Em setembro de 2024, a atriz Meryl Streep discursando na ONU&lt;MC&gt;,&lt;/MC&gt; chamou a atenção para a condição de vida da mulher afegã no atual regime do talibã: nenhum acesso aos direitos civis e sociais, sem liberdade, submissa ao poder do homem. Simone de Beauvoir em suas reflexões nos alertava que bastava uma crise política, religiosa ou econômica para que os direitos das mulheres fossem questionados. Com a onda crescente do conservadorismo no mundo, temos que estar atentas e fortes.

A luta das mulheres por garantias de direitos trouxe ao longo do século XX e neste século, inúmeras conquistas: direito ao voto, direitos reprodutivos, direito ao espaço público, direito à educação, direito ao trabalho, direito a salários iguais para realização da mesma tarefa, direito a ocupar cargos de poder, entre tantas outras lutas e conquistas. Tais conquistas, no entanto, estão sempre ameaçadas.

Mas por quê? Por que as mulheres e os seus direitos estão sempre na berlinda? O modelo patriarcal de sociedade explica os retrocessos, as ameaças diárias. Nele, as mulheres são vistas como objetos, não como pessoas autônomas com os mesmos direitos que os homens.&nbsp; 
É neste modelo de sociedade que estão sedimentadas as estruturas de religião, da economia, da cultura. Como superar preconceitos, discriminações, desigualdades, se nossa sociedade reproduz todos os dias modelos machistas, misóginos, excludentes de sociedade?

Tal modelo é responsável pelos índices de violência contra as mulheres, que hoje alcançam números pandêmicos. De acordo com pesquisa do Datafolha, um em cada quatro brasileiros conhece uma mulher vítima de violência doméstica, cometida pelo próprio parceiro.&nbsp;

Rose Marie Muraro, matriarca do movimento feminista brasileiro, nos ensina que “devemos mostrar que a violência contra a mulher é mais importante que a violência contra o homem, porque é a primeira violência que a criança vê desde que nasce e a partir daí, ela aceita todas as violências”. Ou seja, para superarmos a violência contra a mulher, precisamos educar o olhar de nossas crianças, desnaturalizando o que elas acostumaram desde pequena a aceitar como normal: ver sua mãe apanhando e, consequentemente, crescer aceitando este mesmo tratamento, ou se tornando um agressor de mulheres.

Assim como educar as crianças, precisamos educar os adultos, colocar em prática o que está previsto na Lei Maria da Penha. Dezenove anos passados da sua promulgação, um dos maiores desafios para sua efetivação é o Estado. São órgãos que negligenciam, ignoram e prevaricam.&nbsp;

Entre criação e extinção de secretarias, conselhos desestruturados, nos deparamos com delegacias que não funcionam, casas de acolhimento que existem só no papel, hospitais que se negam a acolher as vítimas de violência doméstica e sexual e juizados que ignoram o que está previsto em lei.

No mês dedicado às mulheres, só nos resta esperançar na luta diária contra o patriarcado e os retrocessos, e sim, parafraseando Fernanda Torres, as vidas das mulheres prestam!

Geralda Cunha, radialista, jornalista e ativista pelos direitos humanos

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A vida da mulher presta!

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Geralda Cunha

O filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, encerra um capítulo da nossa história, e abre tantos outros quanto ao debate do papel da democracia no Brasil. Acima do enredo bem contado, e por detrás das cortinas e dos sets de gravações, existe uma Brasil quase perdido na história, que ainda perdura sobre décadas e que será levado em discussão nas eleições de 2026.

Afinal, quão fortalecido está o nosso regime político, em uma época que se levantam cartazes de “volta à ditadura” e “abaixo às instituições”?

A história real que virou entretenimento precisou ser montada por um dos maiores produtores, interpretada por uma das seis melhores atrizes do mundo de 2025 e assistida por milhões de expectadores por pelo menos sete dias consecutivos em uma das cinco áreas metropolitanas consideradas pela Academia em Angeles, na Bay Area (que inclui a cidade de San Francisco), Nova York, Chicago, Dallas-Fort Worth e Atlanta para entender que o Brasil requer cuidados imediatos, quando se toca no assunto democracia.

A vida de Rubens Paiva certamente representou percentual mínimo, diante dos silentes ao sistema que abarcou a pior tortura e momento obscuro do país, que foi a perca da liberdade cotidiana de um povo que sempre lutou pro dia nascer feliz.

A fotografia dos anos setenta, traduzida sob uma vida bem mais pacata das cidades expôs a violência política traduzida em uma aristocracia – não apenas militar, mas também civil – que ainda luta para permanecer no poder, como se todas as outras classes, incluindo a artística não seguissem o roteiro da vida como ela é, ou deve ser.

No jogo da vida real, o assunto democracia é coisa séria e vai além das barreiras transponíveis das vontades individuais. Ao se realizar “comédia no cinema com as suas leis”, a classe burguesa sem religião, ora criticada, agora aplaudida, assegurou o futuro de uma nação que passados mais de 50 anos, ainda luta por liberdade e, ainda a tem relativizada pelas próprias instituições como meio de controle político.

A história do Brasil possui muitos capítulos e, na semana em que escolas de samba lançam carro alegórico com indígenas segurando a cabeça de Dom Pedro, a democracia, sem os recortes que são produzidos pela internet, não ficou calada com as coisas que viram no conforto e na acomodação. Lançou mão da arte para, sem filtros, mostrar para o mundo os abusos sofridos por aqueles que se opunham a um regime, que como a história, contrasta os momentos iniciais de alegria, quando a família está unida e cheia de expectativas para o futuro, mas que, no fim das contas, quem paga é a liberdade.

Atrás das câmeras existe uma discussão internacional em que liberdade e democracia são protagonistas entre passado e futuro, que se repete na Alemanha, França, EUA e no Brasil.

É preciso dar um jeito quando torturadores ainda são vistos como heróis. Não é o filme, não é a direita conservadora, não é esquerda libertária. É a vida como ela é.

A democracia requer urgência sem encenação. Políticos não são heróis, mas dirigentes de um filme em que a liberdade deve ser a única premiada.

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Danubio Cardoso Remy é advogado&nbsp;&nbsp;e servidor público. Mestre em Ciência do Direito

É preciso dar um jeito no futuro

Danubio Cardoso Remy

O Brasil tem alcançado recordes sucessivos na exportação de alimentos, impulsionado por supersafras que fortalecem a economia nacional e geraram 103 milhões de postos de trabalho. O crescimento de 3,4% ao ano e a expansão da renda acima da inflação demonstram um avanço econômico significativo.

No entanto, a inflação dos alimentos continua sendo um desafio para a população, que enfrenta dificuldades para ver uma redução consistente nos preços. Dados do IBGE mostram que a inflação dos alimentos tem sido uma questão persistente. Em 2019, a taxa foi de 7,82%, subindo para 18,16% em 2020. Houve uma queda para 8,23% em 2021, mas voltou a subir para 13,21% em 2022.

Em 2023, houve uma deflação de 0,52%, mas em 2024 a inflação alimentar voltou a subir para 8,22%. Em fevereiro de 2025, o IPCA indicou uma variação acumulada de 6,88% nos últimos 12 meses, mantendo a alimentação como um dos principais itens de peso no orçamento das famílias, representando 19,5% dos gastos.

O governo e setores produtivos têm discutido formas de enfrentar essa volatilidade. Algumas soluções propostas incluem subsídios, ampliação da oferta de alimentos, redução de gargalos logísticos e melhorias na distribuição. A instabilidade climática também é uma preocupação, pois pode comprometer a produção e elevar os preços.

Esse problema não é exclusivo do Brasil. Países como Estados Unidos e Canadá, reconhecidos por sua eficiência agrícola, também enfrentam alta nos preços. O mercado global influencia diretamente os custos dos alimentos, especialmente por meio das commodities e da taxa de câmbio.

Congelamentos de preços, como os do Plano Cruzado, já demonstraram ser ineficazes. Em contrapartida, o controle de estoques, adotado pelo Japão, e a transferência de renda para populações vulneráveis são alternativas viáveis para garantir o acesso aos alimentos.

A busca por um equilíbrio entre segurança alimentar interna e compromissos internacionais é fundamental. O Brasil, como um dos maiores produtores de alimentos do mundo, deve assumir uma posição de liderança nas discussões sobre o combate à fome global, promovendo políticas que incentivem a produção sustentável e garantam o abastecimento interno sem comprometer sua competitividade internacional.

Políticas públicas devem equilibrar a produção para exportação com a garantia de abastecimento interno. Investimentos em infraestrutura, como ferrovias e rodovias para escoamento da produção, são fundamentais para reduzir os custos logísticos e estabilizar os preços.

Medidas inovadoras, como o “cashback de alimentos”, previsto na reforma tributária, poderiam aliviar o impacto da inflação para famílias de baixa renda, devolvendo impostos pagos sobre produtos essenciais. Somente com soluções estruturais e planejamento de longo prazo será possível conter a alta dos preços e garantir acesso adequado à alimentação para toda a população.

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Jeferson de Castro Vieira é&nbsp;economista, consultor de negócios e professor de economia e do mestrado em desenvolvimento regional e direito à cidade da PUC- GO

Desafios na inflação de alimentos

Jeferson de Castro Vieira

Qual relação da pretensão da Câmara de Aparecida de Goiânia de comprar 25 celulares da marca e modelo iPhone 16 Pro Max 512 GB, para serem distribuídos aos vereadores – a compra foi suspensa nesta quarta-feira (12) pela Justiça a pedido do Ministério Público – e o racha dos parlamentares goianos no Congresso Nacional acerca da eleição do coordenador da bancada? Dinheiro público. No primeiro caso, a Câmara pretendia gastar R$ 293.590 para adquirir os aparelhos. Já a história da bancada é mais complexa.

A deputada federal Flávia Moraes (PDT) coordena a bancada desde 2019 e se candidatou à reeleição. Desta vez, contudo, há uma preocupação entre deputados federais, todos candidatos à reeleição, com a máquina política montada pelo presidente da Assembleia Legislativa, Bruno Peixoto (UB), que também disputará uma vaga na Câmara Federal em 2026, e a suspeita de que Flávia, casada com o deputado estadual George Moraes (PDT), não agiria para conter possíveis as ações de Bruno Peixoto sobre as bases dos atuais deputados.

Assim, o deputado José Nelto (PP) disputou e venceu a eleição por um voto, mas não levou, por falta de assinaturas da maioria dos senadores na ata de registro do novo coordenador junto à Comissão Mista do Orçamento do Congresso Nacional. Flávia quer nova eleição, mas Nelto bate o pé. Ele quer sanar o problema da ata e salvar sua vitória.

A estrutura política que leva deputados federais a temer uma possível concorrência desigual com Bruno Peixoto são os milhares de cargos da Assembleia – 4.319 até o final de 2024, para ser mais exata –, além dos 170 criados neste ano para contratar ex-vereadores e ex-prefeitos que encerraram seus mandatos no fim do ano. Essas lideranças do interior são multiplicadoras de votos para candidatos. Ainda que o presidente compartilhe esses cargos com os colegas deputados, ele dispõe de uma boa fatia deles, sem contar que comanda as ações realizadas pela Assembleia nos municípios para, supostamente, levar serviços públicos à população.

O empoderamento dos legislativos aconteceu pelo acesso dos parlamentares a mais verbas públicas. Tanto por meio das emendas impositivas, que os legislativos estaduais e municipais copiaram do Congresso, como pelo uso que dão a seus duodécimos. De acordo com a Secretaria de Economia, a Assembleia recebeu R$ 877,92 milhões em 2024, ou 1,89% da receita total do Estado, de R$ 46,4 bilhões. Ao Executivo couberam 77,25% da receita total, menos que em 2023, quando ficou com 78,16%. O Judiciário aumentou sua participação de 8,07% para 10,29%.

Agora, os Poderes Legislativo e Judiciário e os órgãos independentes (Defensoria Pública, Ministério Público, TCM e TCE) não precisam devolver ao Executivo o saldo financeiro superavitário apurado em balanço anual, como são obrigados a fazer os legislativos municipais. Em acórdão publicado em dezembro o TCE alterou entendimento anterior e deixou a critério da direção dessas instituições a decisão de devolver ou não as sobras financeiras do ano. Assim, os deputados conquistaram poder total sobre a poupança da Casa, de R$ 400 milhões.

E dinheiro público em Parlamento retorna em benefícios a seus membros, daí a superestrutura política que tanto assusta os deputados federais. E isso implica em outros gastos, como as SUVs de luxo que a Assembleia está adquirindo para cada um dos 41 deputados, em substituição às caminhonetes com menos de dois anos de uso que eles têm.

Diante de tudo isso, os 25 celulares pretendidos pelos vereadores aparecidenses até parecem café pequeno. Mas é mais do que isso: é a repetição em miniatura de atos que eles detectam em casas congêneres.

Quando são chamados a explicar gastos desnecessários (celulares e SUVs) ou com a criação de mais e mais cargos políticos, os parlamentares dão a mesma justificativa, a de que não haverá aumento de despesa, porque seu Poder tem duodécimo. É bom contudo designar corretamente as coisas: o duodécimo que sai do caixa do Estado e vai para qualquer órgão e poder é dinheiro arrecadado do contribuinte, quer dizer do cidadão, porque ele não nasce em árvore nem brota da terra.

Cileide Alves, jornalista

iPhones, SUVs e os Legislativos

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Cileide Alves

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O ano de 2015 foi marcante para a questão ambiental no planeta. Dois grandes acordos foram estabelecidos pelos 193 Estados-membros das Nações Unidas. Em 25 de setembro daquele ano, a ONU divulgou amplamente os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), com 169 metas globais a serem atingidas até o ano de 2030.

Esses objetivos têm como propósito erradicar a pobreza e a fome, combater as desigualdades, garantir uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, proteger o meio ambiente e enfrentar as mudanças climáticas. Além disso, busca-se promover a paz e a justiça, estimulando parcerias globais.

Infelizmente, temos muito mais objetivos e metas do que ações e resultados concretos.

Poucos dias depois, em 11 de dezembro de 2015, na COP 21, em Paris, foi adotado um novo acordo com o objetivo central de reduzir a emissão de dióxido de carbono a partir de 2020, em resposta à ameaça das mudanças climáticas.

No entanto, temos mais gases de efeito estufa na atmosfera hoje do que em 2015. De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), em 2015, os níveis de CO2 estavam em torno de 400 partes por milhão (ppm). Em 2023, esses níveis atingiram 420 ppm. Engatamos uma ré!

Apesar dos grandes acordos, os poucos avanços têm sido limitados e pontuais. O acesso à educação de qualidade ainda é bastante limitado, principalmente em regiões de conflito e entre populações marginalizadas. A falta de saneamento básico adequado continua afetando milhões de pessoas, especialmente nas áreas rurais e em países em desenvolvimento. O desmatamento segue em níveis alarmantes, e a perda de biodiversidade avança rapidamente.

O ano de 2030 está chegando, e o cenário não é nada animador.

Em tempos de miséria e guerra, a última coisa que importa é a questão ambiental. Indira Gandhi, ex-primeira-ministra da Índia, declarou durante sua participação na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, em 1972, que “o maior inimigo do meio ambiente é a pobreza”. O aumento dos preços dos alimentos, as mudanças climáticas e a falta de infraestrutura afetam negativamente a fome em várias regiões do planeta, especialmente na América Latina e na África.

A guerra entre a Rússia e Ucrânia tem gerado um aumento no uso de fontes de energia mais poluentes, como o carvão, devido à interrupção do fornecimento de gás natural e petróleo. A guerra civil na Síria, iniciada em 2011, destruiu vastas áreas de infraestrutura, afetou as políticas ambientais e as práticas de gestão dos recursos naturais do país, como a água e o solo. Além desses conflitos, diversos outros persistem e se alastram duramente pelo planeta.

Se não há respeito à vida, se não há respeito à paz, se não há respeito às pessoas, como falar sobre respeito ao meio ambiente?

Emiliano Lobo de Godoi, professor da Escola&nbsp;de Engenharia Civil&nbsp;e Ambiental da Universidade Federal de Goiás (UFG)