Entidades que representam os municípios no País devem buscar, no Congresso Nacional, medidas de compensação pelas perdas que terão com a redução da alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), anunciada pelo governo federal na sexta-feira (25). Em Goiás, as cidades devem deixar de arrecadar R$ 179 milhões neste ano, segundo previsão da Federação Goiana dos Municípios (FGM). No País, a perda municipal deve ser de R$ 5,8 bilhões.Em meio à pressão para apresentar uma agenda positiva que auxilie na campanha à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL), o governo reduziu a alíquota do IPI em 25% para a maioria dos produtos industrializados — para os automóveis, a redução foi de 18,5%. A medida agradou a indústria — entidades como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) comemoraram a redução —, mas causou reação de prefeitos.Presidente da FGM e prefeito de Campos Verdes, Haroldo Naves (MDB) diz ao POPULAR que o governo federal “faz bondade com chapéu alheio”. “A perda da arrecadação do IPI impacta diretamente no FPM (Fundo de Participação dos Municípios), pois é um dos poucos recursos do governo federal que é compartilhado conosco. Arrecadação de PIS/Cofins, por exemplo, não vem para a gente. Então, quando (o governo federal) tem que desonerar (algum imposto), vai no compartilhado e não em outros.”Ele justifica também que as cidades terão aumento do custo da máquina pública neste ano e cita como exemplo o reajuste de 33,2% no piso salarial dos professores, anunciado por Bolsonaro no início de fevereiro, e que também é questionado pelas entidades que representam os municípios, que acusam o governo de uma medida eleitoreira — o piso é definido pela União, mas, na educação básica, os salários são pagos por prefeituras e governos estaduais.“Estamos em um ano em que o custo da máquina pública aumentou muito”, argumenta Haroldo Naves. “Teremos que dar reajuste salarial para várias categorias que não tiveram no ano passado, além do aumento do custo do combustível, que impacta diretamente em toda a cadeia, e o valor da construção civil, que aumentou muito. Em sentido contrário, teremos diminuição da receita.”Questionado sobre o aumento das receitas municipais nos últimos anos, argumento utilizado pela equipe econômica do governo federal para descartar uma compensação pelas perdas de arrecadação com o IPI (não é obrigatória), e também pelo crescimento dos valores, por exemplo, de emendas parlamentares que recebem, o presidente da FGM afirma que as emendas são importantes, mas não se comparam ao FPM.Segundo Naves, as emendas chegam para obras ou maquinário. “Recebi emenda de R$ 286 mil para comprar maquinário. Fez licitação, e não houve interessados. Terei que complementar para subir o valor. Uma obra que foi licitada de R$ 500 mil há um ano e meio atrás, agora o município também precisa aumentar a contrapartida. Então, é importante, mas não soluciona a crise nos municípios. Não há flexibilidade para gastar.”Para ele, faltou diálogo. “É uma medida eleitoreira e não traz impactos práticos para a economia. A última que fez isso foi (a ex-presidente) Dilma (Rousseff), e todos sabem o resultado. Não houve diálogo algum.”CompensaçãoHaroldo Naves, que também é vice-presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM), relata que as equipes técnicas da FGM e da CNM estão trabalhando em um esboço de projeto de lei para apresentar a deputados e senadores com o objetivo de estabelecer compensação às prefeituras pelas perdas com a redução do IPI.“Queremos que o governo federal, como foi em 2020, faça uma compensação financeira (leis criaram compensações financeiras a Estados e municípios em razão da pandemia de Covid-19), porque esse imposto é compartilhado. O gestor fez o planejamento para o ano, já aprovou sua Lei Orçamentária Anual (LOA), então, como vai cumpri-la, se esse orçamento já está furado?” O texto deve ser entregue na próxima semana.Os dois senadores de Goiás titulares na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), que discute a proposta de reforma tributária, se dizem favoráveis a uma compensação a Estados e municípios. Vanderlan Cardoso (PSD) afirma achar justa a proposta. “O governo federal dá isenção de um tributo que é repartido com municípios e Estados. Eles deveriam ser consultados. Mas, claro, depende da proposta. Se for consistente e bem elaborada, por ser ano eleitoral, pode ser que vingue (no Congresso).Jorge Kajuru (Podemos), por sua vez, relata que “tem que ser possível” aprovar uma medida de compensação. “Vou encontrar a minha conversando com a minha bancada e, na semana que vem, teremos uma posição. É preciso ver se é viável e correto. É justo e temos que resolver.”Arrecadação de Estados e municípios pode cair R$ 11,9 biLevantamento do Instituto Nacional do Orçamento Público (Inop), feito a pedido do POPULAR, mostra que Estados e municípios devem perder aproximadamente R$ 12 bilhões com a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), anunciada pelo governo federal.Os Estados deixam de receber R$ 6,06 bilhões e os municípios, R$ 5,85 bilhões. A perda da União deve ficar na casa dos R$ 8,36 bilhões.Olhando por fundo, em valores absolutos, a maior redução será no Fundo de Participação dos Municípios (FPM): R$ 5,33 bilhões, o que representa 91% de toda a perda das cidades.O Fundo de Participação dos Estados (FPE) perde R$ 4,49 bilhões, e R$ 627,6 milhões é a previsão de perda para os fundos constitucionais de financiamento do Centro-Oeste (FCO), do Norte (FNO) e do Nordeste (FNE).Todos os valores são uma estimativa de perda com base na previsão de arrecadação com o imposto na Lei Orçamentária Anual (LOA) da União para este ano.Diretor do Inop, Renatho Melo diz à reportagem que o governo federal tem reiterado que a surpresa de arrecadação no ano passado — tanto Estados quanto municípios apresentaram aumento de arrecadação nos últimos dois anos — é algo “que veio para ficar” e, por isso, “essa redução de imposto é necessária.”Acerto de ContasPara Melo, o tamanho do impacto da perda de arrecadação vai depender do que foi feito com os recursos oriundos dessa “surpresa orçamentária” dos últimos anos.“Se o município não aproveitou o aumento da arrecadação para fazer um acerto das contas públicas, dentro desse contexto de dá e tira do governo federal, esse impacto é significativo e pode causar uma descontinuidade dos serviços públicos. Agora, se o prefeito fez o dever de casa e aproveitou essa ‘surpresa orçamentária’, mesmo com a inflação e reajustes, para ter uma boa saúde fiscal, ele vai sofrer menos”, afirma, relembrando ainda que o governo Jair Bolsonaro tem prometido zerar também o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).Contudo, ele acha possível que o Congresso Nacional se interesse em aprovar uma compensação pelas perdas.“O Congresso tem usado o orçamento para fazer essas compensações e, em ano eleitoral, acredito que tenha interesse em reforçar esse elo com prefeitos e governadores. Então, a estratégia de buscar o Parlamento é a única alternativa de atenuar o dano causado às contas públicas municipais.”-Imagem (Image_1.2412573)