“Eu estava no meio do programa Popstar. Comecei a mancar e as pessoas falavam para mim: ‘Por que você está mancando, Renata?’. E eu falava: ‘Eu não estou mancando’. Eu não percebia que eu estava mancando”, relatou a jornalista e apresentadora Renata Capucci, sobre os primeiros sinais da doença de Parkinson no podcast Isso é Fantástico, que foi ao ar no domingo (26). Essa foi a primeira vez que ela revelou publicamente que é diagnosticada com a doença desde 2018, quando tinha 45 anos.Apesar de ser a segunda doença neurodegenerativa mais comum no mundo, ficando atrás apenas do mal de Alzheimer, o Parkinson ainda é cercado de estigmas e desinformações. “Chegou a minha vez de me libertar. Porque viver com esse segredo é ruim, você se sente vivendo uma vida fake”, desabafou ela, emocionada. “Não quero virar mártir nem que tenham pena de mim - pelo contrário, tenho orgulho da minha trajetória e de como encaro essa doença”, afirmou a apresentadora.A doença de Parkinson é uma doença neurológica, marcada pela degeneração progressiva dos neurônios responsáveis pela produção de dopamina. “A origem do Parkinson está na perda de neurônios em um núcleo bem específico do cérebro chamado de substância negra, região onde os neurônios possuem um pigmento de cor muito escura, a neuromelanina”, explica o neurocirurgião e pesquisador Marcelo Valadares. “Os movimentos são afetados porque a dopamina, que ativa uma área do cérebro conhecida como corpo estriado, é uma das portas de entrada de um dos principais centros reguladores dos movimentos do corpo”, diz.Leia também:- Cientistas falam em uma nova onda da Covid-19 a cada 6 meses- Varíola dos macacos: veja o que já se sabe sobre a doençaQuando começou a apresentar os primeiros sinais, a apresentadora fez fisioterapia e osteopatia, mas o cenário não mudou. “Em dado momento, eu estava em casa e o meu braço subiu sozinho, enrijecido. O meu marido, que é médico, me levou para um hospital que tinha emergência neurológica e fui diagnosticada com Parkinson. Aquilo caiu como uma bigorna na minha cabeça”, contou.A doença é caracterizada principalmente pelos tremores nas extremidades, instabilidade postural, rigidez de articulações e lentidão nos movimentos. No entanto, o neurologista Marco Túlio Araújo Pedatella explica que o Parkinson pode ser dividido em três estágios: pré-clínico, pré-motor e motor. “O pré-clínico consiste na fase em ocorrem as alterações estruturais da doença, mas sem manifestar os sintomas, podendo se iniciar de 15 a 20 anos antes do aparecimento dos sintomas”, aponta.Os sintomas pré-motores consistem em diminuição do olfato, depressão, distúrbios do sono, constipação intestinal, dermatite seborreica (popularmente conhecida como caspa) e dificuldade para engolir. “Já a fase motora é a de diagnóstico da doença com sintomas importantes, como lentidão para realizar atividades do dia a dia (bradicinesia), além do tremor de repouso e rigidez”, diz.Grande parte do motivo de o paciente carregar estigmas está no fato da doença não ter cura. “O tratamento, hoje, apenas atenua os sintomas. Com o tempo, a doença vai progredir”, comenta. O uso de medicamentos adequados pode melhorar sintomas como o tremor involuntário e a rigidez corporal. “E, em alguns casos, a cirurgia melhora muito a qualidade de vida dos pacientes, devolvendo a independência deles”, aponta.“Uma das maiores esperanças da medicina é o aprimoramento da cirurgia intitulada DBS (do inglês, deep brain stimulation), que consiste na implantação cirúrgica de um dispositivo neuroestimulador, semelhante a um marca-passo cardíaco, auxiliando no controle dos principais sintomas da doença”, ressalta Marcelo Valadares. “Ela não é ainda a primeira linha de tratamento possível, mas é uma das melhores alternativas nos casos em que se apresenta resistência às medicações, e pode reduzir os tremores em até 80%, além da rigidez e outros sintomas”.O acompanhamento multidisciplinar também é destacado por Marco Túlio. “A reabilitação com fisioterapia, terapia ocupacional e fonoaudiologia fazem parte do tratamento da doença e devem ser conciliados com as medicações”, explica. Profissionais da nutrição, odontologia e musicoterapia também podem auxiliar. A atividade física é outra parte importante do tratamento. “E deve ser mantida durante todo o tempo, principalmente atividades que melhoram o equilíbrio do paciente como o tai chi e a dança, por exemplo.”As muitas dúvidas, os mitos e a falta de informações disponíveis sobre a doença também aumentam o estigma e constrangimento que muitos dos pacientes enfrentam no dia a dia. Quando Therezinha de Melo Santos, de 69 anos, recebeu o diagnóstico, em 2016, logo foi em busca de um local em Goiânia que pudesse dar as primeiras orientações. “Fiquei procurando algum lugar que pudesse dar informações mais precisas além do que a internet nos oferece, que nem sempre será o que é cientificamente comprovado”, conta.Sem sucesso, conheceu uma associação de Brasília que a inspirou a fundar no ano seguinte, junto do marido e de outras pessoas que conheceu pelo caminho, a Associação Parkinson Goiás (Aspark-GO), que ela preside. “Hoje somos em torno de 110 pessoas, entre parkinsonianos, familiares e cuidadores”, conta. A associação sem fins lucrativos tem como finalidade divulgar informações, orientar e acolher pacientes. “Nesse primeiro momento, o acolhimento está entre os melhores remédios”, diz.Idade e causasUm relatório divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em junho de 2022 faz o alerta: a prevalência da doença de Parkinson dobrou nos últimos 25 anos, com estimativas de 2019 mostrando que cerca de 8,5 milhões de indivíduos vivem com a doença no mundo. O relatório aponta ainda que as mortes e impactos na saúde como consequência do Parkinson estão aumentando de forma mais rápida que qualquer outro distúrbio neurológico. No Brasil, estima-se que 200 mil pessoas vivem com o distúrbio.O Parkinson é mais incidente em pessoas com mais de 60 anos, mas estima-se que em cerca de 10% dos pacientes a doença se manifeste antes dos 50 anos, como no caso de Renata Capucci. “A doença de Parkinson pode acometer jovens, que chamamos de parkinsonismo juvenil, mas é bem menos comum. Em adultos jovens, se trata da doença de Parkinson de início precoce”, explica o neurologista Marco Túlio Araújo Pedatella. “Nessas idades, é preciso investigar a possibilidade do parkinsonismo ser causado por fatores como medicamentos, tumores no cérebro, AVC e outras doenças, como paralisia supranuclear progressiva, atrofia de múltiplos sistemas, doença de Wilson, entre outros”, aponta.As causas do Parkinson também não foram totalmente descobertas pela ciência. “Mas sabe-se de vários fatores que influenciam e podem ocasionar a doença. São desde causas genéticas até fatores ambientais”, diz. “Dentre os fatores genéticos, existem genes já identificados como causadores. Além disso, exposição a algumas substâncias como MPTP (presente em pesticidas), diabetes e fatores como idade e gênero (a maior incidência está em indivíduos do sexo masculino) estão entre as possíveis causas.”