O secretário da Fazenda de Goiânia (Sefaz), Valdivino Oliveira, afirmou, nesta segunda-feira (24), que a Prefeitura não planeja usar o decreto de calamidade pública no âmbito financeiro para promover flexibilizações fiscais e reiterou o caráter didático da medida. No Paço Municipal, o instrumento também é visto como forma de resguardar a gestão no julgamento das contas de 2025, primeiro ano da gestão de Sandro Mabel (UB). “Se for necessário, é para isso que o ato existe”, disse o procurador-geral do Município, Wandir Allan de Oliveira.O decreto de calamidade financeira permite que a gestão realize atos excepcionais, como descumprir obrigações de despesa de pessoal, resultados fiscais e a ordem cronológica de pagamentos. Há também possibilidade de realizar contratações diretas e facilidades na hora de renegociar ou rescindir contratos, liberando a Prefeitura do pagamento de multas.“Não temos nenhuma intenção de realizar qualquer flexibilização fiscal. Nós não pretendemos quebrar a ordem de pagamentos, a ordem das licitações ou das compras de uma forma geral. Nós temos dito desde o primeiro dia que essa calamidade financeira é muito mais didática do que prática”, disse Oliveira. Segundo o secretário, a meta é macroeconômica. “(O objetivo é) a Prefeitura gastar menos do que arrecada, formar poupança para investir na cidade”, declarou o auxiliar. Ainda de acordo com Oliveira, Mabel determinou que em todos os anos de sua gestão a Prefeitura deve gerar pelo menos R$ 1 bilhão para serem investidos em obras na cidade, “para devolver ao cidadão que paga imposto os benefícios que o imposto pode lhe proporcionar”. No entanto, 2025 é considerado atípico. “Nós temos que resolver muitos problemas que vieram do ano passado”, afirmou. A expectativa é que os investimentos neste ano passem de R$ 1 bilhão, mas considerando recursos de operação de crédito.TrâmitesA Prefeitura decretou calamidade pública na Saúde e na Sefaz no início de janeiro. A medida foi acompanhada de ações administrativas, como renegociação de contratos e cortes de gastos. Em janeiro, a Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) aprovou a calamidade na Saúde, mas, seguindo parecer do Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás (TCM-GO), rejeitou o aval na área financeira.Após articulação do Paço, o tema voltou à Alego. O TCM-GO analisou novos documentos encaminhados pela Prefeitura ao Legislativo e, em novo parecer, informou que não há impedimento para a calamidade no âmbito financeiro, mas sugeriu condicionantes para garantir controle fiscal. O decreto foi aprovado pela Alego na semana passada, com vigência de 120 dias. No entanto, a sugestão para impor limites aos atos da Prefeitura neste período foi ignorada pelos deputados estaduais.De acordo com Wandir Allan, a necessidade de usar a calamidade financeira como justificativa será verificada quando as contas de 2025 forem analisadas. A avaliação é feita pelo TCM-GO e pela Câmara de Goiânia. O procurador-geral afirma que a aprovação do decreto pela Alego legitima as ações já tomadas e resguarda a administração.Em nota, o TCM-GO disse que a Alego é soberana em suas decisões. “Solicitado a fornecer informações a respeito, o TCM-GO, simplesmente, fez as observações. A única ação do tribunal após a decisão da Alego, agora, é fiscalizar a execução do decreto”, apontou o tribunal. A reportagem apurou que, diante da decisão da Alego, o entendimento entre membros do órgão de controle é acompanhar a calamidade na capital “com lupa”.Advogado especialista em Direito Público e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil em Goiás (OAB-GO), Samuel Balduino, explica que a legislação prevê que a calamidade pública seja decretada em caso de tragédias, como ocorreu na época da pandemia de Covid-19. Segundo Balduino, há possibilidade de o ente decretar calamidade em área específica, como, no caso de Goiânia, na Saúde e nas finanças, com efeitos específicos para essas duas áreas. InstrumentoNo ano passado, o TCM-GO confirmou a dependência financeira da Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) em relação ao Paço, a partir da análise das contas de 2025. Com isso, a Prefeitura passa a ser responsável direta por todas as dívidas (mais de R$ 2 bilhões) e obrigações da empresa pública, como a folha de pagamento. Isso pode fazer com que a Prefeitura ultrapasse limites de despesa com pessoal determinados pela Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos pontos flexibilizados pelo decreto de calamidade.O impacto da dependência da Comurg está entre os argumentos usados pela Prefeitura para alegar a situação caótica das finanças. No entanto, ao confirmar a possibilidade de a Alego aprovar a calamidade financeira, o TCM-GO levou em consideração a dívida flutuante de R$ 696 milhões (representa 8,6% da receita corrente líquida estimada para Goiânia em 2025). O número é resultado da relação entre o endividamento total de R$ 1,87 bilhão e a disponibilidade de caixa de R$ 1,17 bilhão.