Com a pandemia de Covid-19, e o consequente adiamento das eleições para novembro, é crescente a tese de que políticos em mandato, ou com alto índice de conhecimento entre a população, devem ser beneficiados, dada a impossibilidade de se realizar campanha de modo presencial. Nesse sentido, sairiam na frente, por exemplo, os 181 prefeitos goianos em condições de disputar a reeleição. Cientistas políticos, porém, afirmam que o cenário ainda é incerto.Professor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Robert Bonifácio relata que a pandemia será referência para a escolha de candidatos e que prefeitos que queiram disputar a reeleição podem ser prejudicados por suas próprias ações no combate à doença em suas cidades. “Será uma eleição plebiscitária em relação à atuação dos prefeitos. Se por um lado terão mais tempo para mostrar suas ações, por outro terão analisadas suas ações frente à pandemia.”Segundo ele, isso se dá principalmente em relação ao gasto de dinheiro público, como dos recursos extras ou de compensação liberados pelo governo federal para auxiliar as cidades. Até semana passada, os municípios goianos receberam R$ 708,5 milhões vindos da União, sendo R$ 306,2 milhões para combate à Covid-19, R$ 216,6 milhões para auxílio financeiro e R$ 185,6 milhões para compensação de perdas referentes ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM).Dessa forma, para o cientista político, se “o prefeito emprega mal o dinheiro, isso com certeza refletirá em seu desempenho eleitoral.” “Até porque denúncias de superfaturamento em compra de materiais necessários no combate à doença, por exemplo, serão amplamente divulgados na imprensa e nas redes sociais. E esta será uma eleição cuja campanha será feita essencialmente na internet”, diz.O cientista político e também professor da UFG Francisco Tavares, por sua vez, diz que o fato de a campanha ser feita essencialmente na internet pode dar mais ferramentas para candidatos que não estão em mandato. Embora diga não desprezar a hipótese de que o cenário favoreça políticos com mandato, ele diz que, como a campanha não vai ganhar espaços públicos onde os políticos já têm o hábito de aparecer, “como o vereador que promove sempre uma festinha e o povo já está acostumado, se esse político não tiver tanto domínio de WhatsApp quanto um neófito, por exemplo, pode ter dificuldade.” “Então, não dá para cravar que a taxa de reeleição será mais alta. Não me parece tão simples assim.”Para ele, assim, “aqueles que operam bem as mídias sociais, mesmo sem força em partidos políticos e recall vão ter alguma vantagem”, mas ressalta exceções: “Na eleição majoritária de Goiânia, como há uma figura forte e que, historicamente, ganha eleições, é seguro dizer que ele continua favorito”, diz se referindo ao atual prefeito, Iris Rezende (MDB).NÃO ADIANTAO advogado eleitoral Dyogo Crosara, contudo, diz que, mesmo com regras eleitorais mais flexíveis para a pré-campanha, será difícil para um candidato “outsider” conseguir chegar ao eleitor. “Por isso, acho que haverá muita comparação entre gestões: será prefeito contra ex-prefeito, isto é, pessoas já conhecidas.”Esse é o caso, por exemplo, de Jataí, onde o atual prefeito, Vinícius Luz (PP) deve disputar contra o ex-prefeito Humberto Machado (MDB). Em outras cidades, como Goiânia, Aparecida de Goiânia, Anápolis, Catalão e Porangatu, a disputa tende a se dar entre prefeitos e políticos já conhecidos.Questionado, porém, se a maior permissividade da Justiça Eleitoral na pré-campanha não facilita a vida de outros candidatos – só será considerada propaganda antecipada, por exemplo, se um adesivo conter pedido explícito de voto –, Crosara diz não necessariamente. “Depende da história de cada cidade. O adiamento das eleições deu mais tempo para que os candidatos chegassem ao eleitor. Melhora, sem dúvida, mas acho que não será o suficiente ainda, principalmente em municípios pequenos.”JUDICIALIZAÇÃOCrosara diz ainda que a eleição deve ser marcada por processos na Justiça, “especialmente contra gasto e uso da máquina, além de abuso do poder religioso.” “A própria pré-campanha tem mostrado isso. Todos estão se armando juridicamente. Em alguns municípios já começou a ter ações por propaganda antecipada, mesmo com o novo entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de que, para ter propaganda antecipada, é preciso ter pedido explícito de voto.”Além disso, o advogado aponta que esta será a primeira eleição após as últimas decisões de tribunais superiores a respeito de temas como cota feminina e maior controle de gastos. “Isso, aliado ao fim das coligações proporcionais, vai mudar muito o quadro.”