História, cultura e natureza. Essas são as características que fazem de Pirenópolis um tesouro dos goianos, compartilhado com Brasília e apreciado por visitantes de várias partes do País. É justamente nesse tripé que a cidade se apoia para buscar o reconheciomento da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) e se tornar o segundo sítio misto do Brasil na lista de Patrimônio da Humanidade, seguindo o modelo trilhado por Paraty, no Rio de Janeiro, a primeira localidade a conseguir o feito.Sortudo é quem sobe a escadaria da Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário e tira um minuto para contemplar a paisagem. Dali se tem uma vista privilegiada do Centro Histórico de Pirenópolis, repleto de janelões coloniais em ruas de pedra que remontam os seus 294 anos de história. Vista que dá fôlego aos pirenopolinos que pleiteiam o reconhecimento internacional.Em uma articulação entre passado e presente, a prefeiturada cidade e a comunidade organizada contam com um conjunto arquitetônico e paisagístico já reconhecido nacionalmente pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Urbanístico Nacional (Iphan) como Patrimônio Histórico e Cultural; com a Festa do Divino, que tem o título de Patrimônio Imaterial nacional; e o Parque dos Pireneus, um santuário do Cerrado preservado com rica fauna, flora e cortado por dezenas de cachoeiras.O reconhecimento é desejo antigo dos moradores, segundo o secretário de cultura de Pirenópolis, Ronaldo Felix. Com a conquista do título de Patrimônio Mundial da cidade de Goiás, há 20 anos, essa vontade teria sido impulsionada, mas ainda permanecia no âmbito dos comentários entre os moradores. “Há muito tempo se fala sobre isso no município. Ouvindo a população, principalmente aqueles que integram grupos que se dedicam ao patrimônio e cultura de Pirenópolis, a prefeitura tomou a iniciativa de buscar esse reconhecimento”, diz o secretário.Ronaldo explica que estão no momento em uma fase de pré-campanha, dando os primeiros passos para conseguir oficializar a candidatura. A movimentação acontece às vésperas do aniversário de 32 anos do título de Patrimônio Nacional dado pelo Iphan à cidade em reconhecimento ao seu patrimônio arquitetônico. O tombamento foi feito em 10 de janeiro de 1990.É o Iphan o instituto responsável por coordenar os processos de reconhecimento do Patrimônio Cultural do Brasil em âmbito internacional e apresentar as candidaturas a Patrimônio Mundial à Unesco. “O Iphan já sinalizou positivamente sobre a candidatura, assim como o governo do Estado. Também tivemos uma reunião com a Unesco, em Brasília, para entender mais sobre os passos que serão necessários”, aponta Ronaldo.“O Iphan tem grande interesse neste título internacional para o conjunto de Pirenópolis e vai participar diretamente com as orientações técnicas necessárias para o pleito”, comenta o superintendente do Iphan Goiás, Allyson Cabral. “Neste primeiro momento, o Iphan aguarda a formalização por parte da Prefeitura de Pirenópolis sobre o pleito do título internacional para a cidade, com o envio da documentação contendo um histórico em formato de dossiê e informações sobre o bem a ser reconhecido, estabelecimento de equipe, participação da comunidade local e de outros interessados”, pontua.O secretário de Cultura conta que a equipe do município participou, ainda, do 8º Encontro Brasileiro das Cidades Históricas e Patrimônio Mundial, realizado no mês de dezembro do ano passado em São Luís, no Maranhão, como parte das pesquisas e articulações para a elaboração do dossiê. “Lá estivemos integrados às cidades que já são Patrimônio Mundial, dialogando e entendendo sobre como acontece esse processo”, diz.História e culturaAgora que as primeiras tratativas foram feitas, o próximo passo é formalizar o pedido de candidatura e iniciar o levantamento da importância da memória material e imaterial de Pirenópolis. “Pretendemos nos inscrever como patrimônio misto. Temos áreas como o Parque dos Pireneus, uma reserva de Cerrado preservado; temos o conjunto arquitetônico da cidade, já reconhecido nacionalmente, e temos as tradições culturais pirenopolinas, como a Festa do Divino, por exemplo, que justificam a ideia”, comenta Ronaldo.A Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis tem as tradicionais Cavalhadas como parte da programação. A encenação das históricas batalhas medievais entre mouros e cristãos mobiliza a cidade desde 1820 e é uma das festas mais conhecidas de Goiás. “Eu participo das Cavalhadas desde menino, mas faço parte do grupo há 20 anos”, conta Aristófanes Pompeu de Pina, de 54 anos. O nome familiar de Aristófanes não é coincidência: ele é filho do advogado Pompeu Cristóvão de Pina, figura emblemática da cidade de Pirenópolis, grande defensor das atividades culturais da cidade e que dirigiu por muitos anos as Cavalhadas. “Conquistar o reconhecimento mundial com certeza vai ser muito benéfico para a cidade”, aponta.Além do reconhecimento em si, que já é uma conquista importante, o secretário de cultura explica que o título poderá trazer outros benefícios para a cidade. “Além de divulgar a conservação da história do Brasil Colônia por parte de Pirenópolis através de sua arquitetura, paisagem, meio ambiente e tradições, nós vemos esse reconhecimento como mais uma ferramenta de preservação desse sítio histórico”, explica. “Com o título, aumenta-se a responsabilidade. Mas vamos conseguir participar de políticas públicas e editais de projetos que contemplam patrimônios mundiais”, pontua.PirenopolinosA participação da comunidade na campanha de obtenção do título é fundamental, segundo Ronaldo. "Aqui em Pirenópolis, esse desejo é muito antigo. Estamos muito firmes com essa campanha também por ser uma ferramenta de educação histórica e patrimonial, perpetuando essa memória e ensinando a importância da preservação material e imaterial", comenta Ronaldo Felix. Telma Lopes Machado, de 72 anos, acredita que o reconhecimento como Patrimônio Mundial viria em boa hora. "Antes que seja tarde", comenta.Telma é proprietária da histórica Fazenda Babilônia, propriedade rural secular e emblemática do período do Brasil colônia. A área integra o conjunto tombado pelo Iphan como Patrimônio Nacional, se destacando pela preservação de sua estrutura. O imenso casarão em padrão de arquitetura colonial paulista é sustentado por vigas de madeira e esteios, com paredes de adobe e pau-a-pique e rodeado de muros de pedras. A fazenda pertencia ao seu bisavô, Joaquim Alves de Oliveira, que adquiriu a propriedade em 1864."Pirenópolis está conservada, arrumadinha, mas a cidade está crescendo muito. Estão vindo construções exageradas, resorts, a especulação imobiliária é imensa. Nós, pirenopolinos, não queremos isso, e o tombamento pode ajudar a frear o que está acontecendo, com leis e proibições para a cidade não perder sua essência", comenta. Telma realiza na Fazenda Babilônia um trabalho que define como turismo histórico-cultural. "As pessoas vêm aqui para conhecer um pouco da história de Goiás, coisa que a gente não estuda e não conhece. Faço também um resgate da gastronomia, afinal, não tem como separar comida da nossa história", diz.Relíquias e belezasPirenópolis encanta seus visitantes e é defendida por seus moradores. Conhecida por suas belezas naturais, como as majestosas cachoeiras, pela agitação cultural, opções de gastronomia e aura bucólica, a cidade já é patrimônio indiscutível de Goiás. Sua história escreve parte importante de um Brasil de outros tempos, colonizado por portugueses e que teve bandeirantes como desbravadores.Seu primeiro nome foi Minas de Nossa Senhora do Rosário de Meia Ponte, com fundação em 1727. No local, surgiu a imprensa goiana com o jornal Matutina Meiapontense. As Pastorinhas, Os Mascarados, Festa do Divino Pai Eterno. Entre as iniciativas contemporâneas, a cidade recebe há 20 edições o festival Canto da Primavera e há 11 a Festa Literária de Pirenópolis, a Flipiri. Pirenópolis respira história e vive cultura.Conquista do títuloA pedido do POPULAR, o Iphan explicou, em nota, como se dá o processo de reconhecimento de Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade pela Unesco. "O Iphan é responsável por coordenar os processos de reconhecimento do Patrimônio Cultural do Brasil em âmbito internacional. Ao Iphan compete, junto do Ministério das Relações Exteriores (MRE), apresentar as candidaturas de bens brasileiros a Patrimônio Mundial, título conferido pela Unesco.Desse modo, qualquer candidatura dessa natureza deve tramitar no Iphan/MTur e MRE antes de chegar à Unesco por vias formais", diz um trecho. "Neste primeiro momento, o Iphan aguarda a formalização por parte da Prefeitura de Pirenópolis sobre o pleito do título internacional para a cidade com o envio da documentação. O documento de candidatura, juntamente com a avaliação dos órgãos consultivos, é a principal fonte na qual o Comitê do Patrimônio Mundial se baseia para avaliar a inscrição de bens na Lista do Patrimônio Mundial".