De volta ao mundo político desde que deixou a prisão neste ano, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha planeja retornar à Casa pelas eleições de 2022. Nesta entrevista ao POPULAR, ele diz não ter se arrependido de protagonizar o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, faz críticas ao ex-juiz Sérgio Moro e diz que não acompanha a política goiana, mas que tem alguma proximidade com o governador Ronaldo Caiado, devido a certo parentesco de sua esposa com a primeira-dama, Gracinha, e pelo tempo de Congresso. Muitos consideram o sr. como o “diretor” do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Parte dos relatos no início de seu livro também dão esse entendimento. É assim que se vê?Eu não diria que eu fui o diretor. Talvez eu tenha sido até um pouco mais do que isso. Que certamente fui o protagonista, disso não há dúvida, mas talvez eu tenha acumulado mais funções do que só a de diretor. (risos) Quais?Autor, diretor e ator. (risos) Talvez eu tenha encarnado a peça inteira. Há 134 pedidos de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em análise na Câmara dos Deputados. Por que acha que eles não vão adiante? Não há clima político e não há evidências. Eu tinha uma centena de pedidos de impeachment contra Dilma. Só aceitei aquilo que entendi ser correto juridicamente. Quando houve uma afronta à Lei de Responsabilidade Fiscal, no segundo mandato dela, que ela praticou quando mandou um projeto de lei ao Congresso Nacional para mudar a meta fiscal e, antes que o Congresso aprovasse, começou a emitir decretos de execução orçamentária já utilizando a meta alterada. Só aceitei por isso, independente ou não da vontade política. Não vejo isso praticado pelo Bolsonaro. Vejo discussão política. Ah, a pandemia, não sei o quê, mas não tem o ato. Qual ato ele praticou que afronta a Lei de Responsabilidade Fiscal? Não tem. As ameaças que ele fez à democracia não representam crime de responsabilidade?Mas… Vai criminalizar opinião? Ele pode ter a opinião que ele quiser. Quando Lula defende a Nicarágua, não dá para dizer que ele está ameaçando a democracia. Está defendendo um antidemocrata. Defende a Venezuela. É a opinião dele e cabe a gente apoiar ou não. Se for por esse lado, o PT também está praticando crime. Apoiará Bolsonaro em 2022?Sim, por duas razões: primeiro porque a eleição está e estará polarizada, e eu não ficaria com o PT. Não entendo que exista terceira via. E já que vou apoiar Bolsonaro, vou apoiar logo no primeiro turno. Não que eu seja bolsonarista, ou entusiasta ideológico. É uma questão eminentemente política. É possível prever algum resultado para a eleição de 2022?Não. Pode dar tanto Bolsonaro quanto Lula. Será uma eleição difícil, porque será uma eleição doente. Todo mundo sairá com sensação de derrota, porque quem vai vencer é o “anti”. (A eleição de) 2022 vai decidir se o antipetismo é maior que o antibolsonarismo, ou se é o contrário. É isso o que a eleição vai decidir, e o “anti” não vai dar esperança. Ele vai te dar alívio de se livrar de quem você não quer, sem esperança de que se vai partir para uma mudança. Independente de ganhar Lula ou Bolsonaro. Que avaliação faz do governo Bolsonaro até aqui?Como se pode avaliar um governo que passou mais da metade em pandemia? Pandemia essa que levou a que se rasgasse 10% do PIB brasileiro em despesa pública para tentar conter os efeitos. Um governo desse não pode ser avaliado. Eu diria que nem sei dizer se erros foram cometidos. Acho que ninguém, até hoje, conseguiu entender direito o que aconteceu. Vamos levar muito tempo para ver se houve erros ou acertos. Isso só o tempo vai dizer. Agora, a única coisa certa é que tem que vacinar. A pandemia não diminuiu por outra razão que não seja a vacina. Bolsonaro é contra a vacina.É… mas ele pode ser contra a vacina. É um direito dele. Não significa que ele impediu as pessoas de se vacinarem. Pelo contrário, o governo deu todas as condições para vacinar. O sr. é crítico da CPI da Covid. Por quê?Avaliar a pandemia antes de a pandemia acabar não é isento. O que estavam fazendo ali: primeiro, criminalizar opinião de médicos. Depois, tentar buscar qualquer coisa… vai atrás de fake news, de quebrar sigilo. Não tem nada a ver. Investigar o que aconteceu no Amazonas, que teve falta de oxigênio, investigar se houve compra irregular e tem que punir quem fez besteira. Aí não há dúvida nenhuma de que está correto. Discordo da politização. Acompanha a política goiana de alguma forma?Muito longe, né. É muito difícil para a gente, ainda mais eu, que exerci uma política em que convivi com vários lados de uma política local. Tenho relação com Jovair (Arantes) aqui, tinha uma boa relação com Marconi Perillo, como governador. Ele me apoiou para presidente da Câmara. Então, não tenho problema e evito entrar na disputa local, porque não é a nossa disputa, né. (risos) É difícil de se meter. Entre os políticos com os quais já conversou, desde maio, está o presidente do DEM, ACM Neto. Em Goiás, o DEM e o partido do sr., o MDB, estarão juntos em 2022. Acha que isso pode ocorrer também em âmbito nacional?Minhas conversas com o ACM Neto foram muito circunstanciais, nada profundo. Por acaso, é muito provável que a minha filha (Danielle Cunha, coautora do livro e que deve se candidatar a deputada federal) corra pelo partido deles no Rio (de Janeiro). Não eu. Não defini ainda, porque tenho que usar a realidade de São Paulo, que é diferente da do Rio. Agora, o DEM mudou de realidade. É um outro partido, junto o com PSL: o União Brasil. Então, não dá para dizer (se vai caminhar com o MDB). É possível que, em alguns estados, estejam (juntos). Nacionalmente, acho pouco provável. Bolsonaro tem um grande interesse em São Paulo, tanto que sua filiação ao PL, anunciada para a próxima terça-feira, passa por essa articulação. É uma possibilidade de futuro partidário para o sr. também?Não sei te dizer. Tenho apreço pelo PL e me dou razoavelmente bem com Valdemar (da Costa Neto). É uma pessoa de quem sou amigo há muitos anos, mas tenho que avaliar o contexto de nominatas partidárias. Não é pela presença ou não do Bolsonaro, isso não preocupa, mas o partido vai ficar grande demais, daí pode ter uma dificuldade de nominata. É isso que preciso avaliar. ‘Moro perseguiu Lula, e me usou para tentar fazer um contraponto’Apesar de ser um dos principais adversários do PT nos últimos anos, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha não alivia críticas ao ex-juiz Sérgio Moro, que deve disputar o Palácio do Planalto em 2022. “Não é pelo fato de eu ser adversário do PT, e eu o sou, mas não acho que devemos resolver as nossas questões políticas no Código de Processo Penal; o problema é político, disputando com o eleitor o voto. Discordo de tudo o que o PT fez, de todas as políticas públicas do PT, mas definitivamente Moro perseguiu o Lula, e me usou para tentar fazer um contraponto de imparcialidade. Então, Lula foi vítima do Moro, sim, não tenho dúvida nenhuma.”Cunha foi condenado por Moro, no âmbito da Operação Lava Jato e preso em outubro de 2016, meses depois do impeachment de Dilma Rousseff. Solto neste ano, após ter a prisão revogada pelo Poder Judiciário, ele esteve em Goiânia nesta terça-feira (23) em razão de seu livro, “Tchau, querida: o diário do impeachment”, lançado neste ano com coautoria de sua filha, Danielle. Cunha atribui sua cassação — teve o mandato cassado em setembro de 2016 — e prisão a questões políticas, mas diz não se arrepender de ter protagonizado o processo de impeachment de Dilma.“Se eu soubesse que eu ia passar tudo o que passei, abriria o processo de impeachment? Abriria do mesmo jeito. (risos) Ter tirado o PT vale o tempo que eu paguei sem dever. Aquilo não tem preço. (risos) Essa é a verdade.” Sobre Moro candidato, ele afirma que já sabia. “Eu digo no livro claramente que ele seria candidato a presidente. Não é de hoje que afirmo que Moro é chefe de uma organização política, a Lava Jato. Se considerar o padrão que eles consideraram a gente, eles são criminosos, e deviam responder por isso.” Na capital goiana, ele teve encontro rápido com o ex-deputado Jovair Arantes, que foi o relator do processo de impedimento de Dilma em 2016. Cunha informa que falaram de “política de maneira geral.”