Ao perceber uma mancha azulada na barriga, instintivamente ele esfregou mais forte água e sabão no banho pensando em se tratar de tinta, resquícios de seu trabalho como técnico mecânico industrial. “A empresa fabrica caixas de papelão, achei que pudesse ter me sujado por lá”, conta Wilson Ricardo Comar, de 50 anos. No dia seguinte, foram surgindo outras manchas, como se fossem pequenos hematomas, mas ele não sentia dor no local.“Fiquei preocupado e procurei ajuda médica. Tomei um susto quando ouvi o diagnóstico.” As manchas em Wilson eram sintomas de leucemia promielocítica aguda (LPA), subtipo de leucemia mieloide aguda (LMA). Da emergência, ele foi direto para a internação. O caso era grave e o tratamento tinha de ser urgente. Foram 33 dias no hospital com medicação específica, sessões de quimioterapias, uma batalha contra uma pneumonia oportunista até a tão sonhada alta. Atualmente, o técnico mecânico industrial, curado da leucemia, faz acompanhamento periódico com especialista.Segundo estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca), a leucemia é uma doença que pode atingir mais de 10 mil brasileiros entre os anos de 2020 e 2022. É o décimo tipo de câncer mais comum entre os homens e 11º entre as mulheres. “Leucemias são um tipo de câncer que acomete as células sanguíneas e que pode levar à morte. No entanto, já temos disponíveis vários tratamentos com grandes chances de cura ou controle da doença”, explica a hematologista Melaine Stefane.As leucemias são doenças muito diversas e o prognóstico depende do tipo e das especificidades de cada paciente. Segundo a especialista, o diagnóstico precoce, tema da campanha Fevereiro Laranja, pode ser feito por meio da manifestação de sintomas ou de exames sanguíneos. “Os principais sintomas são reflexos da produção inadequada de seus componentes, levando à fraqueza, fadiga, febre, infecções, sangramentos, suor excessivo, dores no corpo, emagrecimento, aumentos dos gânglios, caroços ou aumento do volume abdominal, e outros sinais inespecíficos”, explica.A doença surge quando células imaturas do sangue sofrem mutação ainda na medula óssea, onde são fabricadas, e passam a se multiplicar desenfreadamente, ocupando o lugar das células saudáveis. Existem mais de 12 tipos de leucemia, divididos em agudos e crônicos. Os quatro tipos mais comuns são leucemia linfoide crônica, a mais comum entre os adultos, mieloide crônica, linfoide aguda, a mais comum entre as crianças, e mieloide aguda.“Também existem outras, mais raras, e suas subclassificações. A causa da doença ainda não é totalmente conhecida, mas possivelmente por mutações genéticas”, explica Melaine. As leucemias crônicas geralmente são descobertas por acaso e têm sintomas leves, que se agravam lentamente. Já as agudas são mais agressivas e exigem início de tratamento imediato, que sempre inclui quimioterapia. “No entanto, hoje temos disponíveis várias quimioterapias novas e, em alguns pacientes, podem ser utilizadas somente oral e, em outras, haverá necessidade de injetável e intratecal. E há ainda outras formas de consolidar o tratamento, como, por exemplo, com imunoterapia, transplante de medula óssea e radioterapia”, enumera a hematologista.Alerta laranjaApesar de curada com o tratamento adequado, a taxa de mortalidade por leucemia segue alta no Brasil, segundo levantamento da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale). Um dos motivos é justamente a dificuldade do diagnóstico precoce. A leucemia é um tipo de câncer de sangue que se confunde facilmente com outras doenças.Por isso, o segundo mês do ano é dedicado à campanha Fevereiro Laranja, que tem como objetivo conscientizar as pessoas sobre a leucemia e a importância da doação de medula óssea. O transplante é indicado em casos de alto risco. “A campanha serve para alertar a população do diagnóstico precoce da leucemia e da necessidade de doação de medula óssea, que pode salvar uma vida”, salienta a hematologista e hemoterapeuta pelo Inca, Maria Cunha Ribeiro Amorelli.Investigação começa hemogramaO primeiro passo para se diagnosticar uma leucemia é um dos mais comuns exames laboratoriais: o exame de sangue. Ele pode apresentar alterações em plaquetas, leucócitos e hemácias, que pedem uma avaliação mais pormenorizada. "O simples hemograma já pode dar esse diagnóstico da leucemia, mas o subtipo é indicado por meio de alguns exames na medula óssea como a imunofenotipagem, às vezes, uma biópsia, ou mielograma, que é o exame que a gente faz a punção no osso e consegue colher as células da medula óssea onde é produzido o sangue e onde nascem as células da leucemia", explica a hematologista e hemoterapeuta Maria Cunha Ribeiro Amorelli.De acordo com a especialista, há alguns sinais de alerta para a doença como anemia, palidez, cansaço, manchas roxas e sangramentos, em razão da queda das plaquetas, gânglios podem surgir, além de febre baixa e falta de apetite. Se detectada e medicada logo, a leucemia tem chances altas de cura, principalmente quando acomete os mais novos. Infelizmente não existe uma forma de prevenir a doença. Leucemia: o que é a doença?A leucemia é uma doença que afeta a medula óssea, quando as células sanguíneas normais são substituídas pelo acúmulo de células doentes. A medula óssea é fundamental para o corpo humano. É o local de fabricação das células sanguíneas e ocupa o interior dos ossos.Tipos de LeucemiaConheça os tipos mais comuns de leucemiaLeucemia linfoide crônica (LLC)Afeta células linfoides e se desenvolve de forma lenta. Raramente afeta crianças. A maioria das pessoas diagnosticadas com esse tipo da doença tem mais de 55 anos.Leucemia linfoide aguda (LLA)Afeta células linfoides e agrava-se de maneira rápida. É o tipo mais comum em crianças e adolescentes, mas também ocorre em adultos.Leucemia mieloide crônica (LMC)Afeta células mieloides e se desenvolve vagarosamente, a princípio. Acomete principalmente adultos. Em alguns casos, o tratamento pode dispensar a quimioterapia, com o uso de medicamentos inibidores da proteína tirosina quinase causadora especificamente dessa leucemia.Leucemia mieloide aguda (LMA)Afeta as células mieloides e avança rapidamente. Ocorre tanto em adultos como em crianças, mas a incidência aumenta com a idade.Como se tornar doador de medulaPara se tornar doador de medula, é preciso fazer um cadastro no Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome). Esse é o órgão que promove a busca de doadores no Brasil e nos registros estrangeiros.É possível se cadastrar como doador voluntário de medula óssea nos hemocentros localizados por todo o Brasil. O Inca recomenda que, antes de fazer o cadastro, o candidato a doador esclareça dúvidas a respeito da doação no próprio hemocentro.Decidindo seguir, uma amostra de 10 ml de sangue será coletada para o exame de compatibilidade. A pessoa precisará assinar um termo de consentimento livre e esclarecido e preencher uma ficha com informações pessoais.Quem pode doar?Ter entre 18 e 55 anos de idade.Estar em bom estado geral de saúde.Não ter doença infecciosa ou incapacitante.Não apresentar doença neoplásica (câncer), hematológica (do sangue) ou do sistema imunológico.Algumas complicações de saúde não são impeditivas para doação, sendo analisado caso a caso.