vezes o faz por acreditar que aquilo é imoral, por falta de caráter ou defeito moral, e dentro desse sentido deve ser inibido. Só que isso parte do pressuposto equivocado, por pensar que ser LGBTQIA+ é uma escolha. Não é, é característica do ser humano que se descobre ao longo da vida”, frisou Amanda Souto, vice-presidente da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero do Conselho Federal da OAB.Leia também- Tite possui dúvidas para fechar lista- França tem retorno de goleador e segue com base talentosa- Atacante do Flamengo pode ser novidade no Catar- Trio é referência mesmo em mercado alternativos- Contagem regressiva: 100 dias para a CopaPara ela, o Catar passa a mensagem de hostilidade ao proibir manifestações a favor da comunidade LGBTQIA+ e afetos públicos entre pessoas do mesmo gênero.No final do ano passado, o presidente do Comitê Organizador da Copa do Mundo de 2022, Nasser Al-Khater, ressaltou em entrevista à CNN que os torcedores da comunidade LGBTQIA+ não poderão demonstrar afeto público. “Eles virão ao Catar como torcedores e participantes de um torneio de futebol e poderão fazer o que qualquer outro ser humano faria. As demonstrações de afeto são desaprovadas e isso se aplica a todos”, disse o dirigente.Neste ano, o major-general Abdulaziz Abdullah Al Ansari, chefe de segurança do governo do Catar, afirmou à Associated Press que as bandeiras nas cores do arco-íris, representativas do movimento LGBTQIA+, poderão ser confiscadas. “Se ele (um torcedor) levantou a bandeira do arco-íris e eu a peguei dele, não é porque eu realmente quero insultá-lo, mas para protegê-lo. Se não for eu, alguém ao redor dele pode atacá-lo. Não posso garantir o comportamento de todo o povo”, argumentou.Algo que marca este específico contexto é o silêncio por parte da Fifa. Em algumas ocasiões, a entidade divulgou comunicados em que afirma que a comunidade LGBTQIA+ será bem-vinda ao Catar, proíbe discriminação com base na orientação sexual ou identidade de gênero e diz que todos terão segurança.Amanda Souto não concorda. “A questão da segurança é algo que a comunidade LGBTQIA+ que for visitar o Catar durante a Copa do Mundo deve levar em consideração, especialmente em razão do contexto político e social que não é favorável à comunidade. Existem leis discriminatórias e não reconhecimento de direitos, como o casamento. Então um gay afeminado, uma pessoa trans que imediatamente é reconhecida ou até mesmo casais que demonstrarem carinho em público podem sofrer algum tipo de violência e preconceito”, avisou a vice-presidente da Comissão de Diversidade Sexual e de Gênero do Conselho Federal da OAB, que reforça que o Catar demonstra “resistência com essa questão”.Outro ponto que marcou os últimos anos em relação à Copa do Catar foi a violação de direitos humanos e trabalhistas. Um exemplo é que operários, apenas no final do ano passado, passaram a trabalhar em temperaturas inferiores a 32º C. Grande parte dos trabalhadores integra o regime conhecido como “Kafala”, que mantém o empregado refém do empregador.“Somente em 2019 foi extinto o certificado de não objeção, em que, para trocar de emprego, o empregado deveria ter uma autorização do seu patrão ou empresa. Com isso, por exemplo, havia bloqueio de passaporte. O ambiente em que houve toda construção de estádios, hotéis, obras públicas como metrô foram situações em que os trabalhadores atuavam em temperaturas altíssimas, acima de 40 graus”, contou o presidente da Comissão Especial de Direito Empresarial do Trabalho da OAB-GO, Leopoldo Siqueira.Um levantamento feito em fevereiro de 2021, pelo jornal britânico The Guardian, mostrou que ao menos 6,5 mil trabalhadores imigrantes morreram no Catar desde o início das obras e que o número pode ser maior devido à subnotificação de casos.Para críticos, melhorias trabalhistas foram tardias. Em março deste ano, a Fifa divulgou comunicado em que, após reunião com o governo do Catar, houve uma nova lei sobre salário mínimo e fechamento de 338 empresas que não cumpriram com a legislação sobre a jornada de trabalho durante altas temperaturas.“Nota-se que, de fato, a Fifa se restou muito omissa a todas as situações sociais do Catar. Houve algumas melhorias nos direitos dos trabalhos, valorização do salário mínimo, mas de forma tardia. A questão é que grande parte do lucro que a Fifa terá com essa Copa do Mundo será extraído com precarização da mão de obra, com acidentes de trabalho, mortes de operários, escravidão, retenção de passaporte e várias outras situações que ocorreram dentro desses quase 12 anos que antecederam a Copa”, completou Leopoldo Siqueira.