O que se vê no documentário O Golpista do Tinder são três mulheres bonitas, jovens e bem-sucedidas. Como elas puderam cair na lábia de um golpistas e repassar altas quantias em dinheiro? Especialistas em relacionamentos virtuais, a psicóloga Máris Eliana e a jornalista Dalvina Nogueira, têm acompanhado de perto os desdobramentos do documentário. Para as autoras do livro “Amor - Do Virtual Para o Real”, a resposta para a pergunta está no ideal do príncipe encantado. “É algo que está dentro da mulher moderna. Não há como negar. Mas precisamos fugir disso”, diz Dalvina.Máris chama a atenção para a sedução feita de forma arrebatadora. ”É o chamado Don Juan. Quando ele encontra terreno fértil, fala aquilo que a pessoa quer ouvir. Tem milhares e milhares de mulheres, assim como homens, vulneráveis e desejosas de ter um amor arrebatador. E quando acredita que encontra a pessoa ideal, abre as portas do coração para o príncipe entrar”, explica a psicóloga.Outro diferencial de Simon Leviev destacado por ela é o fato de que ele tinha subsídios para bancar a farsa, além de ter sido um golpista paciente, que esperava vários meses pagando flores, jantares e viagens. “Ele construía uma história e quando a vítima estava completamente envolvida começava a extorsão. Como ele já havia dado muito, a pessoa se sentia na obrigação de retribuir.”A psicóloga diz ainda que, quando uma pessoa se apaixona, ela desarma. “Ninguém consegue ficar vários meses na defensiva em relação ao outro”, afirma.Na internet, é grande o número de comentários que classificam as vítimas do golpista do Tinder como interesseiras. O ato é visto por Dalvina como uma culpabilização da vítima. “É muito simples depois que você vê a conclusão da história dizer ‘eu não cairia’, ‘ela foi interesseira’. Porém, a forma como foi feita a teia em volta delas era impossível de não acreditar. Se ele não tivesse dado sinais de que teria condições de pagar o empréstimo, elas não teriam caído”, diz. A jornalista propõe uma reflexão: “Quantas mulheres não fariam isso para ajudar o homem por quem está apaixonada e que sintetiza todos os seus sonhos e desejos?”No livro, Dalvina e Máris relatam e analisam histórias fortes e tristes de vítimas de golpes, com dicas de como escapar deles. Mas também apresentam casos de finais felizes. Elas mesmas conheceram os respectivos companheiros em aplicativos de relacionamentos. “A culpa não é do Tinder. O golpista pode estar em qualquer lugar. O importante é conhecer o perfil para poder se proteger”, diz a psicóloga.“Eu estava apaixonada por uma ilusão”, diz goiana vítima de golpeHá cinco anos, Rebeca não imaginava que um despretensioso incentivo de amigas para buscar um namorado online a tornaria vítima de um golpe. Ao criar um perfil no POF, um site de namoro, a professora aposentada (com o nome fictício para preservar sua identidade), de 61 anos na época, pensou ter encontrado o homem perfeito. Estrangeiro, viúvo e engenheiro da Petrobrás. Mas, acima de tudo, alguém que se interessava por ela. Em entrevista ao O POPULAR, a pedagoga aposentada conta como acabou se tornando vítima de um estelionatário que recorreu a um perfil fake para extorqui-la. A história de Rebeca também é relatada no livro da jornalista Dalvina Nogueira e da psicóloga, Máris Eliana, “Amor – Do Virtual Para o Real”. O canadense, de 50 anos, procurou Rebeca pela primeira vez em 2016 no site, sob o nome de Fred. Disse estar bastante interessado e disposto a conhecê-la melhor. Assim começaram as trocas de mensagens e fotos – sobretudo, fotos dele–. “Sabe quando você está carente e começa a imaginar uma pessoa e a gostar dela?”, pergunta a professora. Esse foi o início da ilusão de um relacionamento que se estendeu por mais de um ano. Nunca tendo se casado, Rebeca procurou preencher com as palavras carinhosas do bonito e elegante homem com visual canadense a carência que, uma hora ou outra, chega a todos. “Ele falava que estava gostando muito de mim, que estava me amando”, confessa. Após meses de conversa por mensagens e telefonemas, Fred anunciou que viria a São Paulo para uma reunião, e antes de voltar ao Canadá, gostaria de vir a Goiânia para conhecer a família de Rebeca e pedi-la em casamento. Após o casamento, o plano seria que a pedagoga morasse com ele no exterior. Em janeiro de 2017, o engenheiro avisa ter desembarcado na capital e que ficaria um tempo hospedado na cidade em um hotel que, para Rebeca na época, não parecia ser apropriado para uma reunião de negócios estrangeiros. Algumas horas depois, ele a liga: seus documentos tinham sido roubados, e precisava de dinheiro para conseguir comprar uma passagem área para Goiânia. Tudo pareceu muito estranho para a professora aposentada. Ela desconfiou que um engenheiro canadense, funcionário da Petrobrás, não teria dinheiro para comprar uma passagem, ou não recorreria à embaixada canadense para reaver sua documentação. Rebeca, então, resistiu aos pedidos do Fred e se negou a enviar qualquer quantia. Contudo, os pedidos não cessaram, e a resistência da mulher começou a ser usada pelo homem como chantagem emocional, uma prova de que ela não o amava. Fred enviou a conta bancária de uma pessoa, um amigo, e continuou pressionando a professora até ela depositar R$ 500 na conta. “Eu estava boba mesmo, eu estava apaixonada por uma pessoa que não conhecia”, justifica. No dia seguinte, ao ser questionado sobre a compra da passagem, o homem deu algum as desculpas sobre não ter sido capaz de comprá-la e pediu mais mil reais. Dessa vez a professora foi categórica com sua posição: não enviaria mais nada. Alguns dias mais tarde, sem conseguir mais nenhum depósito da professora, Fred avisa que voltaria ao Canadá. O prejuízo financeiro foi pequeno, mas o emocional, foi um verdadeiro rombo.