O termo pneumonia é bem comum aos ouvidos, que designa a inflamação aguda dos pulmões. O que parte da população pode não saber é que a doença, bastante comum nesta época do ano, pode ser provocada por múltiplos agentes, sendo os vírus ou bactérias os mais recorrentes. Outra informação popular é que as crianças e idosos são os mais atingidos - sendo, inclusive, a principal causa de morte de crianças com menos de 5 anos.Os fungos e alguns produtos e substâncias, no entanto, também podem ser responsáveis pela condição que podem resultar em quadros de difícil diagnóstico. É o caso da auxiliar de logística Anna Karoline Santos Gomes, de 19 anos, que enfrentou um longo tratamento de um tipo incomum da doença: a pneumonia lipoídica, caso em que encontram-se substâncias oleosas no pulmão. A causa mais comum é a aspiração do óleo mineral, de óleos vegetais e animais presentes nos alimentos ou em medicamentos, que não conseguem ser eliminados pelo órgão.Antes de ser diagnosticada, a jovem enfrentou uma série de sintomas, internações e perdas na qualidade de vida. “Em setembro do ano passado, tive um quadro leve de Covid-19. Só perdi olfato e paladar”, lembra. Dois meses depois, aconteceu a primeira internação. “Passava muito mal. Não cheguei a ter falta de ar, mas vomitava muito e tinha febre. Fui internada em novembro com suspeita de Covid novamente, mas o teste deu negativo”, conta. Os pulmões estavam comprometidos em 60% quando iniciou o tratamento com antibióticos. “Me deram alta após eu apresentar melhora.”A partir daí, os sintomas pioraram: apresentava fraqueza, dores no corpo, cansaço e falta de ar. Em dezembro, Anna Karoline voltou a ser internada e uma investigação mais aprofundada foi iniciada pelos médicos. Dessa vez, ela foi para a UTI e precisou ser entubada. “Melhorava e ia para o quarto. Piorava e voltava para a UTI. Foi assim umas quatro vezes, até que fizeram uma biópsia e descobriram a pneumonia lipoídica”, diz. Ao mesmo tempo, ela também recebeu o diagnóstico de lúpus, que afeta outros órgãos. “Desde então, tem sido bem difícil. Fiquei com bastante sequelas e alterações pulmonares e faço uso de medicação constante para os sintomas do pulmão”, conta.Os tipos de pneumoniaO caso de Anna Karoline é de um tipo raro da doença, mas demonstra como a pneumonia pode ser ocasionada por múltiplos agentes. A infectologista Juliana Barreto explica que a pneumonia é dividida em quatro tipos: viral, bacteriana, fúngica e química. A viral é causada por algum vírus que se instala nos pulmões, podendo afetar a região dos alvéolos pulmonares. Entre os mais comuns estão influenza, parainfluenza, adenovírus e, agora, o coronavírus. "Já a pneumonia bacteriana, que é o tipo mais comum da doença, pode ser causada por bactérias inaladas ou presentes no próprio organismo, em locais como garganta, boca, nariz, sistema digestivo e pele. As bactérias que vivem no nosso sistema respiratório são os agentes mais frequentes das pneumonias bacterianas", pontua. As pneumonias químicas são ocasionadas pela inalação de substâncias agressivas ao pulmão. "Como agrotóxicos e fumaça, como a fumaça dos cigarros, cigarros eletrônicos e poluição, por exemplo", cita. Essas substâncias chegam aos pulmões causando a inflamação das vias aéreas. "Quero chamar bastante atenção para os cigarros eletrônicos aqui", frisa. A pneumonia fúngica é um tipo mais raro. "Ela tem um potencial bastante agressivo, ocorrendo com maior frequência em pessoas imunodeprimidas, como pacientes com doenças crônicas, oncológicos ou com HIV", comenta. Para todos os casos, é preciso que haja um desequilíbrio entre a capacidade de um hospedeiro se defender e do agente em atacar, como explica a pneumologista Eliane Consuelo. "Muitas vezes, esses agentes invadem, mas temos uma defesa rápida e a instalação dos mesmos nem acontece, o que causaria o quadro de infecção", diz. Se o hospedeiro tiver alguma incapacidade de se defender ou o agente infeccioso vem com uma maior potência para agir, a instalação no pulmão ocorre. "Essa invasão gera danos ao parênquima pulmonar e o nosso corpo tenta combatê-lo com o processo inflamatório. A depender dessa eficácia ou não é que teremos a evolução. Por isso, cada paciente pode evoluir de uma forma", explica.Pacientes nos extremos de idade, muito novos ou idosos, possuem capacidade de defesa mais comprometida e, por isso, maior suscetibilidade de desenvolver pneumonias mais graves. "Além dos pacientes imunossuprimidos e com algumas comorbidades, como diabetes e hipertensão, doenças autoimunes ou que utilizam medicações que baixam a imunidade, o que pode colaborar para os ataques mais potentes dos agentes infecciosos", diz.SintomasQuando a pneumonia se instala, os sintomas mais comuns são: tosse, febre, falta de ar e dor torácica. "Outros sintomas também podem surgir, como prostração, dor no corpo e sintomas semelhantes aos gripais, como coriza, dor de garganta", acrescenta Eliane. A confirmação se dá por meio de exames de imagens, seja radiografia de tórax ou tomografia. "As pneumonias bacterianas e virais podem ter distinções nesses exames de imagem, o que nos auxilia juntamente com os exames complementares como os laboratoriais a identificar qual seria o agente", explica.A partir daí é que os tratamentos poderão ser indicados. "Somente após a análise das evidências para identificar qual é o agente causador mais provável é que indicamos as medicações adequadas. Geralmente as pneumonias virais são tratadas com suporte clínico e ventilatório, porque são poucos os vírus em que temos antivirais específicos para eles", comenta. Nas pneumonias em que a suspeita é que seja de causa bacteriana, usa-se os antibióticos e nas fúngicas, os antifúngicos. "E, a partir do momento em que não há sucesso no tratamento, é que investigamos de forma mais aprofundada quais seriam as causas. Como estamos em uma pandemia, temos a triagem inicial para esse tipo específico", diz.Covid-19 e pneumoniaA essa altura da pandemia, já sabemos que a Covid-19 é uma doença infecciosa causada pelo coronavírus SARS-CoV-2. As pneumonias causadas por esse vírus tiveram uma maior visibilidade nesse período pela sua alta disseminação. "Essas pneumonias chamam atenção porque muitas pessoas tiveram ao mesmo tempo, visto que é um vírus novo e não tínhamos uma defesa preparada para ele. Já em relação aos outros vírus que circulam e algumas bactérias, a maioria das pessoas já tiveram contato com eles e, por isso, já possuem uma defesa preparada e não há uma disseminação tão rápida", explica a pneumologista Eliane Consuelo. Apesar de acometer muitas pessoas ao mesmo tempo, a capacidade de levar os pacientes a quadros moderados a graves é de cerca de 20%. "Isso não é algo que traria muita preocupação se ele não se espalhasse tão rápido, porque conseguiríamos cuidar bem desses 20%", aponta. Em relação a capacidade de danos, o SARS-CoV-2 tem similaridade com outros vírus, mas com algumas peculiaridades. "Se destacam a capacidade de gerar danos vasculares e eventos trombóticos mais comuns, trazendo um diferencial no tratamento, que é a necessidade do uso de anticoagulantes em pacientes com pneumonias e oxigenação mais baixa", comenta. Mesmo sendo uma infecção viral, estudos apontam um alto índice de prescrição de antibióticos para pacientes com Covid-19 - mesmo que o número de pessoas que tiveram infecção secundária ou coinfecção bacteriana seja bem inferior. A prescrição inadequada e excessiva e o uso indevido desses medicamentos se tornou um motivo de preocupação e alerta. "Há estudos que indicam cerca de 4% de casos de pacientes com coinfecção de Covid-19 e bacteriana. O uso indevido de antibióticos colabora para que haja a seleção de microrganismos mais resistentes e potentes, que podem trazer danos populacionais. Uma pneumonia viral não se trata com antibiótico", diz Eliane."No ano passado, a Organização Mundial de Saúde publicou que essa resistência microbiana é uma das dez principais ameaças de saúde pública que a humanidade enfrenta", alerta o pediatra Ricardo Ferreira. "O uso indiscriminado de antibiótico, sem indicação precisa e utilização adequada (dose/intervalo/tempo de tratamento), pode levar os microorganismos a desenvolver resistência a esses medicamentos. Nesse cenário, temos tratamentos de doenças infecciosas como broncopneumonias que são habitualmente tratadas em domicílio com antibióticos via oral e que, com a progressão da resistência, não terão mais ação, havendo a necessidade de hospitalização para tratamento intravenoso", explica.Vacinação como aliada O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza a vacina pneumocócica-13 para pacientes de alto risco, como crianças de até cinco anos de idade, portadores de HIV/Aids, pacientes oncológicos e transplantados. A vacinação protege contra doenças pneumocócicas, causadas pela bactéria conhecida como pneumococo e que é uma das principais causas de mortalidade em todo mundo. A bactéria é responsável por 60% dos casos de pneumonia. "A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda preferencialmente um esquema de três doses, com um reforço entre os 12 e 15 meses", explica o infectologista Emersom Mesquita. As vacinas contra a gripe, que possuem campanha anual, também são aliadas da prevenção das pneumonias de causa viral. "Além da proteção contra o pneumococo, principal bactéria causadora da pneumonia, é preciso lembrar a importância da vacinação como um todo, incluindo a de outras bactérias como o Haemophilus influenzae B, e de vírus como o influenza, COVID-19 e sarampo, para citar alguns exemplos", diz.