Com três dias de tramitação na Assembleia Legislativa, a Lei 18.709/2014, aprovada em dezembro e que teve validade de apenas uma semana, abriu caminho para que o grupo JBS negociasse as dívidas com o Estado de Goiás, reduzindo o valor de cerca de R$ 1,3 bilhão para R$ 320 milhões. As novas regras permitiram isenção de todos os juros, multas e correção monetária (veja quadro) para as empresas que quitassem 40% das dívidas totais à vista, com possibilidade de parcelamento do restante em cinco anos. Em maio do ano passado, O POPULAR revelou que a JBS, maior empresa de processamento de carne bovina do mundo, era acusada de dever R$ 1,3 bilhão de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ao Estado. Nos nove anos anteriores, a empresa recebeu 49 autos de infração pela suposta sonegação do imposto. O valor total da cobrança correspondia, na ocasião, a 18% das pendências fiscais que contribuintes na ativa tinham em Goiás. Depois da publicação da reportagem, o governo estadual anunciou a inscrição na dívida ativa de cinco processos que já haviam sido julgados de forma definitiva no Conselho Administrativo Tributário (CAT), da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz). Sexta-feira (23), o jornal Diário da Manhã mostrou que a JBS aderiu ao programa, com pagamento à vista de R$ 170 milhões (53% da dívida recalculada com as facilidades da lei) e parcelamento de R$ 150 milhões em 60 meses. Os juros do parcelamento são de 0,2%. O projeto de lei com ampliação dos benefícios do Programa de Incentivo à Regularização Fiscal de Empresas no Estado de Goiás (Regulariza) – instituído em maio do ano passado –, foi encaminhado pelo governador Marconi Perillo (PSDB) no dia 15 de dezembro, com protocolo na Assembleia Legislativa no dia seguinte. A mensagem do governo solicitava tramitação especial da matéria. O líder do Governo na Casa, deputado Fábio Sousa (PSDB), solicitou suspensão dos interstícios regimentais exigidos para o processo legislativo, o que permitiu a tramitação mais rápida do projeto. Na mesma data, ficou pronto o relatório, favorável à aprovação, do deputado Talles Barreto (PTB) na Comissão Mista, que acatou o parecer. Em 17 de dezembro, a matéria foi aprovada em primeira votação no plenário. No dia seguinte, houve aprovação em segunda votação. O autógrafo de lei foi encaminhado no dia 19 ao governador. A publicação ocorreu em suplemento do Diário Oficial do Estado do dia 22 de dezembro. No dia 24 de dezembro, houve ponto facultativo no Estado e dia 25 feriado de Natal. Governo diz que acordo ajudou fechar as contas Na justificativa do projeto, o governador Marconi Perillo informou que a expectativa era de arrecadação de R$ 180 milhões em dezembro com as novas regras. “Esse valor contribuirá de forma decisiva para que o Estado cumpra a meta de arrecadação de receita própria pactuada no Programa de Reestruturação e de Ajuste Fiscal, firmado com a Secretaria do Tesouro Nacional”, justificou. O deputado Talles Barreto, autor do parecer, também diz que o relatório favorável teve como objetivo contribuir com o Estado para o fechamento das contas de 2014. Segundo ele, o então secretário da Fazenda, José Taveira, argumentou que as negociações com as empresas eram importantes para aumentar a arrecadação. “Nunca ouvi dizer que era para favorecer a JBS. Era uma oportunidade dada a todas as empresas. E as novas regras foram extremamente divulgadas no meio empresarial, mesmo com o curto tempo para adesão”, afirmou o deputado. A Sefaz afirma que a lei foi positiva para o Estado. O superintendente da Receita da Secretaria da Fazenda (Sefaz), Glaucus Moreira, afirmou ao POPULAR que o governo não abriu mão da receita do ICMS, o que torna o projeto de lei favorável ao Estado. “Nós preservamos o imposto, tirando juros e multas. Há um custo grande que esses processos (de cobranças) geram para o Estado, porque movimentam a fiscalização, o CAT, a administração da dívida ativa, a Procuradoria Tributária, o Judiciário. Só considerando o custo disso tudo, é positivo. É muito mais benéfico para o Estado do que para as empresas”, afirma. Segundo ele, o Estado contou com uma recuperação de crédito no Regulariza de 2014 que “não era imaginada para os próximos 15, 20 anos”. O superintendente nega que a JBS tenha sido a única beneficiada com a lei, mas não informou quantas empresas aderiram às regras instituídas no fimn do ano passado. Segundo ele, o balanço feito pela Sefaz aponta o resultado de todo o Regulariza de 2014, sem especificar as adesões de dezembro. “Vários contribuintes aderiram. E várias empresas tiveram interesse. Algumas chegaram a pedir mais tempo para conseguir os 40% de quitação à vista, mas nós avisamos que não prorrogaríamos porque precisávamos do dinheiro no mandato anterior”, afirmou. Já a assessoria de imprensa da JBS informou que a empresa não vai comentar o caso. Dívida teve repercussão política As dívidas da JBS com o Estado tiveram grande repercussão negativa na pré-campanha do empresário José Batista Júnior (PMDB), o Júnior Friboi, ao governo de Goiás. Ele anunciou a desistência da candidatura 20 dias depois da publicação de reportagem no POPULAR, em maio do ano passado. Júnior reagiu em tom político à reportagem que divulgou dados das dívidas, dizendo ser “estranho e suspeito” o vazamento de informações que deveriam estar sob sigilo. Peemedebistas acusaram à época pressão do governo em relação aos processos de cobranças à empresa para que Júnior renunciasse à pré-candidatura e, mais tarde, declarasse apoio ao governador Marconi Perillo (PSDB). No segundo turno da campanha eleitoral, Júnior divulgou carta de apoio ao tucano e fez duras críticas ao correligionário Iris Rezende, que disputava pela terceira vez as eleições contra Marconi. Na ocasião, o governador afirmou que a adesão não teria nenhuma relação com os processos das dívidas da JBS, que seguiriam normalmente seu rito. O POPULAR não conseguiu contato ontem com Júnior para falar sobre a quitação das dívidas da empresa de sua família. No dia anterior, ele foi procurado pela reportagem para tratar de outro assunto e afirmou que estava em viagem e só retornará ao Estado dia 2.