O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), afirmou que não se vê coordenando a campanha à Presidência do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que o venceu nas prévias tucanas do sábado (27).Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo (leia mais na página 6) neste domingo (28), Doria afirmou ter convidado Leite para integrar o comando de sua campanha, “em uma posição de protagonismo”.“Permaneço no PSDB, mas não me vejo coordenando uma campanha presidencial, pois serei governador até o último dia do meu mandato e não imagino poder coordenar algo desta dimensão nacional estando focado nos problemas e soluções do meu estado”, afirmou Leite.Reforçando a avaliação de aliados do gaúcho de que a união em torno de Doria é tarefa muito difícil, Leite fez questão de marcar sua distância do governador paulista.“Além disso, penso que deve haver uma sinergia entre candidato e coordenador que seja maior do que o simples fato de estarem no mesmo partido. Imagino que o governador Doria busque alguém afinado com sua forma de pensar e fazer política, para além de uma visão meramente partidária”, completou.Doria disse que combinou uma conversa com Leite na volta de sua viagem a Nova York, onde vai liderar uma missão empresarial de 1º a 5 de dezembro. “Será como for mais confortável para ele”, afirmou. Leite afirmou ainda não haver nenhuma reunião marcada.Após a derrota para Doria, aliados de Leite mantêm o discurso de buscar a união do partido - mas na prática duvidam dessa possibilidade.Leite reconheceu a derrota, desejou sorte a Doria e mirou suas críticas na polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido, rumo ao PL) e o ex-presidente Lula (PT). A regra no seu entorno é, portanto, manter esse tom de colaboração.“João, te desejo toda sorte porque o Brasil precisa disso. Que a gente consiga viabilizar um projeto no centro”, disse Leite no sábado (27). Nos bastidores, porém, tucanos que apoiaram Leite mostram pouca disposição em caminhar com o governador paulista em 2022.Aliados do gaúcho defendem que o processo de votação seja alvo de checagem, sobretudo depois da pane no aplicativo original, que paralisou as prévias no domingo (21), e das suspeitas de ataque hacker. Mas uma recontagem ou a contestação do resultado estão, por ora, fora do radar a não ser que haja fatos novos a partir das investigações no sistema de votação. Doria está, na visão dos rivais internos, legitimado pelas prévias.Leite afirmou não considerar ser candidato à reeleição no Rio Grande do Sul – o governador afirma ser contra a possibilidade de reeleição. Em relação ao compromisso de não deixar o PSDB, no entanto, aliados veem espaço para volta atrás - o gaúcho poderia ser candidato ao Planalto por outra sigla, incentivam.Com a ressalva de que é cedo para traçar previsões, a avaliação é a de que Doria, mesmo vencedor, não dobrou o partido e terá ao seu lado pouco mais da metade do tucanato, os 54% que o consagraram presidenciável. O placar apertado - Leite terminou com 44%,7% - e as trocas de acusações durante as prévias não facilitam a reunificação da sigla.O risco de debandada no partido não é descartado, sobretudo no entorno dos principais apoiadores de Leite e rivais de Doria - o ex-governador Geraldo Alckmin e o deputado federal Aécio Neves (MG).Com a vitória de Doria, a já anunciada saída de Alckmin do PSDB deve se concretizar. Em São Paulo, tucanos pró-Leite afirmam que o ex-governador poderia liderar uma migração significativa se trabalhar para isso.Já o risco de esfacelamento da bancada tucana é minimizado entre os deputados - Aécio já indicou que seguiria no PSDB mesmo se Doria vencesse. O mineiro tem influência sobre a ala bolsonarista dos deputados federais tucanos, que não é benquista entre aliados de Doria, principalmente depois que o governador se tornou um dos principais adversários do presidente.DebandadaO presidente do PSDB de Minas Gerais, deputado Paulo Abi-Ackel, afirma que uma debandada não é cogitada. Às vésperas da votação, Doria falou em depuração, referindo-se aos bolsonaristas do partido, cuja maioria apoiou Leite, e Arthur Virgílio (AM), o terceiro concorrente das prévias, chamou Aécio de “maçã podre” nesse mesmo contexto.A unidade do PSDB depende dos gestos de Doria, de acordo com apoiadores de Leite. Há espaço para erros e também para acertos. A tarefa é descrita como difícil, mas não impossível. Se o paulista insistir nessa linha de embate, pode provocar uma guerra interna e ser derrotado novamente - Doria tentou expulsar Aécio em 2019 e terminou vencido por 30 a 4.Abi-Ackel afirma que o resultado das prévias deve ser respeitado. “Por mais que possamos condenar alguns dos métodos utilizados, ele reflete a vontade da maioria. A partir de agora, cabe ao vencedor demonstrar, nos próximos meses, condições reais de liderar uma candidatura competitiva”, diz.“Existe um desafio, para todos, de reagregar o partido. O partido, sem dúvida, inovou ao consultar suas bases e pagou um preço por isso”, afirma o prefeito de Santo André, Paulo Serra, e um dos coordenadores da campanha de Leite.O preço não foi apenas o impedimento tecnológico, mas também “a disputa que em muitos momentos se acirrou” - as prévias expuseram as fraturas e feridas do partido. Unificar o partido, na opinião de Serra, “é a única maneira que o PSDB tem para disputar para valer a eleição”. “Acredito que há disposição de todos, temos que deixar a temperatura esfriar, retomar o diálogo e focar num bom plano de gestão. Muitas vezes as convergências surgem através das ideias e não das pessoas.”Se seguir a linha de conciliação, Doria pode ampliar seu time, ainda de acordo com estrategistas de Leite. Mas eles pontuam que a resistência ao governador paulista não se dissipou nem na sigla e nem na população. Caso a candidatura de Doria estacione nos 5% e não se mostre viável, as chances de ser rifado pelo partido aumentam consideravelmente.Aliados de Leite mais críticos ao governador afirmam que Doria pode abrir espaço entre os tucanos barganhando e pressionando por apoio, acusações já feitas durante as prévias.Parte dos aliados de Leite afirma se recusar a legitimar o domínio de Doria. Para eles, sem apoio interno e rejeitado pela população, sua vitória seria de Pirro. Os estrategistas do gaúcho afirmam ainda que Doria virou o jogo entre mandatários, especialmente deputados federais e, por isso, venceu o pleito interno. Há entre eles a disposição de entender o que fez parlamentares fechados com Leite mudarem repentinamente de posição.