O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) aumentou em cerca de 80% a gratificação de férias de promotores e procuradores, em medida que representará impacto anual de R$ 11 milhões, segundo a assessoria de imprensa do órgão. Ato assinado pelo procurador-geral de Justiça, Aylton Vechi, no último dia 6 estabelece que, em vez de um terço do salário, os membros do MP-GO terão direito a três quintos do subsídio.A iniciativa retroage a 1º de julho para ampliar os pagamentos, já que a legislação estabelece que eles têm direito a duas férias por ano (julho e janeiro). Os salários dos integrantes do órgão variam de R$ 30,4 mil a R$ 35,4 mil. Assim, eles recebiam anteriormente de R$ 10,1 mil a R$ 11,8 mil e passarão a contar com valores extras que variam de R$ 18,2 mil a R$ 21,2 mil, duas vezes ao ano.Em fevereiro deste ano, O POPULAR mostrou que o MP-GO elevou outras gratificações a seus membros. O órgão em Goiás tem quadro com 42 procuradores e 482 promotores, além de 60 substitutos.A Constituição Federal estabelece que os trabalhadores brasileiros “têm direito a férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal”. Apesar da expressão “pelo menos”, convencionou-se conceder essa fração na maioria dos empregos, da iniciativa privada ou do serviço público.Os servidores do MP-GO não terão direito ao benefício. A assessoria do orgão alega que o estatuto prevê expressamente que o adicional corresponderá a um terço da remuneração.Para especialistas, a iniciativa abre caminho para que outras categorias, especialmente das chamadas carreiras jurídicas, possam reivindicar o aumento do pagamento.“Vai abrir a porteira. Depois de um, várias outras categorias vão se considerar legitimadas a pleitear a mesma coisa. Delegados, procuradores do Estado, defensores, magistratura. Imagina o tamanho do rombo”, afirma o advogado Juscimar Ribeiro, especialista em Direito Administrativo. Em alguns casos, seria necessário alterar a legislação.Leia também:- STF forma maioria por reajuste de 18% a magistrados; salário de ministros iria a R$ 46 mil- Projeto de lei que proíbe ‘ideologia de gênero’ nas escolas de Goiás é inconstitucional, diz MP- Goiás tem 603 mil famílias na pobrezaO MP-GO afirma que a Lei Orgânica estabelece direito aos membros da gratificação de férias “não inferior a um terço”, o que permite a possibilidade de pagamento maior. “Está na linha do previsto na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/93) e do artigo 7º, inciso XVII, da Constituição Federal, não havendo necessidade de autorização do Conselho Nacional do Ministério Público para sua regulamentação”, afirmou o órgão, ao ser questionado sobre autorização do CNMP.A Lei Orgânica do MP-GO é de 1998. A portaria do PGJ afirma que não houve ato regulamentador da matéria (gratificação das férias). Isso significa que nos últimos 24 anos os integrantes do órgão receberam o valor de um terço.O MP-GO diz que Vechi agiu “dentro de sua autonomia administrativa e financeira” e “considerando a existência de disponibilidade financeira e orçamentária, observadas as ressalvas feitas pelo Ministério Público no Regime de Recuperação Fiscal (RRF)”.A reportagem apurou que o aumento na despesa com gratificação de férias não foi comunicado ao Conselho de Supervisão do RRF, mas há prazo de um mês para o envio das informações. A Secretaria Estadual da Economia também informou desconhecer o ato do PGJ.O RRF é um programa da União para socorro financeiro de estados com grave desequilíbrio fiscal, ao qual Goiás aderiu no final do ano passado, com prazo até 2030. Para alcançar o ajuste das contas públicas, é necessário apresentar um Plano de Recuperação Fiscal com ações coordenadas sobre todos os Poderes, órgãos, entidades e fundos.O POPULAR também perguntou ao MP-GO se em outros estados há diferença de valores e a resposta foi positiva, sem informar o caso. “Os demais Ministérios Públicos disciplinam a matéria em atos próprios, existindo casos de regulamentação em valores superiores ao limite mínimo.”Juscimar afirma que, diante de dificuldades financeiras e outras demandas como pagamentos a servidores e melhora na estrutura, o novo benefício aos membros parece “desarrazoado”. Ele também diz desconhecer outro órgãos público que pague a gratificação acima do um terço.Sobre o argumento em relação aos servidores, Juscimar afirma que o estatuto não pode limitar o que estabelece a Constituição e, considerando o princípio da isonomia, deveria haver novo ordenamento para inclui-los.O advogado defende ainda que deveria haver uma norma específica a tratar do aumento. “Ato tão somente do procurador-geral é temerário. Deveria ter lei.”BenefíciosEm fevereiro deste ano, dois meses depois da adesão ao RRF, o MP-GO propôs lei complementar, aprovada pela Assembleia Legislativa de Goiás, para criar 168 cargos comissionados, conceder aumentos de remunerações de servidores sem vínculo e elevar valores de gratificações aos procuradores e promotores.Aos membros, a mudança estabeleceu aumento do limite de Gratificação por Exercício Cumulativo de Cargos e criação de dois novos tipos de pagamento: Gratificação por Exercício Cumulativo de Funções e Abono Compensatório por Serviços de Natureza Extraordinária, com impacto calculado de R$ 10 milhões.A nova gratificação serve para remunerar membros que atuem em projetos específicos, como forças-tarefa e grupos de trabalho, ou ainda auxílio a promotorias sobrecarregadas. Já a acumulação de cargos ocorre por déficit de membros, segundo o órgão, quando há necessidade de substituição em promotorias que estejam vagas. Nos dois casos, o limite de pagamento será de um terço da remuneração. A gratificação de acúmulo de cargos tinha teto de 15% do salário.Já o abono compensatório diz respeito a folgas concedidas aos membros que atuarem fora dos dias normais de trabalho, como plantões de fim de semana. No conjunto de mudanças, também houve inclusão de pagamento de auxílio-mudança a promotores que peçam transferência.Na ocasião, a assessoria do MP-GO afirmou que o projeto estava “inserido num contexto de absoluta responsabilidade orçamentária e financeira”.-Imagem (Image_1.2526029)