“Minha especialidade é produzir provas; esqueceram que sou delegado?”, disse o deputado federal Waldir Soares (PSL), ao ser questionado sobre cobranças de colegas da bancada goiana para que comprove o que relatou ao Intercept Brasil no último sábado (20), que houve promessa de R$ 10 milhões e R$ 20 milhões, respectivamente, em emendas extras para a votação em Arthur Lira (PP-AL) na eleição da mesa diretora, no início deste ano, e na reforma da Previdência, de interesse do governo Jair Bolsonaro, em 2019.Quatro parlamentares ouvidos pelo POPULAR negam que tenham recebido oferta de recursos em troca de votos e cobram provas do parlamentar. Delegado Waldir acusou Lira e o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, general Luiz Eduardo Ramos, de comandarem o esquema de compra de votos. No mesmo dia da publicação do Intercept, o deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) pediu investigação das denúncias, em representação protocolada na Procuradoria-Geral da República (PGR).Dois deputados da bancada goiana que atuaram como líderes de partidos no período citado pelo delegado Waldir afirmaram que nunca ouviram falar desse tipo de negociação.“Não presenciei e nem ouvi absolutamente nada disso durante a campanha a presidente da Câmara nem na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) da Previdência. Não conheço nenhum outro deputado que tenha dito ou mencionado que recebeu recursos em troca de votos”, afirma o deputado Lucas Vergílio, líder do Solidariedade na Câmara.Ele considera que as declarações do deputado Waldir são graves e exigem apresentação de provas. É o mesmo que diz o deputado José Nelto, que foi líder do Podemos em 2019 e 2020 e está atualmente na vice-liderança da bancada. “Ele tem de provar o que falou e mostrar quem foi comprado. Eu nunca vendi nem negociei meu voto e nunca ouvi isso dentro da minha bancada. Quando fui líder, ninguém tratou disso comigo. Se ele (Waldir) negociou, se ele se vendeu e depois se arrependeu, deve falar por ele”, afirma.Nelto diz que a posição da bancada do Podemos de apoio a Arthur Lira foi fechada por conta do compromisso do pepista de colocar em pauta votações de interesse do Podemos, como a prisão em segunda instância.Tanto Lucas quanto José Nelto são de partidos que não compõem a base governista. Waldir afirma que houve negociações de Lira também com parlamentares e bancadas da oposição.O deputado Célio Silveira (PSDB), que também não faz parte da base, mas tem votado a favor de projetos de interesses do governo, criticou as declarações do parlamentar do PSL. “Ele não pode acusar todo mundo, generalizar dessa forma. Que dê nome aos bois. O problema é que tem gente procurando a todo custo relevância nas mídias sociais, com acusações falsas e buscando aparecer. Para mim, nunca chegou isso (oferta de emendas em troca de votos)”, disse o tucano.“Se houve oferta para o partido dele, que dê detalhes e prove o que aconteceu. Não pode generalizar tudo”, completou Célio Silveira.Já no grupo governista, o deputado Glaustin da Fokus (PSC) também nega conhecimento sobre negociação de votos. “Comigo nunca teve isso e nem na bancada do PSC. Se dentro do PSL aconteceu, aí eu não sei. Eu desconheço isso”, disse, completando que não teve tempo de ler a reportagem completa do Intercept e que não queria comentar mais a respeito.José Nelto e Célio Silveira defenderam mudanças nas emendas de relator, admitindo que abrem caminho para compra de votos, mas afirmaram que não sabem se houve esse tipo de utilização. Segundo eles, deve haver maior transparência sobre as indicações para destino dos recursos públicos.O POPULAR tentou falar também com a deputada Flávia Morais (PDT), que coordena a bancada goiana, mas ela não atendeu o celular nem deu retorno aos recados.ProvasÀ reportagem, Waldir reafirmou as declarações e foi além: “Ninguém entregou voto sem ter recebido emendas extras na reforma da Previdência. Eu não disse que foi para o bolso de ninguém, são recursos para ajudar os municípios. Mas teve isso, sim, e eu só relatei o que aconteceu”.“Se isso for judicializado e eu for intimado, apresentarei as provas. Não podem esquecer que fui líder. E sou especialista em produzir provas”, afirmou, se negando a responder que provas apresentaria.Quanto aos líderes que negaram abordagens ou negociações, o deputado disse que “cada um fala o que quer”, mas insistiu que as conversas ocorriam entre Lira e todos os comandos das bancadas.“É só verificar quem teve liberação extra de emendas. (Os recursos) Vieram da Lua? Receberam porque são mais bonitos? É a construção política para o governo ter maioria. Todos os governos fizeram isso e é legal”, diz o delegado Waldir. “Os problemas são que não há publicidade, há apropriação de alguns líderes de valores que deveriam ser para deputados e há retaliação como houve comigo”, completou, afirmando que acha “injusto” que Goiás tenha menos recursos do que outros Estados cujos parlamentares são amigos do governo e de Lira.Waldir disse que a liberação dos recursos do chamado orçamento secreto é de atribuição única e exclusiva dos presidentes da Câmara e do Senado e que todo valor extra é negociado em troca de apoio. “Cada parlamentar tem 27 milhões por ano, R$ 10 milhões de emendas de bancada e R$ 17 milhões individuais. Dá 54 milhões em dois anos. Como tem gente que consegue R$ 300 milhões?”, questiona.Sobre a representação à PGR, Waldir disse que não vai entrar no embate de Ivan Valente com Lira, mas que também está à disposição para reafirmar o que disse.RelatosWaldir afirmou à reportagem do Intercept que quem ocupa liderança de bancada recebe oferta do dobro do valor em troca do voto. No caso da reforma da Previdência, afirmou ter obtido promessa de R$ 46 milhões, em verbas de uso discricionário do governo federal (antes do funcionamento das emendas de relator).Ao POPULAR ele explicou essa soma: R$ 20 milhões era o valor por deputado; outros R$ 20 milhões por ser líder; R$ 3 milhões por ser membro da Comissão de Orçamento; e outros R$ 3 milhões também por ser líder. Ele diz que foi o único líder a não receber por conta da briga interna no PSL e o rompimento com Bolsonaro.Segundo ele, com as emendas do relator, o controle dos investimentos do governo federal saiu dos ministérios e ficou concentrado nas mãos de Lira e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). “Ele é quem carrega o governo. Quem manda no governo hoje é o Lira. Não é o Bolsonaro, é o Lira”, afirmou.Ele disse ainda que o deputado Vitor Hugo (PSL) recebeu R$ 300 milhões em emendas secretas.O chamado orçamento secreto foi relevado pelo Estadão em maio, apontando que o presidente Jair Bolsonaro montou, no final do ano passado, um esquema para ampliar sua base no Congresso com R$ 3 bilhões em emendas. Este novo tipo de rubrica totaliza R$ 18,5 bilhões de gastos em 2021, propostos por deputados cujos nomes são mantidos em sigilo pela Câmara.Em decisão liminar deste mês, o Supremo Tribunal Federal mandou suspender, por 8 votos a 2, o sistema por falta de transparência.Vitor Hugo foi procurado pela reportagem, mas não respondeu aos questionamentos.-Imagem (Image_1.2359130)