Ao buscar a filha adolescente no colégio, o advogado Ezízio Barbosa, de 63 anos, notou que a postura da garota não estava normal. A coluna de Alice, de 14 anos, parecia desenhar um “C” para o lado direito. Ao comentar o problema com a mulher, eles imaginaram que a má postura da filha era coisa típica do estirão da adolescência e também culpa, em parte, de práticas como o uso da mochila de alça com excesso de peso. Mas o problema era bem mais grave.“Levamos a Alice em vários ortopedistas e se tratava de uma escoliose idiopática”, explica. A doença é a forma mais comum de escoliose e pode ser vista entre 2 a 4% das crianças de 10 a 16 anos. No caso de Alice, considerado grave, o tratamento foi cirúrgico. “Ficamos extremamente apreensivos, mas tinha de ser feito. Graças a Deus, ela fez a cirurgia, correu tudo bem e hoje o problema está resolvido”, explica o advogado.A escoliose idiopática é mais comum do que parece. No Brasil, são mais de 1,6 milhão de pessoas de até 18 anos acometidas pelo mal. Aproximadamente 160 mil precisam de tratamento cirúrgico e junho é considerado o mês da conscientização do problema. Especialistas afirmam que pais e responsáveis devem estar mais atentos à postura dos filhos para detectar precocemente a doença. Um parêntese importante: idiopática em medicina quer dizer sem causa conhecida.“A coluna vertebral vista de frente é reta; de lado, ela tem curvas que são normais. A escoliose é a angulação lateral da coluna vertebral”, explica o ortopedista e cirurgião da coluna Murilo Daher, diretor do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da UFG. Apesar da definição, sabe-se que a vértebra também apresenta rotação em torno do próprio eixo, levando a uma deformidade tridimensional da coluna.“Há também a deformidade da caixa torácica, podendo ter repercussões pulmonares e comprometimento de outros órgãos”, alerta o especialista. Ao contrário do que o senso comum acredita, a condição não decorre de maus hábitos posturais. Na verdade, é a curva da coluna própria da escoliose que, em muitas situações, é responsável pela má postura do adolescente. “A questão postural é hipervalorizada, tanto pela população leiga quanto por alguns colegas da área, mas sem nenhuma evidência científica”, destaca o ortopedista.Um bom exemplo é associar a doença ao uso de mochilas com apenas uma das alças ou colchões inadequados. “Tudo isso é mito. Se fosse assim, seria muito fácil a prevenção e o tratamento”, afirma Murilo. Possivelmente de caráter genético e hereditário, a escoliose pode surgir em qualquer fase da vida. O mais comum, entretanto, é o aparecimento estar associado ao surto de crescimento que se instala no final da puberdade e se intensifica na adolescência.“Esse grupo representa mais de 80% de todas as deformidades da coluna vertebral. Além de ser nesse período que a maioria das deformidades aparecem, é nele também que acontece a fase de maior risco de progressão”, explica o ortopedista. Além do problema postural, a doença provoca a restrição do tamanho do tórax e da capacidade pulmonar, além de repercussões cardíacas.Para evitar complicaçõesQuanto mais cedo for feito o diagnóstico e iniciado o tratamento da escoliose idiopática, maiores serão as possibilidades de evitar as complicações da doença. Uso de coletes ortopédicos e fisioterapia, para casos moderados, e cirurgia, para os mais graves, são as formas mais comuns de tratamento. Toda cirurgia na coluna, em decorrência da proximidade com a medula espinhal, é bastante temida. No entanto, as correções de escolioses, quando realizadas por centros de referência e por equipes experientes, são consideradas seguras.“A fisioterapia pode ajudar os pacientes com escoliose na prevenção da evolução e piora da curva escoliótica, melhora nas assimetrias e desalinhamentos posturais, e principalmente na melhora funcional nos movimentos que envolvem a coluna vertebral”, explica o fisioterapeuta Thiago Vilela Ramos, que é doutor em Ciências e Tecnologias na Saúde pela UnB. Em casos pós-cirúrgicos, sessões de fisioterapia também são fundamentais para a recuperação do paciente.Para o especialista, o melhor cuidado que pais e responsáveis podem oferecer à coluna vertebral das crianças é estimular o movimento. “A coluna foi feita para movimentar e, quanto mais cedo estimularmos as crianças a realizarem exercícios, esportes e atividades físicas, melhor. Não podemos esquecer que é nessa fase que nasce o prazer pelos exercícios físicos. Movimento é saúde para a coluna vertebral”, garante.Os principais tipos da escoliose são:- Escoliose congênita: é responsável por cerca de 10% dos casos e se origina desde o dia do nascimento, quando ocorre má formação ou divisão das vértebras.- Escoliose neuromuscular: é causada por problemas neurológicos como paralisia cerebral ou musculares que determinam fraqueza muscular, controle precário dos músculos ou paralisia decorrente de doenças como distrofia muscular, espinha bífida e pólio.- Escoliose idiopática: esse tipo de escoliose é o mais habitual, assume cerca de 80% dos casos. Não se sabe ao certo porque a pessoa desenvolve a escoliose e, com isso, surgem diversos fatores que podem estar envolvidos, como hereditariedade, por exemplo. Ela pode aparecer em crianças, adolescentes, jovens e adultos.- Escoliose degenerativa do adulto: quando é causada pela degeneração de discos da coluna vertebral e de suas articulações como resultado, em especial, do avanço da idade.