A Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) decidiu quebrar a ordem cronológica de pagamento (princípio da administração pública na relação com fornecedores e prestadores de serviço) e realizou o pagamento de R$ 4,9 milhões à empresa Maas Serviço LTDA. A justificativa da estatal foi garantir “a continuidade da execução dos serviços de limpeza urbana, gerenciamento de resíduos e urbanização” no âmbito do contrato com a Prefeitura.Em documentos publicados no Diário Oficial do Município (DOM) de 5 de setembro, a Comurg informou que, em 4 de julho, a Maas informou a iminente suspensão dos serviços por causa de inadimplência da companhia quanto a pagamentos anteriores a 2025. Na justificativa da quebra, a companhia afirmou que a estrutura de equipamentos fornecida pela Maas é “imprescindível”.De acordo com a companhia, “o quadro de equipamentos disponibilizado pelo referido contrato já se encontra reduzido, em razão das dificuldades financeiras enfrentadas pela Comurg, sendo que sua capacidade de faturamento está diretamente vinculada à quantidade de equipamentos disponíveis para a prestação dos serviços”.O valor cobrado pela empresa é referente a serviços prestados nos meses de agosto e de setembro de 2024 (R$ 2,47 milhões e R$ 2,43 milhões, respectivamente). As justificativas foram publicadas em dois despachos que têm textos semelhantes. A reportagem apurou que o valor já foi repassado à empresa e não houve interrupção do serviço. Os dados sobre despesas da Comurg não são publicados no Portal da Transparência da companhia. A reportagem entrou em contato com a Maas, mas não houve retorno até o fechamento desta edição. A empresa é ligada ao Grupo HP. Em nota, a Comurg confirmou a autorização dos dois pagamentos em atraso e argumentou que “assumiu dívidas geradas em gestões anteriores e, entre os prestadores de serviços, alguns deles se mantêm como fornecedores”. Segundo a Comurg, foram criados critérios para acerto dos valores em atraso e garantir os serviços prestados à população.ArgumentoNos documentos divulgados no DOM, a Comurg apontou que, em setembro de 2024 - durante a gestão do ex-prefeito Rogério Cruz (SD) -, foi publicado decreto municipal que declarou o encerramento do exercício financeiro de 2024. Com isso, aponta o despacho da companhia, houve a anulação dos empenhos vigentes, “inviabilizando, portanto, a liquidação e o pagamento das despesas daquele exercício”. Em seguida, os documentos citam decreto de janeiro de 2025 - gestão de Sandro Mabel (UB) -, que determinou a suspensão temporária de pagamentos de exercícios anteriores, que deveriam ser submetidos à análise da Controladoria-Geral do Município (CGM), assim como à verificação de disponibilidade orçamentária pela Secretaria Municipal da Fazenda (Sefaz) e à autorização do prefeito. O documento cita que o decreto foi publicado para resguardar a sustentabilidade financeira do município. A companhia também citou como argumento resolução própria que estabelece ordem de prioridade de pagamentos, sendo a primeira o pagamento de salários e de benefícios aos servidores, e, a segunda, “o pagamento de fornecedores essenciais, dentre os quais consta ‘locação de veículos”’.“Embora a ordem cronológica seja um princípio que deve ser obedecido pela administração pública, a supremacia do interesse público e a necessidade de garantir a continuidade de um serviço essencial à população sobrepõem-se, neste caso, à regra geral”, justificou a empresa. A Comurg alegou ainda que o não pagamento resultaria em um dano “muito maior” à coletividade, comprometendo a infraestrutura da cidade e a saúde pública. Contexto Desde o início da gestão de Mabel, a Comurg está sob um plano de recuperação e reestruturação, que prevê aporte de até R$ 190 milhões da Prefeitura para a companhia. Entre as medidas já implantadas estão a diminuição de comissionados e outras ações para diminuir a folha (como cortes em gratificações e demissão de aposentados). No início de agosto, a Prefeitura apresentou ao Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás uma proposta de Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) que estabelece medidas para “recuperação econômico-financeira, administrativa e operacional” da Comurg em dois anos. A medida foi um passo na tentativa de reverter a dependência financeira da empresa pública quanto à administração municipal, determinada pelo TCM-GO.