Um jogo que traz lembrança especial para um jogador é o reencontro com o time que o revelou para o futebol. O meia Marlone terá esse gosto, neste sábado (23), a partir das 16h30, no Estádio Serra Dourada, na abertura do 2° turno da Série B. Com a camisa do Vila Nova, o jogador de 30 anos reencontra o Vasco, clube em que começou a jogar aos 11 anos.Não é a primeira vez que Marlone joga contra o Vasco. O meia já atuou cinco vezes contra a equipe carioca: três pelo Sport, uma pelo Atlético-MG e outra pelo Fluminense. Venceu uma vez e perdeu quatro duelos. O jogador deve começar a partida deste sábado no banco.A história de vida de Marlone é exemplo de superação e de um triste retrato do que ocorre diariamente com mulheres no Brasil. “Minha mãe sofreu um abuso quando criança”, contou o jogador de 30 anos, que nasceu no interior do Tocantins quando sua mãe tinha 13 anos. A frase “não era para eu estar aqui” é compartilhada pelo atleta em algumas ocasiões e serviu de inspiração para que ele pudesse vencer na vida.Leia também:+ Vila Nova aposta em experiência de contratados+ Tigre rescinde contrato com volanteMarlone nasceu em Augustinópolis, a mais de 630 km da capital do Tocantins, Palmas. O meia não evita falar sobre o passado por entender que serviu de inspiração para se tornar o pai, irmão, filho e homem que é.O abuso que a mãe de Marlone sofreu ocorreu no povoado de Vinte Mil. Por falta de acesso a cuidados básicos, a mãe do meia não teve o acompanhamento necessário na gestação. Por isso, apenas no momento da gravidez todos souberam que a gravidez era de gêmeos. Deusa sofreu hemorragia, mas os três sobreviveram.Marlone foi adotado pelo casal Jaldo e Eunice. Seu irmão, Marlon, que é ex-jogador, ficou com a família materna. “Ela (Deusa) não tinha condição física, psicológica, financeira, nada (para cuidar dos filhos). Eu fui o primeiro a sair, e foi quando o médico falou que tinha mais um. Meu pai adotivo já tinha falado que, se tivesse um menino, gostaria de adotar. Foi eu. Meu irmão ficou com meu avô biológico. No papel, meu irmão é irmão da minha mãe. Os pais dela a registraram como filho. Fiquei 11 anos sem conhecer meu irmão”, contou Marlone.Foi logo depois do primeiro encontro que a vida do hoje meia do Vila Nova mudou. Marlone e Marlon se conheceram em uma cena de filme.“Eu estava jogando bola com os meninos na rua e fizemos uma aposta. Quem perdesse ia comprar refrigerante no mercado. Eu ganhei, um amigo foi comprar o refrigerante e, quando chegou no ponto de van (para voltar), viu um menino igual a mim. De tanto eu falar, ele ligou uma coisa à outra”, lembrou Marlone.O então garoto de 11 anos pegou a bicicleta, subiu uma ladeira na direção de onde o colega relatou ter visto o suposto irmão gêmeo. “Lembro que passei pelo quartel da cidade, depois da rua de casa, subi uma ladeira, passei por um quebra-mola e encontrei o carro. Era uma caminhonete D-20. Foi quando o encontrei pela primeira vez. Eles ficaram na cidade por uns dias, foi uma atração na cidade”, detalhou Marlone.Nesse período, o meia do Vila Nova jogava em uma escolinha. Aos 12 anos, foi aprovado após uma peneira no Vasco e foi morar sozinho no Rio de Janeiro. Nesse período, perdeu contato com o irmão, que só foi reatado por causa das redes sociais quando Marlon viu que Marlone havia se tornado jogador.“Com 18 anos, fizemos nosso primeiro aniversário juntos. No Rio, nos encontramos novamente por causa do futebol. Hoje, mantenho contato com todos, meu irmão está no Rio, minha mãe mora no Piauí. Meus pais adotivos seguem em Augustinópolis”, contou Marlone, que ajudou o irmão a fazer testes por clubes cariocas. Marlon tentou seguir no esporte, mas, sem sucesso, optou por não atuar mais.A história pessoal de superação fez Marlone, segundo ele, se tornar uma pessoa que valoriza mais a família e que gosta de compartilhar com jogadores mais jovens que o foco é o caminho para o sucesso.“Quando você persevera, tem foco e destino. A probabilidade de se chegar no objetivo, não que seja mais fácil, se torna mais real. É algo que tenho dentro de mim. Não saio de casa para passar vergonha e sair como derrotado. Vim para cá (Vila Nova) para voltar com vitória, com histórias. Muitas pessoas querem ser blindadas de adversidades, mas viver assim é viver de ilusão”, opinou Marlone, que, entre um treino e outro no Vila Nova, conversa com jovens das categorias de base do clube colorado compartilhando um pouco do seu conhecimento.DesenhosMarlone é pai de Angelina (4 anos) e Antonella (6 anos) e diz que gosta de estar envolvido em tudo que cerca o crescimento das duas. O meia, com títulos conquistados e passagens por clubes como Vasco, Atlético-MG, Cruzeiro, Corinthians e Goiás, gosta de desenhar.Quando ainda jogava pelo Vasco, Marlone desenhou como seria sua primeira entrevista, como seria o primeiro gol e o estádio (São Januário) em que marcaria pela primeira vez - o que ocorreu no dia 29 de agosto de 2013, quando anotou um gol na vitória de 2 a 1 do time carioca contra o Nacional-AM, pela Copa do Brasil, na casa do clube alvinegro.“Até hoje eu desenho. Inclusive, tenho um desenho pronto do meu primeiro gol com a camisa do Vila Nova. Não sou desenhista, o que vale é a intenção. São bonecos mesmo, igual a gente faz quando criança. No Vila, o gol vai ser no OBA mesmo, eu comemorando gol com a torcida”, revelou o meia, que neste sábado (22) vai atuar no Serra, diferente dos jogos anteriores, no OBA.Com residência fixa no Rio, Marlone ganhou uma injeção de ânimo neste início de trajetória no Vila Nova com a chegada das filhas a Goiânia. Angelina e Antonella desembarcaram no final da semana passado e ficarão por algumas semanas.