O Ministério da Justiça determinou nesta quarta que o filme "Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola" tenha sua classificação indicativa aumentada de 14 para 18 anos, um dia depois de censurar a obra, decidindo que sua exibição seja suspensa das plataformas de streaming, sob pena de multa diária de R$ 50 mil para os exibidores.A comédia está no centro de uma polêmica após ser acusada de pedófila pelo secretário especial da Cultura, Mario Frias, e outros expoentes bolsonaristas, mas seu futuro agora parece incerto, dado que ambas as medidas do ministério seguem válidas, de acordo com um texto publicado no site da pasta.A classificação indicativa original da obra foi dada pela pasta em 2017, quando o filme, que chegou ao streaming há poucas semanas, foi lançado nos cinemas. O ajuste dos símbolos indicando a nova faixa etária deve ser cumprido em até cinco dias corridos.Segundo o ministério publicou em sua página no Twitter, a classificação foi revista para cima porque o filme "apresenta conteúdo com tendências de coação sexual, ato de pedofilia, e situação sexual complexa". Quem assinou a medida foi José Vicente Santini, secretário nacional de Justiça e amigo dos filhos do presidente Bolsonaro.Leia tambémMinistério da Justiça determina suspensão de filme com Danilo Gentili e Fábio PorchatDanilo Gentili é condenado a pagar R$ 7.000 a filiada do PSL por briga na webAdvogados consultados pela reportagem afirmam que as plataformas de streaming são obrigadas a seguir a determinação e mudar a classificação. Caso não queiram, devem contestar a medida na Justiça, já que é uma prerrogativa do governo alterar a idade sugerida para um filme ou obra audiovisual, expediente utilizado com certa frequência.O entendimento entre os advogados é de que a decisão desta quarta passa a valer sobre a de terça (15), que pedia a suspensão da exibição do longa, medida considerada ilegal pela comunidade jurídica, dado que a administração pública não pode censurar uma obra de arte, determinando sua exclusão dos canais de distribuição."O governo viu que tinha feito uma bobagem enorme e voltou atrás. É tudo muito avacalhado, é tão bizarro", afirma Daniel Sarmento, professor de direito constitucional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a UERJ.Vale mencionar, contudo, que não há uma revogação expressa da ordem de suspensão de exibição de "Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola". A reportagem procurou o ministério da Justiça questionando se esta medida segue válida diante da publicação da nova ordem, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem.O longa tem uma cena com o ator Fábio Porchat em que seu personagem pede para dois garotos que o masturbem. Esta sequência foi o estopim da polêmica nas redes sociais envolvendo a obra, baseada num livro do comediante Danilo Gentili.O filme pode ser visto em diversos serviços de streaming. Netflix, Apple TV+, Globoplay e Telecine ajustaram a faixa etária para 18 anos. O YouTube não quis comentar. A reportagem contatou também o Google Play, questionando se adotará a nova idade ou se recorerrá da medida, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem.O professor da UERJ acrescenta que o que muda com a nova medida é que agora as plataformas terão de indicar na tela que o filme é recomendável para 18 anos ou mais, mas só. De acordo com o Supremo Tribunal Federal, ele diz, a finalidade da classificação indicativa é informar os pais ou responsáveis sobre o conteúdo de uma obra, para avaliarem se é adequada ao consumo de crianças e adolescentes sob sua responsabilidade. "Classificação indicativa é diferente de censura", afirma.A portaria mais recente do Ministério da Justiça e Segurança Pública sobre classificação indicativa foi publicada em novembro do ano passado e entrou em vigor em janeiro. Em linhas gerais, as produtoras fazem uma autoclassificação das obras, baseadas num guia disponível no site do ministério, e então submetem o pedido para a pasta, que pode aprovar ou mudar.Dividida em seis faixas -livre, 10, 12, 14, 16 e 18 anos-, a classificação passa a valer a partir de sua publicação no Diário Oficial da União, e é baseada na presença de sexo, violência, nudez e drogas nas obras. Qualquer pessoa pode questionar a classificação e pedir sua revisão pelo ministério. Por exemplo, a novela "Maira do Bairro", exibida pela Globoplay, teve a faixa etária indicativa alterada de 10 para 14 anos, em fevereiro deste ano, após a reclamação de um cidadão.De acordo com o guia mais recente do governo, "Como Se Tornar o Pior Aluno da Escola" poderia se encaixar em duas faixas, de 14 ou 16 anos. A de 14 trata de exploração sexual, afirmando que cenas com "inducao ou atracao de alguem a prostituicao ou outra forma de exploracao sexual, como facilita-la, impedir ou dificultar que alguem a abandone" não são recomendadas para menores desta idade. Já a de 16 anos menciona explicitamente pedofilia, onde se enquadram quaisquer atos libidinosos envolvendo crianças e adolescentes nesta faixa etária, mesmo que não haja consumação sexual.Cris Olivieri, advogada consultora para arte e cultura, lembra que há certa subjetividade na determinação da faixa etária. Ela chama de "censura velada" a mudança de classificação do filme com Porchat, "uma vez que a cena não justifica o aumento para 18 anos". Lembra ainda que a polêmica está sendo feita sobre uma cena numa obra ficcional, não um crime.