Na tarde de sexta-feira (11), na Prefeitura de Goiás, o secretário municipal de Saúde, Marcos Elias da Neiva, apresentou os números sobre a pandemia da Covid-19 que acabavam de ser fechados. Havia grande expectativa no anúncio, já que naquele dia era fechada uma semana epidemiológica estratégica: aferia-se qual havia sido o impacto do carnaval na cidade. E as boas notícias vieram. Não ocorreu uma explosão de casos, como se temia. Apenas três novas notificações naquele dia e outras duas na véspera. E no Hospital São Pedro de Alcântara, ninguém estava internado por conta da doença.Com esses números em mãos, o prefeito Aderson Gouvea (PT) bateu o martelo, com a anuência da Diocese de Goiás. Chegara a hora de retomar as atividades religiosas plenamente, incluindo a nacionalmente famosa Procissão do Fogaréu, tradição que leva para as ruas de pedra da antiga Vila Boa, na madrugada de quarta para quinta-feira da Semana Santa, os homens encapuzados, portando tochas acesas, ao som de tambores, que encenam a perseguição a Jesus. As estatísticas foram favoráveis porque a cidade apostou na vacinação de seus moradores, deixando para trás um longo período de incerteza e dor.“Já saiu uma portaria do Estado desobrigando o uso de máscaras em locais abertos a partir que se atinja 75% da vacinação e estamos bem à frente desse quadro”, explica o prefeito Aderson, justificando a liberação da realização do evento sem restrições sanitárias específicas. De acordo com o vacinômetro criado pelo Comitê de Enfrentamento da Pandemia na cidade, mais de 99% da população apta a ser imunizada já recebeu a primeira dose e mais de 80% dos moradores já estão com a segunda dose no braço. “É claro que a Igreja vai trabalhar com a orientação sobre esses cuidados”, afirma Aderson.Nesta semana, novas reuniões serão realizadas entre o poder público com as autoridades religiosas da cidade e instituições que trabalham na organização das celebrações da Semana Santa. Eles vão acertar detalhes a partir do decreto publicado na cidade que desobriga o uso de máscaras em lugares abertos, mas as mantém obrigatórias em espaços fechados, como escolas, universidades, museus, transporte coletivo e interior de igrejas. A tendência é que haja uma orientação para o uso de máscaras nas procissões para pessoas mais idosas, com comorbidades ou que não tenham completado o ciclo vacinal.Isso não quer dizer que a vigilância vai acabar. “Vamos continuar o monitoramento e o perfil epidemiológico será acompanhado durante todo esse período”, garante Raíssa Coutinho, secretária de Cultura da cidade de Goiás. “É o momento de celebrar, mas com muita responsabilidade”, enfatiza. “A cidade está preparada para receber os turistas com segurança”, assegura o prefeito Aderson. Ele espera que muitos visitantes queiram retornar à antiga capital do Estado não só para a Procissão do Fogaréu, mas também para outras celebrações da quaresma, como as Procissões dos Passos, das Dores e do Senhor Morto.“A Semana Santa foi a primeira atividade que não realizamos em 2020. A última foi o carnaval daquele ano. Então, retornar muito nos alegra e nos enche de esperança de que dias melhores virão”, salienta a secretária Raíssa. “Ficar dois anos sem a Procissão do Fogaréu, sem as outras festividades religiosas, trouxe um sentimento de tristeza, de angústia aos vilaboenses, sobretudo aos mais idosos, que nunca deixaram de comparecer às procissões”, reforça Marlene Velasco, diretora do Museu Casa de Cora, certamente o ponto turístico mais visitado da cidade, que é Patrimônio Mundial da Humanidade.Algumas tradições vão sendo retomadas aos poucos, como os motetos, que os membros da Irmandade do Senhor Bom Jesus dos Passos promovem na Igreja São Francisco de Paula, que já podem ser ouvidos. “A cidade de Goiás é extremamente religiosa, ela mantém suas tradições de séculos e ficar dois anos sem ver uma procissão passar por sua janela trouxe uma tristeza muito grande”, testemunha Marlene. “A gente via uma tristeza no olhar de cada morador, foram momentos difíceis. Há dois anos que não veem os farricocos nas ruas, as tochas acesas, os tambores das fanfarras. Vai ser emocionante”, prevê Raíssa.Alívio econômicoPara uma cidade turística como Goiás, não poder receber visitantes durante dois anos provocou impactos econômicos profundos. “Goiás tem no turismo religioso um forte acento”, pontua o prefeito Aderson Gouvea (PT). “A economia em Goiás já está muito impactada há mais de dois anos, paralisada, sem o convite especial para que as pessoas venham para cá. As pousadas, a rede de alimentação, vários setores ganham com a vinda de pessoas para Goiás. A Procissão do Fogaréu é o ápice, mas durante toda a Semana Santa há muita gente que vem para cá”, complementa. “A pandemia impactou de forma muito bruta nossos empresários do setor de turismo, que bravamente lutaram nesses dois anos de pandemia”, diz Raíssa Coutinho, secretária de Cultura. “Muitas vezes, tivemos de tomar decisões muito difíceis, sermos duros nos decretos. Mas as pessoas que queriam um turismo mais seguro, no que chamamos de turismo responsável, buscaram a cidade de Goiás e agora, é claro, que não vamos jogar todo esse trabalho fora”, avisa. No decorrer de 2022, se a pandemia continuar sob controle, outros eventos, como o Fica, deverão voltar a suas edições presenciais.“Nesses dois anos de pandemia, em que não houve nenhuma manifestação cultural na cidade, o empresariado, a economia do município ficou perdida, prejudicada. A retomada da considerada normalidade, porque a gente não vai desobedecer às normas sanitárias, é uma alegria”, comemora Marlene Velasco, do Museu Casa de Cora. Em sua existência, essa foi a primeira vez que a Procissão do Fogaréu foi interrompida por uma emergência sanitária. Realizada pela primeira vez em 1745, ela passou um período esquecida, sendo resgatada nos anos 1960 e desde então, até 2020, não havia deixado de percorrer as ruas de Goiás.SAIBA MAIS• Procissão do Fogaréu da cidade de Goiás volta a ser realizada após dois anos • Organizadores da Procissão do Fogaréu lamentam cancelamento