O último Censo Agropecuário do Brasil apresenta um quadro bastante interessante do financiamento no agronegócio brasileiro nos últimos anos, que permite uma leitura crítica sobre o acesso a recursos financeiros e oferece conclusões e lições importantes em relação aos obstáculos entre a produção e o crédito.

De acordo com o estudo, percebe-se que a origem dos financiamentos é de recursos governamentais e bancários, em sua maioria. Essas duas formas pressupõem que a concessão do crédito seja formalizada por meio de certos requisitos burocráticos específicos, como a regularidade fiscal e a estruturação formal da empresa.

Caso considerarmos os dados do próprio Censo, que indicam mais de 90% dos produtores agropecuários sejam pessoas físicas, fica evidente a falta de estruturação empresarial dos produtores rurais como o primeiro obstáculo para a obtenção de financiamentos.

A lei brasileira não permite a geração de uma estruturação social mais simples e adequada à realidade do agro, principalmente para os produtores que sempre operaram como pessoa física. Além disso, os benefícios fiscais concedidos ao setor tendem a ser passageiros e não incentivam a conversão da pessoa física para a jurídica.

É válido ressaltar que a adaptação dos tipos societários tradicionais já aconteceu em outros segmentos. Com relação ao agronegócio brasileiro, enquanto não existir uma fôrma jurídica que contemple as especificidades do setor, haverá o obstáculo que os formatos tradicionais representam para o produtor rural.

Logo, acessar um financiamento, levando em consideração o capital de uma empresa fechada (sem valores mobiliários no mercado de capitais), normalmente é possível apenas por meio de contratos de empréstimos tradicionais. Caso existisse uma simplicidade nos modelos legais para que o produtor pessoa física pudesse converter-se em jurídica, haveria também um acesso mais facilitado ao crédito.

Além desse fator, há a questão de que os modelos societários tradicionais começam a ser desafiados pela economia digital com seus sistemas regulatórios e suas especificidades que transcendem o âmbito de um território nacional. E nesse novo mercado, há uma boa oferta de crédito, tão vital ao agronegócio.

Para driblar esses desafios, faz-se necessária a estruturação dos produtores de maneira juridicamente sólida no ambiente digital, indicação com relação às negociações no âmbito digital e o uso dos meios de pagamento digital para buscar financiamento para a produção. Dessa forma, deve ser feito com o viés da legalidade no direito brasileiro e precisa ser pautado em um bom aconselhamento jurídico que esteja conectado tanto à realidade do produtor quanto ao universo financeiro digital.

Portanto, a inteligência jurídica é a chave para que os empresários do agronegócio possam cumprir as exigências formais para a obtenção do crédito disponível no Sistema Financeiro Nacional de maneira simplificada, ao mesmo tempo que se preparam para buscar o crédito na nova economia digital.

Jayme Petra de Mello Neto, advogado, especialista em Direito cível e societário

Financiamento no agronegócio

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Jayme Petra de Mello Neto

As Circunscrições Judiciárias Militares (CJM) completam, em 2024, 104 anos, tendo sido criadas, por meio de Decreto, em 30 de outubro de 1920. Formam a primeira instância da Justiça Militar da União (JMU), instituída em 1º de abril de 1808. Mesmo sendo a justiça especializada mais antiga do País, a Justiça Militar da União, que tem no Superior Tribunal Militar (STM) a sua segunda instância, é pouco conhecida e muitas dúvidas pairam sobre o seu papel no Poder judiciário.

Como exemplo, é rotineira a desinformação de que a Justiça Militar existe para julgar militares. A justiça castrense, como também é conhecida, existe para processar e julgar cidadãos, militares ou civis, que venham a cometer crimes militares definidos em lei. A afirmação de que militares só podem ser julgados pela Justiça Militar também é falsa. Se o militar vier a cometer um crime comum, ele será julgado pela Justiça Comum e não pela Justiça Militar.

São doze as CJM existentes no País, divididas em auditorias cada uma delas com dois juízes federais, que são civis e concursados. A Auditoria da 11ª CJM, por exemplo, sediada em Brasília-DF, tem como área de jurisdição os estados de Goiás e Tocantins, além do Distrito Federal.

Via de regra, é na Circunscrição Judiciária Militar que tem início o julgamento de um crime militar, cabendo o recurso ao STM. Caso o réu seja militar, será julgado por um Conselho de Justiça composto por quatro oficiais, sorteados, que poderão ser da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, presidido pelo juiz federal daquela Auditoria. O réu, quando civil, será julgado, de maneira monocrática, pelo juiz togado.

Em seus 104 anos de existência, as Circunscrições Judiciárias Militares tiveram destacada participação em julgamentos de militares e civis que participaram de fatos de grande repercussão. Marcha dos 18 do Forte de Copacabana, Revolução Constitucionalista, greves do ABC Paulista, caso Riocentro e o motim de controladores de voo são alguns exemplos.

A JMU participou, também, da Segunda Guerra Mundial, quando duas auditorias foram criadas junto à Força Expedicionária Brasileira (FEB). Durante o conflito, entre outros crimes, dois autores de homicídios dolosos foram condenados à pena de morte, que, posteriormente, foi comutada para prisão.

Nesses 104 anos, as auditorias militares muito evoluíram e seguem acompanhando as mudanças que vêm alcançando o Poder Judiciário. Cito dois exemplos: estudo para a implantação do Juiz de Garantias e a tramitação no Congresso Nacional, de Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que trata do aumento de competências, onde são transferidos para a Justiça Militar os processos administrativos e disciplinares de militares que, atualmente, são julgados na Justiça Comum.

A atribuição maior da Justiça Militar da União é a de processar e julgar crimes militares e, assim, não permitir que os pilares básicos da vida militar, a hierarquia e a disciplina, possam ser afetados.

Didio Pereira de Campos,&nbsp;Coronel da Reserva do Exército e assessor de Comunicação Social do Superior Tribunal Militar (STM)

O papel da Justiça Militar

Didio Pereira de Campo

Autocracia, personalismo, militarismo, secularismo etc. são características comuns entre os regimes políticos da Síria da família Assad e da Líbia de Muammar Gaddafi. Não por acaso, caíram os dois: Gaddafi sucumbiu à Primavera Árabe, Bashar al-Assad, à fragilidade dos aliados, principalmente da Rússia e do Irã, envolvidos nas próprias guerras.

Mais do que a celebração do fim dos déspotas, o momento é de grande preocupação. Afinal, tendo a Líbia como exemplo, o futuro não é necessariamente mais promissor do que o passado.

A morte de Gaddafi resultou na divisão do país em dois governos: o Conselho Nacional de Transição e a coalizão de milícias islâmicas. A fragmentação entre os grupos rebeldes que tomaram o poder impediu a estabilidade política.

Apenas em 2021, estabeleceu-se um governo provisório, denominado de Governo da Unidade Nacional, para reunificar o país. Ainda assim, a incompatibilidade de interesses entre atores muito distintos dificulta essa reunificação e mantém ondas de violência no território líbio.

Já na Síria, a queda da família Assad, no poder há mais de 50 anos, foi vertiginosa. Em pouco mais de dez dias, uma coalizão de grupos rebeldes, liderada pela Organização pela Libertação do Levante (HTS), partiu de Aleppo e conquistou Damasco.

O anúncio da conquista da capital síria foi televisionado em rede nacional e percorreu o mundo. Nos dias seguintes, a cobertura midiática revelou as marcas da crueldade do regime, sobretudo, das prisões, como a de Saydnaya, onde eram torturados e mortos os presos políticos. O término de uma era violenta tornou-se um motivo de alívio para os sírios.

A apreensão agora fica em torno da transição para um novo governo. Primeiramente, não há clareza sobre a renúncia, de fato, de Bashar al-Assad à presidência da Síria. Mesmo asilado na Rússia, o ex-presidente ainda demonstra pretensões de retomar o poder.

Em segundo lugar, há dúvidas sobre o tom moderado adotado por Abu Mohammad al-Julani, líder do HTS, e de sua capacidade de lidar com grupos rebeldes que detêm orientações distintas, desde fundamentalistas até pró-ocidentais. Quem está à frente da transição é um grupo considerado terrorista, por exemplo, pelos Estados Unidos e União Europeia.

A derrubada do regime de Assad era o objetivo comum da coalizão rebelde. Uma vez alcançado esse objetivo, o jogo de interesses é mais complexo. Não se trata apenas de construir um novo regime político, e sim de como o manter estável e de preservar o território nacional unificado.

O projeto de um Curdistão livre a partir da Síria deve ganhar força, e as intervenções estrangeiras, sobretudo, de grandes potências e aliados, tendem a ser mais frequentes. Se, por razões domésticas, o êxito do governo transitório já seria pouco provável, ele é ainda menos provável quando se adicionam as tensões geopolíticas externas. O destino da Síria, portanto, pode ser repetir a tragédia da Líbia.

Giovanni Okado,&nbsp;professor de Relações Internacionais da PUC Goiás

Gabriela Alves Caxeta Lôbo,&nbsp;graduanda em Relações Internacionais pela PUC Goiás

Síria, a "nova Líbia"?

Giovanni Okado

A Câmara de Goiânia aprovou nesta semana a criação de 160 cargos comissionados e aprovou uma verba de R$ 15,5 mil para indenizar gastos de cada um dos 37 futuros vereadores com combustível, escritórios políticos etc., implicando em aumento de R$ 13,5 milhões nas despesas do Legislativo. Em meio ao pico do dólar, que chegou a bater R$ 6,30 na quinta-feira (19) por desconfiança do mercado com pacote fiscal do governo, a Câmara dos Deputados fez movimentos contraditórios.De um lado, limitou o crescimento em 2025 de receitas da educação e da saúde às regras mais restritivas do arcabouço fiscal e, de outro, permitiu correção pela inflação do recurso do Fundo Partidário, derrubou a possibilidade de corte das emendas parlamentares e impediu a criação de travas para os supersalários, com valores acima do teto constitucional de R$ 46 mil. O Congresso preservou seus gastos.Projetos de lei que aumentam o orçamento para a atividade política, como o financiamento de partidos e das eleições, são daqueles que unem esquerda e direita, oposicionistas e governistas, bolsonaristas e lulistas, como se viu nesta semana em Brasília e em Goiânia e, certamente, em muitos legislativos municipais país afora. Os projetos que custarão mais R$ 13,5 milhões ao cidadão goianiense a partir de 2025 foram aprovados sem contestação, seja pelos oposicionistas Aava Santiago (PSDB), Katia Maria e Fabrício Rosa (ambos do PT), como pelo bolsonarista William Veloso (PL), e por governistas, a exemplo de Sabrina Garcez (Republicanos) e Anselmo Pereira (MDB), para citar alguns vereadores que transitam em todos os grupos internos.Fabrício Rosa se incomodou com a cobertura da imprensa. Observou em discurso no plenário que é normal o serviço público brasileiro pagar diárias a seus funcionários quando viajam a interesse público. Segundo ele, os vereadores terão o mesmo direito e a “imprensa criminaliza a política” ao dar a impressão de que haveria “malversação” desse recurso. Esqueceu de dizer que o servidor só recebe diárias em viagens autorizadas previamente por superiores e que, diferentemente, os vereadores contarão com a verba fixa de R$ 15,5 mil e mensalmente, para qualquer despesa, incluindo custos de escritório político na cidade onde exerce seu mandato e onde já dispõe de gabinete público.A falsa relação entre altos gastos com a oferta de bons serviços à população é usada pelo presidente da Assembleia Legislativa, Bruno Peixoto, para justificar os 5 mil servidores comissionados da Casa, para trocar as seminovas caminhonetes dos 42 deputados estaduais pela mesma quantidade de SUVs zero-quilômetro, e igualmente pelo presidente da Câmara de Goiânia, Romário Policarpo (Patriota), ao justificar a criação de 160 novos cargos.Ressalvadas as exceções, boa parte desse trabalho de sol a sol e de aumento de orçamento para sustentar a atividade política guarda pouquíssima relação com a qualidade do trabalho entregue à população. Os parlamentares se ocupam mais em realizar sessões solenes para entregar medalhas e diplomas, em picotar recursos orçamentários para destinar a prefeituras e ONGs, algumas de má reputação, do que em fiscalizar os Executivos, propor projetos relevantes – que sejam legais e constitucionais –, e em barrar iniciativas de colegas e do chefe do Executivo sem interesse público.Em outras palavras, o Brasil necessita de bons parlamentares e de um bom Parlamento e dispensa parlamentares que querem mais e mais dinheiro público a pretexto de melhorarem seus mandatos. Fica aos vereadores que tomarão posse dia 1º a dica do futuro vereador Vitor Hugo (PL), ao discursar em nome dos 37 diplomados pela Justiça Eleitoral nesta quinta-feira (19) em Goiânia: “Sejamos os mais técnicos e detalhistas possível na análise das proposições legislativas que nos forem submetidas, de origem parlamentar ou extraparlamentar, de maneira que o resultado dessa apreciação, quando somado à moderação política tão necessária, seja a disponibilização de uma legislação mais humana, concreta, eficaz e transformadora”. Que não seja apenas retórica!

O desassombro dos parlamentares

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Cileide Alves

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A Universidade Federal de Goiás (UFG) completa 64 anos tornando-se uma referência em ensino, pesquisa e extensão. Com uma comunidade acadêmica de cerca de 40 mil pessoas, oferta 109 cursos de graduação, mais de 200 cursos de pós-graduação (doutorados, mestrados e especializações) e, ainda, a educação básica.

Com a recomposição orçamentária no governo Lula, a UFG deixou de ser refém do déficit orçamentário e iniciou 2024 com suas contas básicas de custeio equilibradas. O resultado é que a instituição voltou seu foco para as ações estruturantes e retomou as obras de manutenção e recuperação do espaço físico.

No Programa de Aceleração do Crescimento para as Universidades, a UFG foi contemplada com o restaurante universitário do campus Aparecida de Goiânia; o Centro de Aulas do campus Cidade de Goiás; e a aldeia intercultural, um espaço para estudantes indígenas, no campus Samambaia, em Goiânia. Além disso, a UFG foi a única, no Centro-Oeste, a ser contemplada com um novo campus, que será em Cidade Ocidental e cuja sede provisória foi inaugurada em 14 de dezembro, aniversário da UFG. Serão ofertados os cursos Engenharia de Software, Administração Pública, Gestão em Segurança, Segurança Cibernética, Gestão em Saúde Digital e Inteligência Artificial para Gestão Pública.

Nossa instituição é a primeira da Região Centro-Oeste no que se refere às citações científicas de alto impacto, em acesso aberto, segundo o prêmio Capes/Clarivate. Soma-se a isso, o fato de que 75% dos cursos de graduação avaliados pelo MEC, em 2024, obtiveram nota máxima. A excelência na graduação, na pesquisa e na extensão é reconhecida nacional e internacionalmente, posicionando a UFG entre as 5% maiores e melhores universidades do mundo.

Esse reconhecimento se reflete nas parcerias e no financiamento das agências de fomento. Em 2024, somente junto aos editais da Finep, agência federal de inovação, a UFG aprovou projetos que somam cerca de R$ 50 milhões. A Universidade conta, também, com apoio continuado de parlamentares das três casas legislativas.

Recentemente, criamos o Observatório dos Povos Indígenas de Goiás; ampliamos a parceria com a China e somos uma das três universidades brasileiras a integrar o Pacto Global de Combate à Fome. Na área de saúde, foram mais de 700 mil procedimentos realizados em 2024 pelo Hospital das Clínicas e os serviços do Centro de Referência em Oftalmologia (Cerof) passaram a ser regulados pelo Estado, agora com a possibilidade de atender todas as cidades goianas.

A UFG ainda formou a primeira turma do Bacharelado em Inteligência Artificial do Brasil, passou a abrigar um Centro de Competência em Tecnologias Imersivas para Mundos Virtuais e sedia o mais avançado laboratório de computação de alto desempenho na região, o LaMCAD.

Esse cenário sinaliza que a UFG de hoje está honrando os 64 anos de história e dando substância ao sonho de Colemar Natal e Silva, que vislumbrou uma Universidade para Goiás e para o Brasil. Os desafios são imensos, mas não há espaço para o pessimismo.

Angelita Pereira de Lima, reitora da Universidade Federal de Goiás (UFG)