Engana-se quem pensa que uma empresa tem apenas uma função: gerar lucro. A verdade é que a função de uma empresa na sociedade vai muito além disso. As organizações empresariais são canais para o desenvolvimento social das comunidades em que estão inseridas, sendo necessário que ela contribua positivamente para a redução das desigualdades, que promova o bem-estar social.

Estes princípios não são novos e, inclusive, estão previstos na Constituição Federal de 1988 e no Código Civil. Estas normas impõem deveres e obrigações às empresas e o seu cumprimento, além de ser legal, é bem-visto no mercado interno e externo, como uma boa prática de governança, com foco no ESG, sigla, em inglês, para Environmental, Social and Governance (Ambiental, Social e Governança).

As empresas contribuem com a sociedade por meio da geração de empregos, geração de impostos e no cumprimento da legislação que protege o meio ambiente e as pessoas. Mas muitas estão indo além disso e, com visão de longo prazo, estão investindo em iniciativas que, em princípio, parecem estar fora deste escopo, mas, na verdade, geram valor para o futuro.

Goiás também avança neste sentido. Um exemplo vem do grande empresário e filantropo, Elon Soares, falecido recentemente. Ao longo de sua vida, contribuiu com a economia de Goiás ao transformar a rede de materiais de construção, fundada em 1967 em sociedade com o irmão, em uma holding com atuação em diversas áreas como agronegócio, incorporação imobiliária, tecnologia e investimentos. São mais de 600 colaboradores atuantes nas empresas do Grupo Soares atualmente, que são valorizados, respeitados e estimulados ao crescimento profissional.

E ele foi além. Em seus últimos dias, Elon Soares estava acompanhando as obras daquele que considerava ser o seu maior legado, o Instituto Elon Soares, projeto que continua em andamento e deve ser inaugurado ainda neste ano. Com sede em Trindade, ele terá o objetivo principal oferecer apoio aos jovens com a promoção de atividades gratuitas, como cursos de iniciação profissional para atender às principais demandas do mercado de trabalho, principalmente na área de construção civil, que é um dos braços da atuação empresarial do grupo.

Elon desejava que jovens sejam estimulados ao empreendedorismo, jornada que ele começou a trilhar ainda menino, e chegou ao sucesso. Talvez, por ele ter vivido as dificuldades de iniciar um negócio do zero, Elon desenvolveu a sensibilidade em relação à nova geração e se propôs a fazer algo genuíno para quem está começando.

O que muitos podem entender ser apenas um projeto pessoal ou um gasto para o caixa da empresa, são pilares que sustentam toda uma cadeia produtiva: profissionais capacitados, jovens visionários, futuros empreendedores, pessoas que vão dar continuidade ao desenvolvimento econômico e social. Responsabilidade social é isso: é dividir para multiplicar.

É entender que compartilhar é o novo imperativo da competitividade empresarial. Quanto mais conhecimento e oportunidades acontecerem no jogo do mercado, mais desenvolvidos seremos. É um ciclo virtuoso e sem fim, cujo lucro todos colhem.

Marcelo Camorim, economista e bacharel em Direito. Especialista em governança corporativa e sucessão familiar. Presidente do Conselho de Administração e de Família do Grupo Soares.

Os artigos publicados não refletem a opinião de O POPULAR. Sua publicação obedece ao propósito de estimular e fomentar a diversidade e o debate de temas locais, nacionais ou mundiais.

Muito além do lucro

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Marcelo Camorim

Se o encontro nada casual entre Trump e Lula na abertura da Assembleia Geral da ONU selou o cessar fogo entre EUA e Brasil, ou melhor, dos EUA contra o Brasil, a conversa de meia hora entre os dois presidentes, nesta segunda feira, foi mais do que uma ótima surpresa para o governo brasileiro e a indústria nacional: abriu uma avenida de negociações e acertos bilaterais.

Lula considerou a conversa “excepcional”, mas quem consolidou essa sensação no governo, no Brasil, nos EUA, quiça mundo afora, foi o próprio Trump, antes tão belicoso, agora simpático com Lula e acenando com uma aproximação para valer: “Nossos países vão se dar muito bem juntos”, divulgou pela internet, após a conversa, que classificou como “ótima”.

Experts em distribuir charme e criar intimidade, Trump e Lula conversaram mais e melhor do que o previsto, com troca de seus telefones privados, brincadeira sobre a idade de ambos e anúncio de um encontro olho no olho, que Lula sugere ser na Malásia, no fim do mês, à parte da reunião da Asean (bloco do Sudeste Asiático), e Trump não descarta ser nos EUA, no Brasil ou nos dois.

O centro da conversa, negociada com discrição, detalhes e boa vontade lado a lado, foi o comércio, já que Brasil e EUA perdem com um tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros, mas Lula também pediu o fim da proibição de vistos americanos para autoridades brasileiras, do Executivo e do Judiciário.

Foi um início de conversa, mais um passo depois do encontro e da “química” em Nova York, e pode ir longe. Nada foi decidido objetivamente no telefonema dos dois presidentes, e nem era essa a intenção, mas o caminho está aberto e o ambiente, desanuviado. As previsões são bastante otimistas.

Marco Rubio será o líder das negociações que vêm por aí, ou que vão simplesmente continuar, e foi recebido como um ponto negativo, já que é um dos mais radicais de um governo já tão radical. Planalto e Itamaraty, porém, trataram de minimizar: o importante é que Rubio é o secretário de Estado, tem força e é próximo de Trump. Além disso, os três negociadores brasileiros, Alckmin, Mauro Vieira e Haddad, são habilidosos, sabem ouvir e falar na hora certa, no tom certo. Agora vai?

Se Brasil e EUA “vão se dar muito bem juntos”, com a aproximação Lula-Trump, quem é que vai se dar mal? Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro e, com eles, o bolsonarismo, que está definhando nas ruas, perdendo força no Congresso e foi desmascarado mundo afora, e agora em Washington: “caça às bruxas”, “censura”, “autoritarismo” e “comércio desleal” com EUA não passavam de... fake news. Trump, enfim, caiu na real.

Eliane Cantanhêde, jornalista

Trump, enfim, caiu na real

Eliane Cantanhêde

A cada temporada de estiagem, os incêndios florestais voltam a assombrar o Brasil. Cerrado, Amazônia, Pantanal e Mata Atlântica sofrem com chamas que destroem habitats, ameaçam comunidades e comprometem o equilíbrio climático. Entre janeiro e agosto de 2025, o país registrou a quinta maior área queimada desde 2003, ano em que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) iniciou o monitoramento.

Enquanto o Brasil pega fogo, ambientalistas de escritório e políticos oportunistas viajam de avião para grandes eventos, em auditórios climatizados, para discutir as mudanças climáticas. As manchetes falam em recordes de queimadas; os ambientalistas criticam a poluição; os políticos fazem seus discursos. Porém, raramente alguém se lembra de quem está na linha de frente contra o fogo: os brigadistas florestais.

Homens e mulheres que, munidos de enxadas, sopradores e mochilas costais, se embrenham em áreas de difícil acesso para deter um inimigo voraz e imprevisível. São eles que, longe dos holofotes, impedem que milhares de hectares virem cinzas e que comunidades inteiras sejam devastadas. Heróis anônimos e voluntários que, muitas vezes, sequer têm seus nomes lembrados quando as chamas cessam.

Mas o heroísmo tem custado caro. Em 2024, um brigadista morreu no Xingu em combate direto às chamas. Em Brasília, em 2025, dois brigadistas morreram carbonizados durante um incêndio de grandes proporções. Em Minas Gerais, uma brigadista sofreu queimaduras graves ao cair em uma fenda durante o combate. Esses casos, entre tantos outros, mostram que o risco não é uma possibilidade: é parte da rotina.

A realidade dessas pessoas é marcada por trabalhos voluntários, contratos temporários, salários baixos, falta de treinamento e equipamentos de proteção que muitas vezes não correspondem à gravidade da missão que assumem. A precariedade contrasta com a grandeza do que fazem: proteger biomas que concentram a maior biodiversidade do planeta e garantir serviços ambientais essenciais, como a regulação climática e a preservação das águas.

Por isso, dizer “obrigado, brigadistas” precisa ir além do reconhecimento simbólico. É um chamado à responsabilidade. Cabe ao poder público investir em prevenção, estruturar brigadas permanentes, assegurar remuneração justa e fornecer treinamento e equipamentos de qualidade. À sociedade, cabe não apenas aplaudir, mas compreender que cada árvore preservada, cada nascente protegida e cada vida salva representam o esforço — e, muitas vezes, o sacrifício — desses homens e mulheres.

Enquanto houver guardiões como Iara, Uellinton, Manoel, Valmir e tantos outros, que se lançam ao fogo para salvar florestas, rios e comunidades, a esperança permanecerá acesa. Mas não podemos permitir que essa chama dependa apenas da coragem de alguns. É preciso que seja alimentada por políticas firmes e por um pacto coletivo de cuidado e valorização, para que o sacrifício de hoje se transforme em futuro protegido. Os brigadistas já fazem a parte deles. É hora de fazermos a nossa!

Emiliano Lobo de Godoi, professor da Escola de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal de Goiás

Os artigos publicados não refletem a opinião de O POPULAR. Sua publicação obedece ao propósito de estimular e fomentar a diversidade e o debate de temas locais, nacionais ou mundiais.

Na linha de frente contra o fogo

Emiliano Lobo de Godoi

O esporte é mais do que atividade física, lazer ou espetáculo. Reconhecido internacionalmente como direito humano fundamental, ocupa papel estratégico na promoção da dignidade, da saúde, da educação e da cidadania. No Brasil, porém, milhões seguem excluídos por falta de infraestrutura, políticas públicas e barreiras culturais.

O acesso universal ao esporte, sem distinção de classe, gênero ou condição física, ainda é um desafio. Em comunidades vulneráveis, a ausência de quadras, campos e iluminação impede a prática segura. Projetos enfrentam dificuldades para custear materiais, transporte e profissionais, o que limita a expansão. A falta de orçamento específico perpetua desigualdades.

O esporte também enfrenta barreiras culturais. Muitas vezes é visto apenas como lazer ou espetáculo, em vez de política pública essencial. Isso restringe sua potência de transformação. Crianças e jovens de baixa renda, mulheres, pessoas com deficiência e grupos discriminados acabam à margem, mostrando que o desafio também é cultural.

Quando entendido como direito humano, o esporte se torna instrumento de inclusão. No lazer, promove saúde, fortalece vínculos e oferece espaços de convivência. Na competição, desenvolve disciplina, resiliência e foco, além de abrir oportunidades sociais e profissionais. Em ambos os contextos, forma cidadãos capazes de transformar realidades.

Exemplos mostram como o esporte pode prevenir violações de direitos e apoiar processos de ressocialização. Atletas que retornam às comunidades como treinadores simbolizam a multiplicação de oportunidades, a valorização da autoestima e a criação de referências positivas. Essa dinâmica amplia horizontes e reforça que o esporte é educação, cidadania e pertencimento.

O combate a preconceitos como racismo, machismo e homofobia também passa pelo esporte. Ambientes esportivos ainda reproduzem desigualdades, mas podem se tornar espaços de resistência e transformação. Isso exige políticas claras, formação de profissionais conscientes e representatividade diversa. A educação em valores como respeito e equidade é essencial para que o esporte acolha todas as identidades.

Nesse cenário, organizações da sociedade civil mostram como esporte e direitos humanos podem caminhar juntos. Em Goiás, iniciativas sociais comprovam que prática esportiva e a defesa de direitos se complementam na missão de garantir inclusão e oportunidades, buscando formar não apenas atletas, mas cidadãos.

A responsabilidade é coletiva. O Estado deve assumir o esporte como prioridade, garantindo financiamento e infraestrutura. A sociedade precisa reconhecê-lo como ferramenta de cidadania, apoiando projetos e educadores. Já as empresas podem ampliar o alcance dessas iniciativas com parcerias e patrocínios.

Tratar o esporte como direito humano significa enxergá-lo além de medalhas e espetáculos: como dignidade, saúde, educação e futuro. Democratizar o acesso é formar cidadãos capazes de transformar suas histórias e a sociedade em que vivem.

Adriano Cristian Souza Carneiro, defensor Público Federal, professor de direito e gestão esportiva, é mestrando em Direito.

Os artigos publicados não refletem a opinião de O POPULAR. Sua publicação obedece ao propósito de estimular e fomentar a diversidade e o debate de temas locais, nacionais ou mundiais.

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Esporte é direito, não privilégio

Adriano Cristian Souza Carneiro

Na crescente atuação do terceiro setor na saúde pública brasileira, destaca-se o papel essencial das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e das Organizações Sociais (OSs) na gestão de unidades hospitalares e serviços de saúde pública. Essas parcerias têm como objetivo central assegurar atendimento eficiente, humanizado e contínuo à população. No entanto, a excelência na assistência à saúde só se sustenta quando acompanhada de uma sólida responsabilidade com os colaboradores.

Com esse olhar, ganha especial relevância um instrumento de governança e integridade cada vez mais valorizado na administração pública: a conta vinculada para o fundo rescisório. Trata-se de um mecanismo de proteção financeira que visa resguardar os direitos dos trabalhadores em caso de encerramento do vínculo contratual e de seus reflexos legais. Em outras palavras, podemos considerar a conta vinculada como um cofre de dupla checagem, onde a verba só pode ser movimentada em conjunto com o ente público.

A conta vinculada foi concebida como requisito nos contratos administrativos de prestação de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra. Embora tal previsão normativa se dirija aos contratos administrativos típicos, sua lógica é plenamente aplicável às parcerias firmadas com Organizações da Sociedade Civil, em especial com as Organizações Sociais da Saúde. A Lei Federal nº 13.019/2014 (Marco Regulatório das OSCs) e a Lei nº 14.133/2021 (Lei de Licitações) prestigiam os princípios da legalidade, moralidade, eficiência e prevenção de riscos, o que confere legitimidade à adoção de cláusulas que fortaleçam a segurança jurídica e trabalhista nos contratos de gestão.

A prática tem se mostrado uma estratégia eficiente para mitigar riscos de passivos que, por vezes, recaem sobre o próprio ente público — gerando ônus indevidos ao erário e prejuízos à continuidade dos serviços. Sua implementação evidencia não apenas conformidade legal, mas também um compromisso ético e digno com o trabalhador.

No terceiro setor, instituições como o Instituto Patris estão entre as pioneiras no cumprimento desses fundamentos e, fiéis à sua missão institucional, adotam a conta vinculada como política de governança obrigatória na gestão das unidades que envolvem a contratação de pessoal. A medida é executada em plena articulação com os entes parceiros e sob supervisão do controle social e administrativo, garantindo que os valores estejam sempre protegidos e disponíveis para eventual necessidade de rescisão contratual.

Num cenário em que se exige cada vez mais responsabilidade das instituições que atuam com recursos públicos, é preciso reconhecer e replicar boas práticas. A conta vinculada é uma delas. Mais do que uma previsão legal, ela é um símbolo de respeito ao trabalhador e ao interesse público — um elo de confiança entre a população, o Estado e as organizações do terceiro setor.

Vittor Galdino, advogado, é especialista em gestão de saúde pelo terceiro setor.

Os artigos publicados não refletem a opinião de O POPULAR. Sua publicação obedece ao propósito de estimular e fomentar a diversidade e o debate de temas locais, nacionais ou mundiais.

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