Macabra, sem graça, de mau gosto. Outros descrevem o trabalho como genial e uma linda homenagem às vítimas da pandemia e aos profissionais de saúde. Essas são algumas reações do público nas redes sociais à nova exposição do artista plástico Siron Franco em São Paulo. Renascimento, que fica em cartaz até 20 de março no museu Casa das Rosas, é uma instalação com 365 manequins, entre homens e mulheres, de variados tamanhos, com trajes coloridos e com os rostos cobertos por capuzes. Siron diz não ligar para os comentários. “Não dá para querer que todo mundo entenda de arte. Nem na Grécia era assim. Eu não me preocupo se vão entender ou não, eu vou lá e faço”, comenta o artista. Ao POPULAR, o artista falou da repercussão da obra, como foi o processo de criação e o futuro da instalação. Confira.Siron, e a ideia do capuz nos manequis surgiu desde o primeiro instante na criação da instalação? Apareceu bem depois porque ninguém dava nome às vítimas da Covid, a não ser quando era alguma personalidade. Eu não queria aquela cabeça do manequim porque achei que não ia funcionar e veio a ideia. O artista é o primeiro espectador da obra e o primeiro crítico também, e sou ferrenho com o meu trabalho. Quando tenho dúvida, vou lá e desmancho. Do inusitado sempre sai algo melhor. O capuz evoca morte, sequestro e, sobretudo, essa questão do negacionismo. O capuz também cria uma indagação, afinal a arte faz perguntas, ela não é um infográfico que explica tudo mastigadinho. A linguagem tem que ser mais interessante que o assunto. A criação, no meu caso, é caótica, ela vai e volta.Renascimento é uma obra muito impactante. Como foi a recepção do público em São Paulo?Foi muito interessante e continua sendo. Agora mesmo recebi uma ligação de uma jornalista falando que não se fala em outra coisa em São Paulo. Mas, no começo, teve algumas pessoas que não gostaram, falaram que era algo de ‘mau gosto’, ‘que era um horror’ e como ‘é que eu faço isso com as pessoas que morreram’. No entanto, o próprio público começou a defender a obra dessas pessoas. Muita gente falava que os vestidos estavam lindos. Depois disso, o pessoal começou a compreender mais e parou com os comentários negativos. É um direito da pessoa não gostar do trabalho.Como você lida com as críticas? De forma natural. O “eu gosto” e o “eu não gosto” é de cada um. Não dá para querer que todo mundo entenda de arte. Nem na Grécia era assim. Eu não preocupo se vão entender ou não, eu vou lá e faço. No início da minha carreira nem a minha mãe colocaria um quadro meu na parede dela porque todo mundo falava que era muito agressivo. Eu não tenho redes sociais porque não estou interessado em vender, vendo o que preciso para poder viver. Também não tenho tempo para ficar respondendo todo mundo. A minha obra sempre foi divulgada pelos meus marchands. Acho que quem tem que mostrar o meu trabalho são os outros e não eu. Não gosto de ficar falando de mim. Até tentaram fazer um perfil, mas não deu certo porque eu não quero ficar tendo que postar algo todo dia. Eu acho estranho e não sinto necessidade disso. Não tenho essa vocação.A instalação é uma homenagem aos médicos e vítimas da Covid?Não é um tributo explícito, mas é uma homenagem para todos que morreram, inclusive os médicos que estão na frente da batalha e ganhando muito mal. Estou chamando atenção para eles, em agradecimento ao trabalho deles. A instalação é uma celebração que as pessoas estão juntas nessa montagem, coisa que não podemos fazer ainda hoje. Nunca ouvi falar de uma obra de arte que todos aplaudem. Acho que até o xingamento faz parte da comunicação. Não sou um artista narcisista, embora possa parecer. Tenho 74 anos, trabalho todos os dias e dedico minha vida à arte e ainda vou querer que as pessoas gostem? Elas podem detestar. É como uma música apenas instrumental em que muita gente quer saber o que quer dizer. A obra Renascimento tem vários aspectos. Primeiro, o frontal, no qual você vê o capuz, e depois quando você passa embaixo ela fica flutuando, tanto que chamava Ressureição, porque eu via os manequins de dia e de noite bailando de acordo com o vento.Depois de São Paulo, a instalação já tem outras agendas?Já tem vários lugares que manifestaram interesse em levar a mostra porque se trata de um assunto mundial. Ela fica aberta para visitação em São Paulo até 20 de março. A Fundação Marcos Amaro, em Itu (SP), quer levar também. Tenho convites para fora, mas ainda não existe nenhuma negociação. Em Goiânia, ainda não tem nada e sempre que penso em fazer algo aqui acho mais complicado. Quando comecei a fazer a obra e havia apenas 15 figuras penduradas, mandei uma foto para o Marcos Mendonça, diretor do Museu da Imagem e do Som, ele mostrou interesse e um ano e meio depois liguei para ele falando que estava pronto e ele programou tudo. Adoro Goiânia, quando me tornei conhecido não saí da cidade, acho que é importante ter bons artistas morando na cidade, mas acho mais fácil me apresentar fora, porque quando falo que estou fazendo alguma coisa aparecem dez pessoas querendo receber o meu trabalho.Siron, você tem várias obras que foram destruídas por vândalos no Brasil. Como você faz para acompanhar esses trabalhos? Você tem notícias do estado da instalação na Praça Cívica?Não tenho porque quase não estou saindo. Saí para vacinar e para ir para São Paulo. Mas se você lembrar, na minha vida, eu pedi socorro para o poder público várias vezes, eu comprei 20 mil metros de arame porque as pessoas estavam entrando e arrebentando as pedras do Monumento às Nações Indígenas, em Aparecida de Goiânia, que hoje não existe mais. Na Bahia, que eram 458 figuras em alumínio rupestre, roubaram tudo para poder vender. Aqui trataram como se fosse algo de macumba e fizeram a maior confusão. É preciso de uma força tarefa para cuidar. Eu dei de presente para a cidade e ela fica com a função de preservar.Confira o vídeo da instalação Ver esta publicação no Instagram Uma publicação partilhada por O Popular (@jornal_opopular)-Imagem (Image_1.2388341)