A 26ª Conferência do Clima da ONU, a COP26, que termina neste sábado (12), em Glasgow, na Escócia, teve como grande desafio regulamentar detalhes técnicos do Acordo de Paris visando limitar o aumento da temperatura global em 1,5ºC até 2030. Entre as estratégias, a esperada destinação pelos países desenvolvidos de US$ 100 bilhões para financiar mudanças estruturais nas nações em desenvolvimento, a diminuição da emissão de gases que provocam o aquecimento global, como o metano, e a proteção de florestas. Em entrevista ao POPULAR, o conselheiro para Meio Ambiente, Ciência, Tecnologia e Saúde da Embaixada dos EUA no Brasil, Glenn Fedzer, fala dos temas centrais da conferência, dos compromissos dos Estados Unidos e do papel do Brasil diante das mudanças climáticas. Na COP-26, a ênfase foi na necessidade de limitar o aumento da temperatura global em 1,5ºC, conforme prevê o Acordo de Paris, o que exige que os países tornem mais ambiciosas suas metas até 2030. Como os Estados Unidos veem esse desafio?A janela para limitar o aquecimento a 1,5 ºC está se estreitando. Esperamos que os países que ainda não o fizeram assumam compromissos ambiciosos que nos aproximem desse objetivo. E todas as partes do Acordo de Paris devem se comprometer coletivamente a continuar reforçando a ambição em direção a um limite de 1,5 graus Celsius agora e ao longo desta década decisiva. Muitos países, incluindo os Estados Unidos, apresentaram compromissos ousados e ambiciosos em consonância com o objetivo de Paris de prosseguir com os esforços para limitar o aquecimento a 1,5 ºC. Agora, precisamos que o resto das grandes economias deem um passo a frente. Presidente da COP-26, Alok Sharma aponta como fundamental avançar em relação aos planos nacionais, as Contribuições Nacionalmente Determinadas, ou NDCs, na sigla em inglês, para reduzir as emissões de gás carbônico, especialmente para os países do G20 (grupo das 20 maiores economias, do qual o Brasil faz parte e que é responsável por cerca de 80% das emissões globais). Em relação às NDCs, como se posicionam os EUA?Os EUA apresentaram a Contribuição Nacionalmente Determinada para alcançar uma meta econômica de reduzir nossas emissões em 50% a 52% abaixo dos níveis de 2005 em 2030. Também temos uma meta de alcançar as emissões líquidas de gases de efeito estufa zero até 2050. Os EUA estão preparando uma resposta do governo à crise climática; cada agência dos EUA é uma agência climática. E estamos reunindo o setor privado para mobilizar os investimentos e tecnologias necessários para promover uma próspera economia net-zero nos EUA e globalmente. Outra discussão na conferência diz respeito ao financiamento de nações em desenvolvimento para que promovam mudanças estruturais. A promessa dos países desenvolvidos era de US$ 100 bilhões ao ano, o que nunca foi alcançado, e esse valor já é avaliado como insuficiente. O fato de que o mundo está tentando acumular esse fundo de US$ 100 bilhões é um reconhecimento de que os países terão que equilibrar suas necessidades energéticas atuais com as necessidades do clima. Também entendemos que os custos econômicos de não fazer essas mudanças o mais rápido possível provavelmente serão dramáticos. E quanto à regulamentação do artigo 6, que trata da criação de um mercado internacional de carbono para incentivar ações de diminuição de emissões que levam a mudanças climáticas?Se conseguirmos chegar a um consenso global sobre o artigo 6º, isso ajudará na transferência de recursos para comunidades carentes locais e marginalizadas nas bordas da florestas, ajudando-as a monetizar seus recursos florestais de uma maneira que signifique que essas árvores são mais valiosas no solo do que cortadas. Esperamos que o Brasil esteja pronto para chegar a esse consenso porque acreditamos que isso resultará em recursos substanciais fluindo para os países, incluindo o Brasil. Acredita ser viável um acordo sobre a meta de neutralizar as emissões até 2050? Por quê?Em linhas gerais, a COP26 precisa enviar o sinal de que as partes do Acordo estão tomando medidas para manter o limite de 1,5ºC no aquecimento e continuarão a fortalecer as ações após Glasgow durante esta década decisiva. Um resultado bem-sucedido também significará que concluímos negociações sobre as demais diretrizes que operacionalizam o Acordo de Paris – o chamado “livro de regras”. O Brasil tem sofrido pressão da comunidade internacional pela devastação ambiental, principalmente na Amazônia. Nas relações do país com os EUA, qual o peso dessas questões ambientais?Esse não é um problema enfrentado apenas pelo Brasil. Oito países dividem a Amazônia, e esperamos que todos eles sejam capazes de criar maneiras e métodos para reduzir o desmatamento dentro de suas próprias fronteiras. Se conseguirmos chegar a um consenso global sobre o artigo 6º, isso ajudará na transferência de recursos para comunidades carentes locais e marginalizadas nas bordas da floresta. Mas o Brasil é diferente de muitos outros países que tentam lidar com essa questão. O Brasil tem um capital humano substancial. Tem uma incrível variedade de universidades e instalações de pesquisa, vocês têm corporações de classe mundial, indústrias e infraestrutura. O Brasil está bem equipado para lidar com esse desafio em si. O Brasil tem um excelente Código Florestal, comunidades e ONGs que estão ativamente promovendo a proteção ambiental e o combate ao desmatamento, ar limpo, água limpa, o país tem recursos tremendos para fazer os impactos e mudanças que precisar. O fato de haver uma intenção deliberada por parte do governo brasileiro de promover tanto a redução da pobreza quanto a proteção ambiental em atos simultâneos espalhados pelos ministérios é encorajador. Mas todos temos que aumentar nossa ambição. A comunidade internacional espera que todos os países, incluindo o Brasil, tenham metas mais ousadas e façam planos concretos para implementar seus compromissos. Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), em agosto, indica que entre 30% e 50% do aumento das temperaturas se deve às emissões de gás metano. Está confirmado acordo entre Estados Unidos e a União Europeia (UE) para reduzir em 30% as emissões de gás metano até 2030? Neste sentido, qual a expectativa em relação ao Brasil?O compromisso do metano não é que cada país faça uma redução de 30% em suas emissões de metano, mas para cada país se comprometer a aderir a uma redução global de 30% de metano. E como é sabido, o metano, embora não persista no ambiente da mesma forma que o dióxido de carbono, é muito mais impactante quando está na atmosfera. Saudamos a decisão do governo do Brasil de copatrocinar o acordo, e também os esforços contínuos do ministro do meio ambiente, Joaquim Leite, para reduzir os aterros a céu aberto, por exemplo, que são uma das principais fontes de metano. Acreditamos que o Brasil tem uma boa história para contar sobre a redução do metano. Cientistas do IPCC calculam o aumento da frequência e da intensidade dos eventos extremos ligados às mudanças climáticas, como tempestades, enchentes, furacões, ciclones, secas prolongadas e ondas de calor. Que influência esses números devem ter na tomada final de decisões na COP-26?A crise climática já está aqui. Isto não é um desafio para as gerações futuras. Devemos enfrentá-la hoje. Enfrentar a crise climática é imperativo - a janela para limitar o aquecimento a 1,5ºC está se estreitando, e é também uma oportunidade. O objetivo da COP26 de manter o aquecimento global abaixo de 1,5ºC é crucial e engloba muito mais do que o controle de temperaturas. Agindo juntos, podemos evitar mais secas e enchentes, que prejudicam a produção de alimentos e energia, reduzem nossa renda, inundam nossas comunidades e deixam nossas crianças famintas. Conseguiremos proteger nossa saúde contra a fumaça da queima do carvão e de incêndios florestais que reduz nossa qualidade de vida e limita nossa produtividade. Conseguiremos também cuidar dos nossos sistemas hídricos e climáticos, que sustentam comunidades e sistemas de produção. Se cada nação for preparada para fazer sua parte, a COP 26 pode ser um momento decisivo para colocar o mundo no rumo certo.