No tempo em que os bichos falavam, discutia-se o lugar do Brasil no mundo. Muita gente boa achava que o planeta se dividia em metrópole e periferia. Haveria uns poucos países desenvolvidos e uma penca de subdesenvolvidos; um centro branco e arrabaldes pardos, amarelos, pretos. Debatia-se como sair do atraso, passar da retaguarda à vanguarda. Em marcha acelerada ou devagarinho? Fazendo reformas de base ou dando uma garibada modernizadora? Na lei ou na marra? Imitando as metrópoles? Unindo os periféricos? Um dia, os bichos pararam de falar. Foi em 1964. Quando as toupeiras puderam sair da toca, a conversa era outra. O Brasil agora era um país “em desenvolvimento” -ou seja, encalacrado num limbo perpétuo. O progresso virara Fata Morgana, miragem. No plano simbólico, porém, o fascínio com as metrópoles prosseguiu, impávido. Subir ao pódio olímpico, ganhar a Copa do Mundo, o Oscar, o Nobel, são objetivos nacionais permanentes. Fazer bonito lá fora, nem que por um átimo, esconjuraria o complexo de vira-lata.