Nas palavras de abertura de seu encontro privado com o presidente russo, Vladimir Putin, Jair Bolsonaro afirmou que "somos solidários à Rússia".Ele não disse solidário em relação a quê, mas o seu anfitrião está no centro de uma das maiores crises de segurança no mundo desde o fim da Guerra Fria, a tensão com a Ucrânia e o Ocidente, que acusa Moscou de ameaçar invadir o país vizinho.As palavras televisionadas foram, como de praxe, econômicas de lado a lado. O russo afirmou esperar um "encontro produtivo", enquanto o brasileiro enumerou as áreas de cooperação em negociações nas reuniões paralelas ao encontro: defesa, energia e agricultura."Queremos colaborar em muitas áreas", disse Bolsonaro, que agradeceu Putin por ter concedido indulto no ano passado a um motorista brasileiro que estava preso na Rússia acusado de entrar no país com uma substância ilegal.A demonstração de "solidariedade" de Putin será lida como apoio nos meios diplomáticos ocidentais, apesar de o Itamaraty sustentar que o Brasil manterá sua linha de independência e defesa de soluções pacíficas de conflitos no mundo todo.Essa tradição havia sido rompida nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro, com a gestão agressiva do expoente da ala ideológica do bolsonarismo Ernesto Araújo. Ele defendia uma aliança carnal com os EUA contra o que chamava de globalismo, caiu em março de 2021 e hoje está licenciado da diplomacia.Antes da viagem de Bolsonaro, os EUA fizeram gestões para primeiro impedir a visita e, depois, para que ele levasse palavras duras a Putin sobre a condução da crise -o que evidentemente não irá acontecer.Hoje o Brasil tem o status de aliado preferencial extra-Otan dos EUA, uma condição que lhe dá acesso a parcerias privilegiadas com o mercado de defesa norte-americano. Ambos os países assinaram um acordo militar inédito em 2020, mas até agora ele não rendeu frutos.Em reunião anterior ao encontro dos líderes, o chanceler russo, Serguei Lavrov, fez críticas aos Estados Unidos e à Otan (aliança militar ocidental) na crise. Ele havia se reunido com seu homólogo brasileiro, Carlos França, e os ministros da Defesa Serguei Choigu e Walter Braga Netto.EUA mencionam esperar reforço de mensagens a PutinO governo dos Estados Unidos disse ter esperança de que o presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL) tenha usado sua reunião com o presidente russo Vladimir Putin para “reforçar os valores da ordem internacional” que compartilham com os EUA.Os dois líderes se encontraram nesta quarta-feira (16), em Moscou, em meio à crise envolvendo a Ucrânia, que opõe os russos ao Ocidente. Antes de um almoço, de uma reunião fechada e de pronunciamentos curtos, Bolsonaro se disse “solidário à Rússia” nas palavras de abertura do encontro -sem especificar a que aspecto manifestava solidariedade.“Temos a responsabilidade de nos posicionarmos pelos valores que compartilhamos. E o centro desses valores são os princípios da ordem internacional. Ordem que, por mais de sete décadas, fomentou níveis sem precedentes de prosperidade, segurança e estabilidade na Europa, no [OCEANO]Pacífico e em nosso hemisfério”, disse Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado, após pergunta feita pela reportagem em entrevista coletiva.“Assim, nossa esperança é que o presidente Bolsonaro tenha aproveitado a oportunidade de reforçar, no encontro com o presidente Putin, as mensagens sobre os valores que compartilhamos.”O porta-voz não respondeu se as relações entre Brasil e EUA podem ser afetadas no futuro, caso o líder brasileiro não tenha expressado essas mensagens. E também não comentou a declaração de solidariedade de Bolsonaro para com os russos.Antes da fala de Price, em conversa com jornalistas em Moscou, Bolsonaro minimizou a questão do momento de sua visita e disse o que já havia falado antes, que apenas apoia governos que querem a paz. Voltou a dizer que “todos os países têm problemas”.“Alguns países achavam que não deveríamos vir. Mantivemos nossa agenda, por coincidência ou não, parte das tropas deixou a fronteira”, disse o presidente. “A leitura que eu tenho do presidente Putin é que ele é uma pessoa também que busca a paz.”Questionado sobre se teria enviado alguma mensagem à Ucrânia, Bolsonaro deixou o púlpito improvisado e tentou interromper a entrevista. Voltou, respondendo também que havia feito “tudo o que havia sido acordado” em termos de testes de RT-PCR para detectar o coronavírus.Ucrânia e Rússia vivem uma crise há semanas, desencadeada depois de o Kremlin mobilizar de 100 mil a 175 mil soldados em zonas próximas às fronteiras com a Ucrânia.