Os familiares e as amigas sempre foram os clientes fiéis. Maria Ireny dos Santos e Castro, de 73 anos, senta em frente a sua máquina de costura e faz cada peça com carinho e capricho. “Nunca comprei roupa para as minhas três filhas, sempre fiz tudo. Elas estavam sempre embonecadas”, garante. Agora, os oito netos é que ganham camisas, vestidos e outras peças feitas especialmente pelas mãos da avó. Roupinhas de quadrilha, vestido de aniversário, boneca de pano — ela modela, corta, costura e borda à gosto do freguês.Se hoje é raridade encontrar jovens que saibam ao menos iniciar e arrematar um ponto, para a geração de Maria Ireny o conhecimento de todo o processo da produção das roupas era repassado desde cedo em casa. “A minha mãe, que tinha 11 filhos, também fazia as nossas roupas. Eu via ela e minhas irmãs mais velhas costurando e ficava interessada em aprender”, relembra. A família morava em uma fazenda no município de Orizona, e entre os aprendizados estava também fazer sabão, cuidar das galinhas, fazer queijo e plantar. “A gente fazia tudo no dia a dia em casa, até apanhava café”, conta. Quando o pai ia até a cidade, comprava alguns metros de um tecido estampado e levava para casa. “Com o mesmo tecido fazia várias peças, aquele monte de roupa igual para nós. Às vezes dava para fazer florzinhas de aviamento para aplicar nos vestidos”, conta. Aos poucos, Maria Ireny também foi aprendendo a fazer ajustes, dar pontos e produzir peças. “Quando a gente ficava mocinha, começava a fazer nosso o enxoval”, recorda-se.Momentos marcantesA relação especial com a feitura das roupas acompanhou momentos marcantes da vida de Maria Ireny. “Lembro do meu vestido de noivado, minha irmã que fez para mim. Era de piquet branco, aquele tecido com quadradinhos em alto relevo. Rosinha na barra, que ia até o joelho, a saia rodada. No decote todo tinham três babadinhos, rosa, azul claro e amarelo”, conta. “No meu tempo era uma judiação, não tinha máquina fotográfica. Não tenho registrado o vestido, mas nunca esqueço dele”.Com as filhas e os netos, o aprendizado repassado por sua mãe e irmãs puderam continuar. “Eles encomendam comigo, fazem pedidos. Meus netos Lucas e Carol encomendaram um vestido especial para dar de presente para a irmã mais nova, era aniversário de dois anos dela”, lembra. “Minha irmã mandou dos Estados Unidos uns tecidos, a coisa mais linda. Tinha um de estampa de pinguim com o fundo azul claro que fiz três camisas para os meus netos, todas iguais, igual lá em casa”. As gerações posteriores não tiveram o interesse em aprender a costurar, o que ela avalia como “sinal dos tempos”. As amigas também têm espaço reservado na agenda de Maria Ireny e sua fiel máquina de costura. “Tenho muitas amigas que fazem encomendas e que gostam demais. Agora tenho feito muitas máscaras por causa da pandemia, mas, confesso: já estou ficando cansada”, diz. “Desde que meu marido aposentou eu tenho pensado em diminuir o ritmo ou parar de vez de aceitar encomendas, mas elas confiam em mim e faço com prazer”, revela.